Fala, doutor Serra!

Não tem mesmo jeito. Os pré-candidatos ao trono de Brasília estão aí, deverão ser confirmados nas convenções dos próximos dias, os vices serão definidos pelas conveniências mercadológicas, assim como as alianças partidárias e os acertos de todos os tipos. Mas não há meio de nenhum dos candidatos empolgar o País. O desânimo é geral. E plenamente justificado.

Lula acha que desta vez vai. Tem, até, razões para assim supor. Continua liderando com folga as intenções de voto, com inéditos 42%, e talvez seja o único opositor autêntico ao atual modelo de governo. Ciro é bom de papo, tem o discurso redondinho, mas não consegue afastar o fantasma Collor e continua muito mal acompanhado. Garotinho e Enéas, como se sabe, são apenas piadas de mau gosto dessa nossa tênue democracia.

Restando Serra e Lula, cabe-nos indagar qual dos dois é o mais capaz e o mais sincero. É possível que o primeiro tenha, em tese, maior capacidade para governar o Brasil. Foi um militante de esquerda nos tempos estudantis, sofreu as intempéries do período ditatorial, é economista formado, tem certa visão internacional e até mesmo alguma experiência administrativa, apesar da absoluta inabilidade política e nenhuma simpatia pessoal. É preciso saber, contudo, que Brasil José Serra pretende governar. Se o do neoliberal FHC, para mim, ao menos, não serve; se o outro – quer dizer, o nosso -, já não sei se é o mais competente. Ademais, subsistem fundadas dúvidas quanto à sinceridade do ex-ministro da Saúde brasileira.

Nesse quesito, creio que o barbudo petista leva vantagem. Apesar da fase mais “light”, da atual postura mais afinada com o “esta-blishment” e até de certo aceno de simpatia, explicitamente constrangido, ao FMI – obras do marqueteiro Duda Mendonça -, Lula tem saído melhor na fotografia. Até os representantes das chamadas classes produtivas estão achando.

Talvez exatamente por isso, os jornais anunciam que “Serra levará à TV frases polêmicas de Lula”. A iniciativa deve ter partido de outro marqueteiro, também baiano e igualmente laureado, o Nizan Guanaes (ex-Roseana Sarney), que assina a campanha oficial tucana. Ele já estaria coletando clipes gravados no tempo em que Lula era presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, na década de 70. Quer mostrar as contradições do pré-candidato petista.

Eu preferiria muito mais – e acho que a grande maioria dos eleitores que irão às urnas em outubro também – que, ao invés de ficar apontando os defeitos do adversário, o dito candidato contasse o que pretende fazer, caso venha a empunhar o cobiçado bastão presidencial. Até porque, em matéria de contradição, o PSDB não precisa procurar lá fora. Basta voltar os olhos para o Palácio do Planalto. Ali encontrará, envergando a camiseta pessedebista, o rei da incoerência, aquele que, um dia, pediu para que esquecêssemos tudo o que ele já dissera ou escrevera.

O que parece claro é que, na falta de projetos consistentes, que sensibilizem o eleitorado, o comando da campanha serrista, depois de detonar a farsa maranhense e cooptar para suas linhas o ex-estrategista pefelista, busca no passado argumentos para empalidecer a chama petista, que está a aquecer o País.

Bem melhor seria se José Serra dissesse a que veio.

Fala, dr. Serra! E conta por que recém-nascidos continuam morrendo em maternidades abarrotadas, de infecção hospitalar. Na última semana, foram dez, só lá na Fortaleza de Tasso Jereissati e Ciro Gomes.

Célio Heitor Guimarães

é um curioso eleitor, à procura de um candidato.

 

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