Temas como brasiguaios, transgênicos, necessidade de transformar o comércio ilegal de fronteira em incentivo ao turismo e à agrodindústria, uma segunda ponte entre o Brasil e o Paraguai, são parte de uma entrevista que o governador Roberto Requião concedeu ao jornal paraguaio ABC Color, em Foz do Iguaçu, publicada com destaque esta semana, em duas partes. Ele foi apresentado como um influente governador brasileiro, aliado ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que fala ?sem protocolo nem rodeios? sobre temas que despertam interesse.

continua após a publicidade

Requião defendeu que para a solução dos problemas de fronteira entre Cidade do Leste e Foz do Iguaçu ? onde há enfrentamentos e protestos diante do controle mais rígido que os governos dos dois países estão fazendo sobre o comércio ilegal – o caminho não está no contrabando, que foi tolerado, mas que deve acabar, mas no turismo e na agroindústria.

?Vamos fomentar um plano progressivo de geração de empregos, de ampliação da capacidade turística. Agora mesmo estamos transformando Foz do Iguaçu num dos locais mais seguros do Brasil, onde aproximadamente 1.400 homens fazem patrulhamento comunitário?, disse ele. Entre as possibilidades de sobrevivência econômica defende que o Paraguai deve utilizar a energia elétrica da binacional Itaipu a favor da industrialização.

Brasiguaios são paraguaios

continua após a publicidade

Aos brasileiros que vivem no Paraguai ? os brasiguaios ? e que têm preocupações com a recente Lei de Segurança sobre a Faixa de Fronteira, recentemente aprovada no país vizinho, ou, com problemas de documentação, o governador recomenda que ?devem lutar por seus direitos como paraguaios?. Ele explica por que: ? Porque são paraguaios, pois é o país onde vivem, trabalham e onde dão de comer aos seus filhos. Eles ajudam a desenvolver o Paraguai e devem lutar por seus direitos como paraguaios, porém mantendo uma identidade latino-americana?.

Para ilustrar seu pensamento, Requião lembra que todos os brasileiros vieram de algum outro lugar do mundo, mas são brasileiros porque vivem, trabalham e criam seus filhos no país. Relembra que suas avó e bisavó eram de origem guarani. ?Também tenho uma mescla de sangue alemão, italiano, português, espanhol, porém, sou plenamente brasileiro, não me considero nem português, nem espanhol. Da mesma forma, os brasiguaios devem sentir-se paraguaios porque seus filhos são paraguaios e estudam no Paraguai?, concluiu. Sobre a nova lei que proíbe a venda de terras a estrangeiros, o governador do Paraná disse que é praticamente inócua, pois essas terras de fronteira do Paraguai já foram vendidas.

continua após a publicidade

Após a publicação da entrevista de Roberto Requião, o mesmo jornal anunciou que o Indert (Instituto Nacional de Desenvolvimento Rural e da Terra) começou a regularização fundiária de áreas ocupadas por colonos brasileiros num dos Departamentos (Estados), o de Caaguazú. O presidente da instituição, engenheiro Erico Ibáñez, disse aos colonos de Toledo, distrito de Raúl Arsênio Oviedo, que vão receber títulos os proprietários que têm direito. A Lei 1.863, do Estatuto Agrário paraguaio estabelece que esse direito está garantido aos proprietários estrangeiros que estão no país há cinco anos contados antes de sua promulgação, e que detêm documentação migratória há pelo menos sete anos.

Soja transgênica: o risco de misturar

Quando o jornalista do ABC, Hugo Ruiz Olazar, autor da entrevista, comentou que Requião defende a agroindústria, mas não deixa a soja transgênica paraguaia passar ao Paraná, o governador esclareceu: ?Passar, a soja transgênica passa. O que ela não pode é ser exportada. Nós recebemos um milhão e trezentas mil toneladas de soja paraguaia por ano. Desse total, um milhão de toneladas são processadas no Estado e 300 mil toneladas são exportadas, mas não pelo Porto de Paranaguá.

O jornalista quis saber o porquê da proibição e o governador explicou: ?A soja transgênica tem um valor muito baixo no mercado internacional. Se for misturada à soja convencional do Paraná, vamos perder preço. O prejuízo seria enorme. O Porto de Paranaguá exporta seis milhões de toneladas. Aquela pequena quantidade misturada comprometeria o preço de todas as seis milhões de toneladas que o nosso Estado exporta para o mercado internacional. Antes, o problema não existia porque a soja transgênica também estava proibida no Paraguai?.

Essa proibição durou até o ano passado: ?Esta é uma jogada da multinacional Monsanto, no Paraguai. Durante o último período de seca os produtores paraguaios devem ter-se dado conta de que o produto transgênico tem uma perda muito maior que o convencional. Nos Estados Unidos, quando foi lançada a soja transgênica, o saco da semente custava o equivalente a US$ 6 e hoje custa R$ 120,00. Além disso a produtividade da soja convencional é muito maior que a da transgênica?.

Sobre outros Estados brasileiros que plantam soja transgênica: ?O Estado do Rio Grande do Sul acabou plantando. Isso não deveria ter acontecido, pois ali apresenta uma produtividade de 2.000 quilos por hectare. Em média, o Paraná está colhendo 3.000 quilos e, em alguns casos, 4.000 e até 4.400 quilos por hectare de soja convencional. Então, para que vamos plantar uma soja de baixa produtividade só para agradar a Monsanto e satisfazer o lobby internacional dessa empresa? Pode haver risco de quebra. Os portos de Paranaguá e de Vitória do Espírito Santo proibiram o embarque de soja transgênica e mais portos estão proibindo por pressão dos empresários. Eles estão se dando conta que misturar produz perdas. É lógico, quem quer perder dinheiro?

O comentário do jornalista paraguaio de que seu país está desviando as exportações para outros locais fez Requião observar que ?o Paraguai praticamente não exporta soja pelo Brasil, porque 300 mil toneladas não são nada?. Em Paranaguá, lembrou, atracam centenas de navios ?E essas 300 mil toneladas correspondem a apenas quatro deles?. O governador disse que o porto franco cedido ao Paraguai, que estava a cargo da Câmara Paraguaia de Cereais e Oleaginosas, foi terceirizado para uma multinacional norte-americana ?que se esconde atrás da sigla de porto franco, isto é, atrás da soberania paraguaia, o que é ilegal?.

A segunda ponte

Sobre a construção de uma segunda ponte, paralela à Ponte da Amizade, que está sendo projetada pelos governos nacionais do Brasil e do Paraguai, Requião disse que quanto mais pontes melhor.

Mas alertou que na verdade essa segunda ponte já existe, ?é a ponte de Itaipu, que liga os dois países. No mundo inteiro, as pontes sobre represas são normalmente utilizadas?.