A tarefa pedagógica de avaliar é sempre árdua, afinal, muitas vezes é vista como um simples processo em que o professor estabelece critérios externos ao alunado para medí-lo por intermédio de uma nota. É improvável que alunos saiam de uma prova difícil agradecendo ao professor pela contribuição à sua formação; ainda mais complexo é o quadro quando são entregues notas baixas ou ocorrem reprovações. É difícil para qualquer pessoa que teve uma avaliação insatisfatória reconhecer a adequação do processo avaliativo; é mais fácil e usual serem destacados os defeitos do processo. Em regra, somente ficam satisfeitos com o processo de avaliação aqueles que foram bem avaliados; porém, de modo geral, não se verá esses ?bons alunos? defendendo o processo de avaliação.
De longa data sabemos que a avaliação não deve se restringir à prova como o único instrumento para tentar aferir o conhecimento de um estudante. Estudos de caráter pedagógico já demonstraram a imperiosa necessidade de serem produzidos outros instrumentos que levem em conta as diversas habilidades dos alunos para demonstrar a verificação do conhecimento: atividades em sala, acompanhamento continuado, apresentações de seminários, leituras e fichamentos de textos, trabalhos individuais e em grupos são apenas alguns dos diversos mecanismos colocados à disposição dos professores para buscar a concretização da avaliação.
No entanto, além dessas questões fundamentais há que se perceber que no ensino superior o processo de avaliação envolve ainda, por um lado, a mudança de perspectiva dos alunos e, por outro, o reconhecimento pelo corpo docente das dificuldades de lidar com um grupo extremamente heterogêneo e muitas vezes desconhecedor do processo avaliativo.
Nos cursos superiores há um certo rompimento em face ao modelo do ensino médio e a comunidade acadêmica convive com uma rica variedade de formações pretéritas: diversos alunos provêm de instituições privadas que algumas vezes adotam no último ano do ensino médio o modelo do ?cursinho? em que as avaliações são meras formalidades e as aulas um ?show? que nem sempre se traduz em verdadeiro amadurecimento intelectual; outros alunos provêm de escolas públicas, em regra, com grandes dificuldades de caráter institucional; há ainda os alunos que já realizaram outro curso superior e têm uma visão distinta da faculdade em relação ao que é o curso de direito; há também aqueles que depois de muitos anos retornam a faculdade, seja em busca de um sonho de realização pessoal ou em face das necessidades de um mercado de trabalho multifacetado. Desse quadro percebemos a heterogeneidade do corpo discente a que todas as faculdades de direito tem de lidar na atualidade.
Ademais, particularmente no curso de direito o corpo discente em regra não está familiarizado com a sistemática adotada pelas instituições de ensino superior mais sérias. Não é raro que os alunos dos primeiros períodos tenham elevada ansiedade por lidar com questões de trato jurídico de pronto, sem estarem conscientes de que precisam combinar a dogmática jurídica com as disciplinas de caráter propedêutico como filosofia, sociologia, economia, ciência política, e história.
Imagine-se a dificuldade de avaliar esse público tão distinto de experiências e expectativas tão diferentes. Há algumas instituições e professores que optam pelo modelo mais fácil: não avaliar com seriedade; valendo-se oficiosamente do instituto da progressão continuada. Nesse quadro a avaliação, por certo, deixa não só de ser questão complexa, como também uma real oportunidade de aprendizagem, tornando-se mera formalidade.
De outro lado, as instituições e os professores que optam pelo caminho mais difícil fazem do processo de avaliação uma forma aprendizagem efetiva, o que promove inúmeras vantagens para o seu corpo discente e para a sociedade como um todo. Através dele o professor percebe, pelo índice de acertos e erros, quais temas de sua matéria são compreendidos com maior ou menor facilidade. A partir desta análise há a possibilidade de serem produzidas novas estratégias de ensino. Os alunos, por sua vez, são exigidos a ponto de perceberem pelo próprio esforço quão complexa é a realidade jurídica com que irão se deparar e que não se esgota nas leis positivadas.
Neste processo, atribui-se valor ao aluno que efetivamente destaca parte da sua vida para o ensino superior enaltecendo a meritocracia. Quem escolhe fazer o ensino superior precisa estar disposto a aprofundar seu conhecimento, a mudar sua concepção de mundo, a conhecer com profundidade a sociedade e dedicar muito do seu tempo a isso. Esse aluno não pode ser desestimulado por um processo de avaliação que demande pouco dele; isso significaria investir contra a meritocracia, pilar fundamental para uma sociedade que pretenda avançar dentro da democracia.
O processo de avaliação também deve estar diretamente ligado a um bom sistema de interpretação dos resultados, ou seja, não basta simplesmente atribuir uma nota para os alunos, é necessário demonstrar os acertos e os erros, sugerindo estratégias para o aperfeiçoamento das respostas e até mesmo do método de estudo. Uma avaliação efetiva quase sempre diverge daquilo que os alunos entendem por adequado no momento de sua aplicação porque aparenta lhes exigir mais do que o possível. No entanto, somente um sistema sério e rígido de avaliação realmente lhes oferece a oportunidade de crescimento intelectual que adiante lhes será imprescindível na vida como profissionais e cidadãos.
Ozias Paese Neves é advogado, graduado e mestre em História, professor de História do Direito, coordenador adjunto do Curso de Direito da Unibrasil.