A escola em que um adolescente de 16 anos foi morto por um colega nesta segunda-feira (24), em Curitiba, foi desocupada no início da noite. Doze alunos estavam à tarde no Colégio Estadual Santa Felicidade – logo após o assassinato do jovem. Eles ainda permaneceram na instituição por mais algumas horas, foram ouvidos pela Polícia Civil e o Conselho Tutelar e depois deixaram a instituição.
Segundo o diretor da escola, Luiz Carlos Bueno, os pais dos alunos que participavam do movimento foram chamados para buscá-los. “Ainda assim, havia quem queria continuar na escola, mas nessas condições não era possível”, afirmou o professor.
A ocupação no Colégio Estadual Santa Felicidade teve início no dia 14 de outubro. O Conselho Tutelar já havia visitado a unidade. Na ocasião, não foi encontrada nenhuma irregularidade.
Comunidade chocada
A morte do adolescente de 16 anos deixou a comunidade do bairro Santa Felicidade em estado de choque. Assim que as primeiras informações sobre o assassinato foram divulgadas por meio de grupos de WhatsApp e sites de notícias, pais, vizinhos, alunos e professores se aglomeraram na frente do Colégio Estadual Santa Felicidade em busca de informação.
A aflição tomava conta das mães que aguardavam por notícias dos filhos que ainda estavam dentro do colégio. Quem acompanhou a ocupação da escola desde o início, relatava surpresa com o ocorrido. Era o caso de Diair Aparecida de Jesus, que recebeu um telefonema do filho, de 15 anos, contando que um colega havia sido morto ali. Há poucos dias, ela e o marido doaram tintas e pinceis para a turma pintar o prédio do colégio.
“Não era bagunça que eles estavam fazendo”, reforçava ela, entre o pedido à Polícia Militar para que abrissem os portões da escola e o relato desesperado à reportagem. “Meu filho ligou apavorado. Quero que ele saia ou eu possa entrar com ele. Todos os pais têm que entrar com os meninos que estão lá dentro”, disse a mãe.
Do outro lado da rua, quem não tinha familiares dentro da ocupação também mostrava comoção. Vizinha da escola, Tânia Mara Rossa lamentava a situação e se colocava no lugar de outras mães. “Fiquei assustada porque meu filho de 22 anos já estudou nessa escola e meu pequeno ainda vai estudar. Penso como está o coração destes pais agora, principalmente os que apoiaram a ocupação”, comentou.
Os alunos da escola custavam a acreditar no que havia ocorrido. “Estava uma paz lá dentro, não dá para entender”, disse um menino de 14 anos. Conforme ele, o movimento havia sido feito de forma muito organizada. “Só entravam com autorização e eram divididos em comissões”, contou. Ainda na porta da escola, estava um cartaz com as regras do lado de dentro, a revista como medida de segurança e fitas pretas e amarelas para diferenciar alunos da ocupação e visitantes.
Amiga da família da vítima, a cuidadora de idosos Solange de Souza deixou o trabalho e foi para a porta da escola tentar saber sobre o estado da mãe do jovem morto. Os anos de amizade entre as duas a levavam a imaginar o estado inconsolável da mãe, doceira em uma padaria de Curitiba. “Minha amiga só tinha o filho e ele só tinha ela”, lamentou.
Estudante morto era calmo e estudioso
O menino assassinado era um “guri estudioso, querido e calmo”. Por vezes, a cuidadora de idosos, o jovem e a mãe almoçaram juntos e ele se mostrou um rapaz preocupado com os estudos, contou Solange.
Filho único, o adolescente havia se mudado com a mãe para Almirante Tamandaré, mas continuava a estudar em Santa Felicidade. O pai morreu quando o garoto ainda tinha 4 anos. “O menino gostava demais do bairro, dos amigos. A mãe acabou voltando com ele para cá. Faz um mês que se mudou [novamente, da RMC para a capital]”, relatou Solange, que, em meio à confusão, conseguiu falar com a amiga por alguns segundos.
Entre lágrimas, a mãe do adolescente só dizia querer levá-lo vivo para casa. Ela precisou receber atendimento médico antes de ser liberada.
O bom comportamento da vítima também foi lembrado por professores que se sensibilizaram com a situação e foram até o colégio. Emocionados, eles engrossavam os pedidos à polícia para que pudessem fazer companhia aos alunos da ocupação, na tentativa de oferecer um pouco de amparo aos que estavam dentro do colégio.
Do lado de fora, era possível ouvir choro e gritos. “Estamos todos boquiabertos com isso. Esse ano não trabalhei com ele [vítima], mas é só pegar as fichas dele do colégio e olhar: não era um aluno que dava problema”, observou a professora de Língua Portuguesa Loren Júlia.
Gostava de se posicionar
O diretor da escola, Luiz Carlos Bueno, foi o último a sair do colégio. Acompanhou toda a desocupação da instituição e a limpeza do sangue da vítima por professores e conselheiros tutelares. “Era um dos melhores alunos que tivemos. Era crítico, político e gostava de se posicionar”, disse sobre o jovem morto.
No olhar, Bueno carregava a tristeza do dia mais pesado de seus 23 anos de magistério. “Nunca tinha visto nada assim”, pontuou.