Volta e meia alguém que retorna ao poder, ou tenta fazê-lo, é acusado de haver pertencido a esta ou aquela administração mal-sucedida e repudiada pela população. Fulano tem pinta na testa, pois serviu ao governo do sicrano! O coordenador da campanha de Ciro Gomes era um dos comandantes da campanha de Fernando Collor, posto para fora através do “impeachment”. João Sayad, que foi ministro no governo Sarney, está na equipe de Lula. E não faltam os que recomendam o aproveitamento, por Lula, Serra, Ciro ou Garotinho, de homens como o atual presidente do Banco Central, Armínio Fraga. Armínio chegou a receber recomendação do ex-governador petista do Distrito Federal, Cristóvam Buarque, para integrar um governo de Lula.

Seriam esses homens vira-casacas? Alguns sim, outros não. Neste País não existem múltiplas elites, grupos plurais de cabeças pensantes, de homens preparados para ocupar os cargos técnicos nos governos federal, estaduais e municipais. Temos uma única elite técnica, em áreas como a da economia, embora dentro dela existam posições divergentes. Mas não especialistas divergentes em número suficiente para constituírem equipes. Um governo precisa de gente competente e os governantes eleitos muitas vezes são obrigados a catar nas hostes adversárias seus novos colaboradores. Benedita da Silva, vice-governadora do Rio de Janeiro, do PT, viu-se em dificuldades quando substituiu Garotinho. Teve de caçar, Brasil afora, entre petistas e simpatizantes, pessoas para organizar sua equipe.

O acirramento dos debates na campanha eleitoral, na medida em que resultarem em ataques imperdoáveis, dificultam alianças num segundo turno e também a formação do futuro governo. É bom que se siga a trilha indicada pelo atual presidente, Fernando Henrique Cardoso, que, apesar de apoiar um candidato, José Serra, tem insistido que todos os candidatos à sua sucessão são dignos. Que se debatam programas e evidenciem divergências. Mas que não sejam ressaltadas incompatibilidades insanáveis, pois os candidatos com chances de vitória representam partidos e alianças relativamente pequenas e sem quadros suficientes para preencher todos os postos do governo federal. Quanto mais este e ainda outros conquistados nos estados e municípios.

A governabilidade depende da capacidade de formação dessas equipes e é certo que alguns especialistas de renome, que já serviram ao atual e a outros governos, poderão ser convocados. Tão importante quanto esta formação da equipe executiva governante é a cobertura parlamentar. O PT sozinho não é suficiente para respaldar um eventual governo. Com o PL, que também o apóia, pouquíssimo somará. Garotinho tem o respaldo de um pequeno partido e de grupos religiosos, estes suficientes para granjear-lhe indulgências divinas pelas sandices de campanha, mas não indicados para governar. Ciro é apoiado por uma frente dita trabalhista, sem nenhuma autenticidade programática ou ideológica. Uma equipe que formasse com base nos apoios conquistados seria uma destemperada e intragável salada.

Os candidatos têm afirmado que as alianças oficiais ou brancas que armaram para sustentar suas candidaturas não envolvem compromissos na formação de seus eventuais governos. E, por isso, esperam aplausos. Talvez mereçam reprovação, pois o que estão dizendo é que, se eleitos, correrão o risco da ingovernabilidade.

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