Vem de Brasília, essa ilha da fantasia dissociada da realidade brasileira, o mau exemplo: o Congresso Nacional saiu de férias por conta própria e só volta a funcionar ? segundo admitem e anunciam as principais lideranças ? após a contagem dos votos da eleição do dia 6 de outubro próximo. Seus integrantes, há muito, estão mais preocupados com a própria sobrevivência política que com a incumbência constitucional que receberam na diplomação. Os interesses do Brasil e dos brasileiros é o que menos importa.
Diz o presidente do Senado, Ramez Tebet, que de uma hora para outra pode convocar seus colegas caso algo “prioritário”, votado pelos deputados, lhe caia à mão. É apenas uma forma de dizer-se de prontidão para um dever não-cumprido. Ele poderia, querendo, tomar a dianteira. Mas Tebet sabe que da Câmara nada virá pois ali nada mais acontece mesmo e a despeito da importância de temas que dormitam nas gavetas e nas comissões.
O governo tentou, e até aqui não conseguiu, mudar as regras do PIS/Pasep para acabar com a danosa cumulatividade que grava empresas, diminui empregos e atrapalha as exportações. Para tirar a economia do atoleiro em que se encontra ? e isso não é prioritário? ?, todos os candidatos disseram a seus eleitores que estariam dispostos a realizar em tempo-recorde uma minirreforma tributária, em substituição a uma reforma de fato até aqui não realizada, apesar das promessas reiteradas. Na prática, a vontade manifesta dos candidatos é apenas outro discurso eleitoreiro: em Brasília, não se alcança mais quorum para nada.
Se quiser mudar alguma coisa, o governo terá que lançar mão do instituto da medida provisória, um instrumento que tem a natural antipatia do Parlamento por avançar em seara sua. Acrescente-se a consideração de que a omissão do Congresso nessas questões, além de prejudicial à nação, é remunerada. No fim de outro mês não ? trabalhado, os parlamentares receberão seus contracheques intocados, com dinheiro amealhado no bolso dos contribuintes esfolados.
A questão do PIS/Pasep é apenas um exemplo, e muitos poderão dizer que a responsabilidade de governar é do governo. Mas quem é o governo se não essa interação harmônica dos três poderes o executivo, o Legislativo e o Judiciário? E se ao governo é vedado o uso da máquina para favorecer candidatos, claro está que também o Legislativo, assim como o Judiciário, pelo menos institucionalmente, têm semelhantes obrigações.
Ao eleitor, cercado na planície pelos que se dirigem ao Planalto, caberia uma reflexão adicional neste período de campanha: o seu candidato é do tipo que honra compromissos e deveres acima da defesa de interesses pessoais ? o de se reeleger inclusive?
É evidente que estamos malhando em ferro frio. Assim como em Brasília, agem deputados estaduais e vereadores comunais. Mas também nos parece necessário deixar aqui consignado que existe no seio da sociedade uma consciência em formação que tende a combater comportamentos que não condizem com as expectativas de cidadãos carregados de deveres concretos mas, ainda, muito distantes dos direitos apregoados. O exemplo dos que são remunerados para servir aos interesses da nação precisa vir de cima.