O governo meteu-se numa enrascada sem tamanho ao optar pela sustentação da Medida Provisória 232, insistindo de forma arrogante na tramitação da mesma na Câmara dos Deputados. A última manobra governista veio mediante o relator da matéria, deputado Carlito Merss (PT-SC), solicitando a rejeição pura e simples.

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A oposição e muita gente da própria base parlamentar do governo, mostrando força e disposição para desmoralizar ainda mais o reduzido bloco de apoio irrestrito ao Palácio do Planalto, concordou com a rejeição do aumento das alíquotas do imposto de renda para autônomos, prestadores de serviços e agropecuaristas, porém, conservando a correção de 10% na tabela das pessoas físicas.

O governo pressentiu o golpe e passou a agir no plenário da Câmara para obstruir a votação, ou seja, postergando pela via regimental uma derrota amarga. A MP 232 teve a votação adiada para a próxima semana, mas conforme o prazo estipulado os novos dispositivos entram em vigor hoje.

Uma bagunça total, definiram parlamentares calejados pela longa experiência no Congresso. O bloco governista sem liderança e à deriva, perdido numa exegese incompreensível, mas sem dar o braço a torcer ante o repúdio generalizado ao caráter indesejável da medida, viu-se flanqueado pela oposição.

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A renitência do governo significa, por outro lado, e a constatação nos parece da maior gravidade, insolente menosprezo à manifestação da sociedade organizada quanto aos malefícios de mais esse escancarado aumento da carga tributária.

Instituições do porte da OAB, Confederação Nacional das Indústrias (CNI) e Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) – apenas para citar umas poucas – continuam na linha de frente pela rejeição da MP, além de apontar nos gastos descontrolados do governo um fator exponencial do desequilíbrio econômico do País.

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Em algum momento chegou a haver da parte do Planalto a intenção de introduzir modificações sensíveis no texto da medida. Na verdade, diante das cenas verificadas agora, esta parece ter sido, é forçoso admitir, mais uma das inesgotáveis ambigüidades do governo. Dizia uma coisa, mas fazia outra bem diferente.

A confrontação com o bloco oposicionista na Câmara, em conjuntura extremamente adversa, dá espaço à constatação realista da inexistência da configuração de uma estratégia consistente do PT e seus poucos aliados, quando têm de enfrentar desafios como a discussão da MP 232. O comportamento da inconfiável aliança governista, aliás, cujo exemplo da diversidade intestina é dado pelo próprio Partido dos Trabalhadores, no presente embate, foi de uma pobreza franciscana.

O governo ficou com a guarda aberta, exposto aos ataques da oposição, como nunca favorecida por um arsenal de argumentos e razões, dir-se-ia oferecido de mão beijada pelo modus operandi inconseqüente e amadorístico de uma equipe bem-intencionada e disposta a ousar, como se viu na decisão de não renovar o contrato com o Fundo Monetário Internacional.

A obsessão demonstrada pelo setor econômico do governo quanto à necessidade da MP 232 – no último momento houve candente apelo do secretário da Receita Federal por sua aprovação -, entrementes, recrudesceu o processo de corrosão da imagem institucional do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sua gestão, danos plenamente evitáveis, mas agregados de forma irresponsável a um passivo futuramente comprometedor.

Para o presidente da Confederação Nacional das Indústrias, Armando Monteiro Neto, não há a menor chance de o Congresso aprovar qualquer aumento da carga tributária, porque a sociedade vai reagir. ?Ela existe e está viva e o governo tem de reconhecer isso?, declarou.

Segundo o empresário, se existe prioridade, ela deverá se concentrar na reforma tributária como instrumento de estímulo ao investimento produtivo, ao desenvolvimento das exportações e à competitividade da produção nacional.

Qualquer ajuste fiscal extemporâneo destinado a compensar a espiral dos gastos públicos, será apenas esparadrapo num organismo em falência múltipla.