Sustentamos que é de todo inconveniente e tudo deve ser feito para que não haja politização dos aterradores episódios de ataques do crime organizado à sociedade.
Essa politização não se justifica, porque os ataques às forças policiais e ao povo que a elas cabe defender denunciam uma situação caótica que não tem um culpado. Culpados são muitos, desde a tolerância brasileira com a sua organização social injusta, como o incompetente aparato policial, o desentrosamento entre os diversos níveis de governo, a falta de recursos para as forças de segurança pública, o sistema penitenciário vergonhoso, a legislação condescendente e a Justiça lenta. Também a impunidade e a vergonhosa fábrica de criminosos que mantemos com a eternização da miséria.
Neste ano de campanha eleitoral, em que o presidente Lula é candidato à reeleição e o até há pouco governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, seu principal – até agora -contendor, a politização dos episódios de violência com a busca de culpados seria de se esperar. Ela pode influir na opinião pública, ora imaginando que culpado é o governo paulista porque lá ocorreram os mais graves fatos; ora o governo federal, que vem sonegando ou reduzindo verbas para um plano nacional de segurança que não sai do papel.
Até aqui, dá-se a impressão que a politização não está ocorrendo. Lula, num surpreendente e intrigante pronunciamento, elogiou o governador de São Paulo, vice de Alckmin, o pefelista Cláudio Lembo. ?Eu quero aqui, de público, dar a minha solidariedade ao governador Cláudio Lembo pela postura que ele teve. Ele não podia fazer mais do que fez, não podia fazer?, afirmou o presidente. E acrescentou: ?Ainda há pouco estive com ele (Lembo) no aeroporto e disse para ele: ?Cláudio, o que você precisar, não se faça de rogado. Nós estamos dispostos a ajudar com o que a gente tiver para ajudar?.?
O posicionamento do presidente demonstra boas intenções. Embora de bem-intencionados o inferno esteja cheio, vamos aplaudi-lo, com alguma desconfiança. Quando a esmola é demais, o santo desconfia. Não podemos nos esquecer de que se trata de Lembo e não de Alckmin. Será que ele elogiaria Alckmin, fosse este ainda o governador e candidato a presidente? A aumentar a desconfiança há também o fato de que Lembo vem lançando farpas contra Geraldo Alckmin, não se sabe com que objetivo, já que com isso contraria os interesses do seu próprio partido, o PFL, que tem o candidato a vice do PSDB que disputará a Presidência da República.
Mas o posicionamento de Lula, comentando os episódios de São Paulo, apesar das dúvidas sobre a sinceridade dos elogios feitos a Lembo, tem pontos positivos e que demonstram uma visão adequada do fenômeno da criminalidade organizada e generalizada. Para o presidente da República, os responsáveis pelo crescimento da criminalidade e ação ousada dos criminosos continuam sendo a falta de investimentos em educação e os problemas econômicos.
Se não são tudo, é evidente que constituem caldo de cultura para a violência. Não podemos esperar senão um enfrentamento entre criminosos e a sociedade enquanto uma larga parcela da população brasileira for mantida na marginalidade em termos de educação, condições econômicas e outros direitos que, numa democracia, deveriam ser de todos. Estamos fabricando criminosos.