Empresa Individual (Parte 3): O Capital Social Mínimo

Nas empresas individuais, o capital social é cláusula obrigatória, nos termos do artigo 997, IV, do Código Civil, devendo ter o valor de no mínimo 100 (cem) salários mínimos vigentes, consoante novo artigo 980-A daquele.

Não obstante o fato de que parece ser inconstitucional o dispositivo, já que o artigo 7.º, IV, da Constituição Federal proíbe a vinculação do salário mínimo para qualquer fim (o salário mínimo não pode servir de indexador ou índice de reajuste para o capital social mínimo nas empresas individuais), outras questões precisam ser avaliadas, a fim de averiguar a real utilidade e conseqüências da aplicação do texto legal.

Para o ponto, merece atenção o fato de que não podemos confundir o capital social com o patrimônio da sociedade; o primeiro, é caracterizado como o montante investido pelos sócios no momento da constituição da daquela, já o segundo é descrito como o volume de bens e direitos adquiridos ou perdidos no decorrer do sucesso ou insucesso empresarial. Assim, enquanto o capital social é estático, o patrimônio varia de acordo com os benefícios ou prejuízos decorrentes da atividade desenvolvida.

Estabelecida esta premissa, é simples concluir que o capital social não tem a função de prescrever a quantia mínima necessária para o desenvolvimento de certa atividade, já que aquela por vir até mesmo de financiamento ou de terceiros interessados, tampouco representa qualquer garantia para os credores, como querem alguns doutrinadores, já que ele não descreve a situação financeira da sociedade no momento de uma contratação (uma sociedade com dívidas não tem o capital social alterado).

A primeira conclusão a que chegamos, portando, é que o capital social, caracterizado como o montante do investimento inicial dos sócios (que não é necessariamente o mínimo necessário), tem a função primordial de regular a relação entre aqueles, definindo o poder de controle nas relações societárias.

Voltando ao ponto inicial, sobre a necessidade e utilidade, não cremos que a iniciativa legal de se utilizar um capital social mínimo tenha qualquer valia para o meio empresarial. Acreditamos, outrossim, que a realidade demonstrará ser um total equívoco do legislador, já que sobram motivos para tanto.

Primeiro, porque o estabelecimento de um capital social mínimo, além de nada garantir, representará uma falsa garantia (já que a garantia aos credores, como visto, não é o capital social, mas sim o patrimônio societário), pelo fato de que trará uma falsa idéia de grandeza ou solidez negocial, quando a realidade poderá ser muito diferente.

Em segundo lugar, porque o propósito da empresa individual, salvo melhor juízo, é conceder maior segurança aos pequenos empreendedores, aqueles que, muitas vezes, não têm patrimônio suficiente para integralização daquele capital social mínimo; ou seja, o valor mínimo restringirá a constituição da empresa individual pelo simples fato de que este é muito superior ao próprio patrimônio do empreendedor (pessoa natural) que pretende constituí-la.

Por último, mesmo que se admita que as integralizações no modelo brasileiro prescindam da demonstração do efetivo depósito bancário da quantia descrita como capital social (quando são realizadas em dinheiro), fato que, por si só, torna inútil a estipulação de um valor mínimo, é importante lembrar que o capital social pode ser integralizado por bens outros, desde que suscetíveis de avaliação pecuniária, como informa o artigo 997, III, do Código Civil.

Daí que, quando impossível a contribuição em dinheiro, poderá o empreendedor utilizar-se de um bem qualquer (um imóvel, um carro ou até mesmo uma pintura em um quadro), respondendo ele mesmo pela avaliação e estimação do valor, nos termos do artigo 1.055, § 1.º, do Código Civil; ou seja, acreditamos que a legislação, ao estipular um capital social mínimo que independe de comprovação de depósito ou que pode ser transposto pela inclusão de bens variados (não conectados à atividade desenvolvida), irá contribuir para que sejam feitas apenas integralizações sem lastro (sem depósito ou com bens dispensáveis ou de avaliação fantasiosa), tornando a prescrição legal letra morta, fato que somente contribui para a insegurança jurídica e empresarial.

A solução para todos os problemas, todavia, é bastante simples. Basta que seja reduzido o valor do capital social mínimo (para R$ 5.000,00, por exemplo, seguindo o parâmetro Europeu), tornando obrigatório o depósito do valor em instituição financeira ou a avaliação dos bens dados por avaliador credenciado.

Essa simples mudança bastaria para dar maior segurança aos credores da existência ou do lastro do capital social inicialmente declarado, assim como possibilitaria a rápida disseminação desta nova modalidade empresarial, que, com menos riscos, veria diminuídos os seus custos de transação, beneficiando a economia e os consumidores.

Daniel Fernando Pastre  é mestre em Direito. É advogado sócio do escritório Castardo, Milazzo & Pastre Advogados Associados e professor de Direito Empresarial na Faculdade Nacional de Educação e Ensino Superior do Paraná – FANEESP.

 

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