Fé e milagres

O presidente Lula mostra ser um homem de inabalável fé no Brasil. Chega a ser comovente ouvi-lo exalando otimismo por todos os poros, como fez em sua mensagem de Ano Novo dirigida à nação. Ele historiou seu governo, começando pelo ano de 2002, o das eleições, quando houve fuga de capitais, interrupção no ritmo de investimentos e o risco-Brasil bateu recordes. Não disse, mas é verdade que isso acontecia porque o mercado temia sua vitória e o seu governo. Faria uma administração estatizante, talvez até socialista. Enfim, daqueles de que o empresariado daqui e de fora foge como o diabo da cruz.

Assumindo, já no ano de 2003, com uma política econômica ortodoxa, acorde com o Fundo Monetário Internacional e voltada à produção de superávites para cumprimento das obrigações do nosso País com o mercado, em especial o externo, e firmando até compromissos escritos de respeito aos contratos assinados, foi recuperando a confiança que lhe negavam. E negando-lhe, negavam ao Brasil. O resultado foi espetacular. O Brasil sob Lula passou a ser mais respeitado, até por quem apostava mais cartas no governo que o antecedeu, o de Fernando Henrique Cardoso.

Relatando os acontecimentos de 2004, Lula apresentou-o como um ano de preparação para o desenvolvimento econômico sustentado. Recobrara a confiança e investiu valendo nas exportações, resultando para o País um retomar do desenvolvimento bastante promissor, que Lula aponta como o início de uma nova era. Ele acredita no Brasil e acha que todos também acreditam. E embora admita que problemas persistem, vê o milagre do desenvolvimento sustentado acontecendo e que se tornará para todos visível no ano de 2005. E irretroagível.

A fé remove montanhas, mas a de Lula, por mais que acreditemos em sua competência e vontade de acertar; por mais que creditemos às PPPs a possibilidade de associações entre o capital público e o privado para dar ao País obras indispensáveis de infra-estrutura, tem cheiro e gosto de discurso de campanha eleitoral.

Nós queremos acreditar no que promete, mas o Brasil tem tantos e tão grandes problemas. Além disso, solucioná-los pode não depender do nosso governo e da nação brasileira. Há o imponderável e indesejável que pode vir de fora, como uma crise recessiva mundial ou aumento de juros em países que conquistam com maior facilidade a confiança do mercado internacional. Ou ainda uma nova elevação nos preços do petróleo ou um surto inflacionário fora de controle. Pragas, enfim, não faltam, mesmo que não as roguemos.

Exemplo disso foi que o governo prometeu de pés juntos que nunca mais teríamos apagões. E acabamos de ter um. A autoridade técnico-executiva do setor disse que outros poderão vir, mas o governo, na voz da ministra de Energia, desmentiu seu subordinado e, como Lula, garantiu: apagões, nunca mais!

Oxalá tudo o que disse o presidente Lula, em sua fala de começo de ano, realmente aconteça. A fé que demonstra chega a ser contagiante. Mas, como logo depois de seu discurso disseram vários economistas e empresários, é preciso estar com os pés bem plantados no chão. Uma coisa é ter confiança e fé no Brasil. E outra é assegurar que vai chover maná e estamos entrando no paraíso. Há ainda muitos problemas e grandes desafios. Para solucioná-los e enfrentá-los, a confiança e a fé do presidente são importantes. Mas não bastam. É preciso manter olho vivo, pois como já afirmaram vários analistas, inclusive internacionais, nem o Brasil nem a América Latina estão em posição segura em termos econômicos.

Grupos de WhatsApp da Tribuna
Receba Notícias no seu WhatsApp!
Receba as notícias do seu bairro e do seu time pelo WhatsApp.
Participe dos Grupos da Tribuna
Voltar ao topo