É do revolucionário Che Guevara a frase ?é preciso endurecer, mas sem perder a ternura jamais?. Che, um jovem médico argentino, aventureiro e idealista, sonhou com uma América do Sul unida, o povo vivendo com justiça e igualdade. Seu idealismo levou-o aos equívocos do comunismo que ajudou a implantar em Cuba, com Fidel Castro, construindo assim mais uma das tantas ditaduras de extrema esquerda que ainda existem no mundo, com boas intenções e péssimos resultados. É desse jovem médico, hoje ídolo de jovens de todo o mundo, essa frase que hoje se aplicaria adequadamente às feridas que o assassinato cruel de uma criança, num roubo de automóvel no Rio de Janeiro, deixaram nos brasileiros.
Foram três jovens e mais um menor os criminosos. E uma criança a vítima. Portanto, brasileiros em começo de vida numa sociedade que está desorganizada, um caldo de cultura para a violência e atos hediondos. O caso recém-ocorrido no Rio foi tão terrível que, mais que outros igualmente hediondos, como o assassinato de crianças de rua na soleira da Candelária ou a carnificina em massa de presos no Carandiru, confrangeu a sociedade. Esta, em manifestações muitas, desde tarjas pretas, passeatas, missas e apelos ruidosos às autoridades, pedem providências já e agora.
Há os que querem a redução para 16 anos da maioridade penal e os que desejam a pena de morte ou a prisão perpétua. Todos são movidos pelas melhores intenções, embora seja inevitável que muitos estejam propondo no fervor da indignação, que pode ser uma má conselheira. Ela, enquanto fervente, pode queimar soluções mais adequadas e impor outras de menor efetividade.
O crime hediondo do Rio movimentou o parlamento e logo surgiram dezenas de propostas e outras dezenas foram desengavetadas, como se os nossos deputados e senadores de repente despertassem para a sua obrigação permanente de fazer leis boas e conseqüentes e cuidar do bem-estar da sociedade. Na madrugada de ontem, a Câmara aprovou projetos de lei que endurecem a legislação penal. Um deles dificulta a obtenção da chamada progressão da pena, que leva a transferência do regime fechado de prisão para um mais brando, como o semi-aberto, mesmo para os condenados por crimes hediondos como o estupro, seqüestro, tráfico de drogas, homicídio qualificado e terrorismo. O segundo estabelece punição para o uso de celulares pelos presos. Esses dois projetos têm ainda de passar pelo Senado.
Essas novas leis são insuficientes, porém oportunas, e atendem à lição de Che Guevara, de que ?é preciso endurecer?.
Mas o menor e os jovens que mataram a criança no Rio, como milhares de outros neste Brasil, são feras criadas por uma sociedade que não lhes dá casa e comida, família, educação, enfim, uma vida que propicie o seguimento de um caminho de inclusão no meio social, com oportunidades de uma vida condigna. Criamos feras e depois exigimos vingança e não o conserto das condições que as levaram a viver enjauladas entre a fome, o roubo e o tráfico.
É preciso que ?não se perca a ternura? e, para isso, é hora de pensarmos e agirmos para que esta sociedade reduza ou extinga as diferenças sociais gritantes com as quais temos convivido já sem sentimentos de indignação. Quando o Estado brasileiro e toda a sociedade despertarem com ternura, mas também com ações objetivas, para a necessidade de construir um País justo, as leis penais e penitenciárias deverão continuar duras, mas menos brasileirinhos estarão pelas ruas roubando, matando e ajudando o tráfico.