O megaleilão de energia existente, marcado para terça-feira a partir das 10 horas, no Grand Hotel Meliá World Trade Center, em São Paulo (SP), se dará sob o temor de parte do mercado de eletricidade de que a modicidade tarifária perseguida pelo governo federal poderá ser obtida à custa de redução da rentabilidade e da capacidade de investimento das companhias.
De acordo com especialistas ouvidos pela Agência Estado, os agentes privados do setor temem o poder de fogo das geradoras estatais federais, que concentram boa parte do mercado e que poderiam pressionar os preços. Além disso de acordo com o executivo de um banco que está assessorando companhias do setor, a própria sistemática dos leilões poderá induzir os agentes a lances excessivamente baixos, o que poderá contribuir para desequilíbrios futuros.
"O que temos ouvido dos agentes é que eles temem que as geradoras federais possam atuar pressionando para baixo os preços no leilão", disse o diretor da Excelência Energética, José Said de Brito. "Será um fato lamentável se as estatais forem utilizadas politicamente. Uma atitude prudente será interferir o menos possível no leilão e deixar o mercado atuar", acrescentou.
Brito afirma que, caso a disputa entre as empresas leve a preços muito baixos, poderá se criar dificuldades para que as geradoras garantam investimentos no futuro. "Vender abaixo de R$ 80 por megawatt-hora (MWh) será contraproducente, em relação a estímulos para investimentos no setor", advertiu o consultor. Ele acrescentou que as próprias estatais, caso dêem lances sem levar em conta sua capacidade futura de investimentos, "poderão ficar sem recursos para investir".
Na opinião do consultor, o governo federal deveria ter estabelecido um preço mínimo para o leilão para evitar uma queda mais drástica das cotações. "O governo deveria saber qual é o valor que pode remunerar os investimentos e evitar exercer qualquer papel no leilão", disse ele. O estabelecimento de um parâmetro mínimo de preço foi uma reivindicação das entidades que representam os agentes do setor.
Um executivo de um grande banco que está assessorando empresas participantes do leilão não vê, contudo, riscos de que as estatais atuem para baixar os preços. "A chance disso ocorrer é zero", diz o executivo. "Mas a sistemática adotada para o leilão poderá criar incertezas para a empresa participante que poderão determinar lances mais baixos", acrescentou.
Ele lembra que o leilão será realizado em duas fases. Na segunda fase, as empresas participantes poderão dar somente um lance, com o volume de energia e o preço. "Há uma chance muito grande de uma empresa se desesperar, com medo de não conseguir vender energia, e oferecer um lance muito baixo", disse o executivo.
Ele lembra que, em um leilão realizado em 2002 em que foi ofertada a energia descontratada até aquele momento, algumas empresas não conseguiram vender a sua produção, diante da estratégia mais agressiva de outros concorrentes. "Naquele leilão, por exemplo, a Chesf conquistou mercados de Furnas", acrescentou o executivo. "Ninguém vai correr o risco de ficar sem comprador para sua energia", disse.