Espanha e preconceitos

A crise entre o Brasil e a Espanha, em razão da detenção e expulsão de brasileiros que legitimamente aportaram em Madri, ainda não terminou. Falta de parte das autoridades brasileiras uma visão clara do que está acontecendo, embora algumas providências em defesa dos nossos cidadãos que viajam para a Espanha ou via Espanha já tenham sido tomadas.

As autoridades brasileiras, em especial os Ministérios das Relações Exteriores e o da Justiça, este através da Polícia Federal, embora pondo panos quentes e só admitindo interpretações legalistas, estão dando o troco. Acionando o princípio da reciprocidade, têm mandado de volta cidadãos espanhóis que aqui chegam, em maior número em Salvador, Bahia.

Entre estes há quem de fato procurava entrar no Brasil sem as condições mínimas para sua admissão. E também uma agente de viagens espanhola que saiu bufando, dizendo que não vai mais programar viagens de turismo mandando clientes para o Brasil.

O que parece claro é que as atrabiliárias autoridades de imigração da Espanha são movidas também por preconceitos. Prova disso é que a maioria dos impedidos de pisar em solo espanhol, dentre inúmeros sul-americanos, e de brasileiros é de afro-descendentes. É preciso, de qualquer maneira, que as autoridades brasileiras hajam em defesa de nossos direitos e mostrem com energia que as arbitrariedades da imigração espanhola têm volta.

Os argumentos de que os brasileiros que lá chegaram foram detidos e expulsos não preenchiam as condições estabelecidas pela União Européia caem por terra quando, um dia depois de havermos mandado meia dúzia de espanhóis de volta, não houve nenhum problema com os brasileiros que chegaram a Madri. Estes desembarcaram respondendo a poucas perguntas e sem verificação das exigências ditas essenciais para pisar em solo espanhol. Esse tratamento deveu-se, com certeza, à reação dura, mas justificada, das nossas autoridades dando a resposta à altura.

Parece evidente a existência de preconceitos, não só em relação a latino-americanos, como de ordem racial, o que não pode nem deve ser admitido por um país de pluralidade racial como o Brasil.

O episódio dos brasileiros detidos em Madri, e que ainda não terminou, pois ao que se saiba, nem todos já estão livres e muitos tiveram frustradas viagens com simples escala na Espanha e que se destinavam a outros países, notadamente Portugal, chegou a merecer interpretação do próprio presidente Lula. O fato agrada, pois subiu ao mais alto escalão a revolta contra a maneira indigna com que nossos conterrâneos foram tratados num país, a Espanha, que sempre teve as melhores relações diplomáticas, políticas, culturais, comerciais e de troca turística com o Brasil.

O que é de se lamentar é a interpretação errada que a Presidência da República deu aos acontecimentos. Lula entendeu que tudo vinha acontecendo em razão das eleições na Espanha, em que se opunham o atual primeiro-ministro José Luís Rodriguez Zapatero e Mariano Rajoy, do conservador Partido Popular.

Ganhou Zapatero, o que dá mais esperanças de legalização da situação dos atuais imigrantes ilegais existentes na Espanha, dentre eles calcula-se que alguns milhares de brasileiros. A posição conservadora é mais severa e, vencesse Rajoy, seria de se esperar expulsões em massa. Mas, ao contrário do que afirmou Lula, as expulsões recentes de brasileiros não ocorreram por causa da disputa entre Zapatero e Rajoy, mesmo porque nem foram divulgadas na Espanha. Lá, a opinião pública, o eleitorado, nem tomou conhecimento da refrega entre Espanha e Brasil, tendo como vítimas os viajantes. Os fatos não foram divulgados e muito menos utilizados como argumentos na campanha eleitoral.

O melhor caminho a percorrer para resolver a situação é continuar dando o troco. E, no campo diplomático, buscando um entendimento que afaste de vez o risco de detenções de parte a parte, pois, apesar dos pesares, os laços que sempre uniram o Brasil e a Espanha precisam ser preservados e fortalecidos.

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