É comum nos dias de hoje todos andarem enfiados com a cara no celular e nas redes sociais. A vida se encontra em uma conta da internet e parece que só acontece ali, pois se o fato não é compartilhado em rede é como se não tivesse acontecido.
Os celulares já são quase como uma extensão do corpo e se alguém não tem um smartphone, se sente como se não fizesse parte da atual sociedade. É comum compartilhar tudo, fotografar tudo e expor sua vida inteira nas redes sociais. É a febre contemporânea da auto exposição, da necessidade de estar online o tempo inteiro, acompanhando tudo e todos.
O fenômeno estimulou e inquietou o produtor Carlos Grun, que se uniu aos atores Mateus Solano e Miguel Thiré, parceiros artísticos de longa data, para refletir e rir de tudo isso, concebendo a criação da comédia “Selfie”, apresentada na noite de ontem (04) no Teatro Positivo.
Para dar forma ao desejo do trio, o ator, autor e diretor Marcos Caruso foi convidado para dirigir o texto criado por Daniela Ocampo, roteirista do programa “Tá no Ar: a TV na TV”, da Rede Globo, e diretora de comédias de sucesso como “Lente de Aumento” e “Z.É – Zenas Improvisadas”.
História
A peça, que arrancou aplausos em pé de um plateia lotada, conta a história de Cláudio (vivido por Solano), um homem superconectado que armazena sua vida inteira em computadores, dispositivos e redes sociais.
Com o projeto de um sistema único de armazenamento, ele cria o MyCláudio e enquanto espera a liberação do projeto, exclui todas as suas informações da internet e as salva em seu celular. Porém, no momento em que a plataforma é aprovada, Cláudio derruba um copo de café em seu aparelho, que sofre uma pane e apaga tudo.
É a partir daí que inicia o verdadeiro contexto do espetáculo. Cláudio se torna um homem sem passado, já que não se lembra de nada, pois toda a sua memória era virtual. Começa então uma saga em busca da memória perdida e recorre a vários personagens (vividos por Thiré) para reconstruir sua história.
Em determinado momento, o personagem principal percebe que não precisa de dispositivos móveis para armazenar suas memórias e se manter conectado, ele decide implantar um microcomputador na cabeça, tornando-se assim o “The Conect Man”, um homem que tem o mundo em sua mente e não fica offline nunca. Porém, essa escolha traz muitas consequências, e um encontro com sua infância o faz refletir sobre o modo de vida que está levando.
Espetáculo
O ator Mateus Solano explica que a ideia do espetáculo surgiu porque “Selfie” foi a palavra mais citada no ano passado, porém, a ideia se alargou. “Nós conseguimos abordar todos os pontos sem ser maniqueístas, pois não queríamos criticar uma coisa que é tão recente. Tem uma mãe que desmaia quando fica sem o celular, mas corta para um senhor que ensina um cara jovem a usar o celular com moderação”, disse.
Ele conta que a ideia é lançada ao público, que carrega a peça no bolso, para que eles pensem sobre isso e se reconheçam nos personagens. “Nós chegamos a um final conciso, uma peça com início, meio e fim, sempre com muito humor, mas que traz uma reflexão”, explica.
O cenário é composto apenas por um tapete e dois pufes, dando total ênfase à interpretação dos atores, principalmente a do Miguel Thiré, que vive 11 personagens sem nem trocar de figurino, dando um show de interpretação.
O analista de negócios Tom Pesch diz que se surpreendeu muito com a atuação de Thiré, pois só conhecia o trabalho do Solano. “Uma peça com um tema tão atual e interpretada com pouquíssimos recursos, somente a atuação dos dois grandes atores, foi realmente fantástica”, disse.
Festival
Para o diretor Marcos ,Caruso, o Festival de Curitiba é o evento de teatro mais importante do nosso país e tem muito orgulho toda vez que é convidado, porque, segundo ele, Curitiba prima por ser uma das cidades culturais mais importantes.
“A magnitude do festival, com tantas peças e com tantos teatros bons e bem equipados atrai um grande público. Hoje nós acabamos de apresentar um espetáculo para 2.400 pessoas e temos mais duas sessões lotadas. Isso estimula muito quem faz teatro, porque vemos que vale a pena continuar nessa profissão”, disse.
Segundo Caruso o teatro é um lugar para se sentir bem, rir, se emocionar e refletir. “É isso o que a gente propõe com o nosso espetáculo e é o que o festival propõe como objetivo”, finaliza.
Solano diz que sente honrado em participar do evento e que se não fosse por ele não estaria em Curitiba. “Estou no meio do processo de um filme do Sérgio Rezende lá em Dourado, em Mato Grosso do Sul, e minha mulher está com oito meses de gravidez em casa. Foi duro, mas eu quis muito vir para o Festival de Curitiba”, atesta.
Público
O procurador de justiça Sérgio Sinhuri, que assistia a sua quinta peça dentro do festival, disse ter boas expectativas de que seria um exímio espetáculo. “A excelência dos atores, a crítica favorável e também o fluxo de pessoas que estão falando bem da peça, me fazem ficar muito esperançoso”, conta.
Já para a advogada Érica Pereira, o tema do espetáculo retrata justamente a realidade do que está acontecendo atualmente. “Ninguém mais vive só a vida real, é só WhatsApp e Facebook e quem não está conectado nesses meios está fora do mundo. Não deveria ser assim, as pessoas precisam viver, ter amigos, uma convivência social e usar a internet só como complemento”, disse.
O ator Yuri Ribeiro, que estrela a peça “Hamlet ou Morte”, integrante da mostra paralela Fringe, aproveitou a oportunidade para assistir ao espetáculo e não poupou elogios.
“Eu gostei muito, tem várias viradas, prende muito, tem uma precisão muito grande dos atores e acima de tudo isso, é muito divertido e comunica muito”, disse.
A peça será apresentada hoje (05) em mais duas sessões. A das 16h foi aberta como sessão extra e ainda tem lugares disponíveis. Porém, a sessão das 19h está esgotada. Os Ingressos custam R$ 70,00 a inteira e R$ 35,00 a meia-entrada.