Quando é abordado o tema da questão metodológica dentro dos Cursos de Graduação em Direito, em regra (e quase que automaticamente), vem à tona a discussão sobre a didática (ou falta dela). Todavia, há um outro ponto que merece destaque e precisa ser tratado: a forma de abordagem do conteúdo. As instituições mais sérias de ensino do Direito já estão colocando a questão em pauta. Particularmente, a quebra da exclusividade do modelo dedutivo de construção do conhecimento é um tema interessante. Dentro deste eixo, o principal exemplo de nova metodologia é o ?estudo pelo método do caso?. ?Nova metodologia? apenas em termos, pois em outros países este já é um método antigo e que, atualmente, vem até mesmo sendo questionado. O que é natural, pois o século XXI tem presenciado uma aproximação entre os modelos anglo-americano e europeu continental, tanto no tocante à teoria jurídica, quanto no concernente ao ensino do Direito.
Mas o que é o método do caso? Preliminarmente, é preciso registrar que não existe apenas um método do caso. Trata-se de uma proposta de caráter cognoscitivo/didático de conhecimento do objeto científico que utiliza a discussão de ?casos-paradigma? e não de aulas expositivas de cunho teórico/abstrato. Os métodos de caso têm em comum, ainda, a centralização da produção do conhecimento no aluno e não no professor. Costuma-se afirmar que o método do caso tem fontes diferenciadas no tocante ao ensino do Direito. Todavia, reporta-se a uma tradição jurídica fundamentalmente norte-americana, seja pelo método jurídico ?propriamente dito? da Escola de Harvard, seja pelo método utilizado nas Escolas de Administração e trazidos para o estudo do Direito. No Brasil o método é utilizado em outros cursos da FGV desde 1954, porém houve um movimento muito forte de crítica ao método na década de 90. Atualmente, já está sendo aplicado em algumas Faculdades de Direito no Brasil (caso da EDESP e da UniRitter/RS) e também em algumas Faculdades latino-americanas, como por exemplo a Escola de Direito e Advocacia da Universidade Torcuato di Tella, na Argentina. Em Curitiba também já possuímos exemplo do uso do método.
Em termos gerais, o método típico da tradição de Harvard reporta-se ao estudo de decisões judiciais paradigmáticas, ou seja, do ?caso como decisão sobre o caso?. Já o método usual das Escolas de Administração coloca como foco o estudo de casos decorrentes de fatos reais, ou seja, do ?caso como situação-problema real?. Todavia, é difícil identificamos um modelo de forma pura e independente, principalmente devido às diferentes variações encontradas nas experiências das faculdades que passaram a utilizá-lo. Em regra, a utilização do método exige três instrumentos prévios de trabalho: primeiro, a ?nota de ensino?, que é a referência para o professor da disciplina e contém as questões principais a serem tratadas, os objetivos, as possíveis respostas e sua problematização, além das nuanças principais do caso, da bibliografia de apoio, de um resumo dos fatos e outras questões relevantes; segundo, a ?narrativa do caso?, que é feita pela Instituição (ou já existe em um banco de casos) e deve ser o mais imparcial possível, além de conter uma redação que leve o aluno por todas as peculiaridades fáticas que envolvem o problema; e terceiro, os ?textos de apoio?, para leitura prévia, pois o aluno já deve chegar preparado para a aula. Para aqueles que recorrem a um método mais aproximado à tradição de Harvard, a narrativa é substituída pela ?decisão judicial?.
Por certo que a utilização no método no Brasil implica adaptações importantes. A base do Direito norte-americano são os casos; no brasileiro, é a lei. Nos EUA os casos já estão bem definidos (são clássicos), no Brasil eles praticamente não existem, apesar de algumas iniciativas importantes, como a formação de uma Casoteca (iniciativa da EDESP). O método do caso mapeia a visão pragmática, típica do advogado norte-americano (há o predomínio da razão prática). No Brasil há um predomínio da razão teórica (classificações/taxionomias). Todavia, é perfeitamente possível a utilização do método do caso no Brasil, mas deve ser feita a devida adaptação, ressaltando-se os objetivos de: promoção de uma habilidade analítica; inserção do Direito dentro da realidade social, aproximação-se de uma razão indutiva, busca de uma visão interdisciplinar e motivação do aluno (que gosta da utilização tópica de exemplos). Ainda, deve-ser ter em mente que o método não serve para ensinar a espinha dorsal do Direito no Brasil. O método tradicional não pode ser deixado de lado, devendo apenas perder seu caráter de exclusividade.
Nestes termos, é uma boa sugestão não utilizar o método do caso propriamente dito, mas sim uma variante, que poderia ser chamada de ?método por problemas?, em que seriam mescladas decisões judiciais e casos criados como narrativa de situação real. Ainda, é possível criar disciplinas específicas para a utilização do método, a serem ministradas pelos mesmos professores que continuariam com as disciplinas de cunho teórico-dedutivo. De início, será preciso um grande empenho institucional para a adaptação de alunos e professores, havendo, sem dúvida, resistência de ambos os lados. Mas ao final, parece que as iniciativas levadas a efeito já têm produzido excelentes resultados.
Emerson Gabardo é professor de Direito Administrativo, coordenador-geral do Curso de Direito da UniBrasil e da pós-graduação do Instituto de Direito Romeu Felipe Bacellar.