Nada esclarece melhor a consistência das mais recentes vitórias do Brasil que o confronto da reação do ministro da Fazenda, Antônio Palocci Filho, e a do presidente Lula. A revisão do Produto Interno Bruto de 2003, que nos fez passar de um número negativo de 0,2%, portanto recessão, para outro ligeiramente positivo, de mais 0,5%, ou seja, pequeno crescimento, graças a mudanças na metodologia de cálculo pelo IBGE, fez com que o ministro da Fazenda se sentisse aliviado. "Estou feliz", disse ele a jornalistas. Mas acrescentou: "Não estou cantando igual ao presidente. Ele foi para o evento (encontro com os prefeitos do PT) cantando de sua sala até a reunião", observou sorrindo Palocci.
A visão do ministro da Fazenda é mais realista. A de Lula, eufórica. O PIB deste ano também deverá ser positivo, por volta de 5%, e há previsões de que, no ano que vem, também o seja.
Temos de nos lembrar que, mesmo crescendo 5%, o Brasil está tendo um acréscimo no seu Produto Interno Bruto semelhante, se não ligeiramente menor, do que o crescimento mundial. Está muito abaixo de vários países. Mas abaixo, efetivamente, do desenvolvimento de que precisamos. Na coluna do meio, talvez, o que não satisfaz a um povo que amarga séculos de pobreza e esperanças nunca alcançadas, que vê eternizar-se a miséria em grandes partes de seu território e de milhões de seus cidadãos. Essa situação exigiria o "espetáculo do crescimento" que Lula já pensou que estava acontecendo e os fatos desmentiram.
Não há por que ser pessimista diante dos números positivos do crescimento do PIB; das exportações superando as importações e gerando superávites recordes e de superávites fiscais crescentes, superiores até àqueles que haviam sido prometidos ao Fundo Monetário Internacional. O que dá um sabor amargo a essas vitórias é que elas têm custado o desejado desenvolvimento econômico com os ganhos que estão sendo produzidos, pois as sobras vão para pagar dívidas e não para investimentos e programas sociais.
E, também pelo fato de que elas não são consistentes. O superávit comercial, por exemplo, já começou a encolher com a queda do dólar, que provoca menores ganhos com as exportações e a imposição de maiores gastos com as importações. E o parque industrial já esgotou sua capacidade produtiva.
A inconsistência resulta também de fatores externos, como o comportamento dos preços do petróleo no mundo. Eles, mesmo tendo baixado dos cerca de US$ 55 dólares o barril a que chegaram, continuam altos demais. Também nos preocupa e atinge a alta dos juros nos Estados Unidos e a perda de valor do dólar frente ao euro. Nesse jogo das finanças e economia globalizadas, que gostaríamos de alterar, mas não podemos, somos engolfados pelas crises que ocorrem no mundo. O dinheiro, que migra de um país para outro, não se destina ao Brasil na quantidade necessária e sempre que precisamos, pois os investidores estão atentos ao xadrez internacional, em busca de melhores oportunidades. Nesse quadro, ainda há guerras. Guerras verdadeiras, com destruição, mortos e feridos, e guerras comerciais. Naquelas, não estamos diretamente envolvidos, embora sejamos forçados a tomar posições políticas. Mas nas guerras comerciais somos contendores e podemos esperar conseqüências que nem sempre nos são favoráveis.
Certo está Palocci, que se sente feliz. Mas não é hora de sair cantando vitória.