Em defesa da Constituição

Registra-se no presente uma surda campanha que está, visivelmente em curso, desferindo constantes agressões diretas ou indiretas ao texto constitucional. A essa expedição contra a Constituição brasileira não se pode ficar indiferente.

O Estado democrático de direito, fundado na soberania, na cidadania e na dignidade da pessoa humana, tem no Brasil marco histórico inquestionável, com o advento da Constituição da República Federativa em 1988. É fundamental imunizar, em toda sua extensão, a proclamação constitucional, emanada do povo, por meio de seus representantes, para que seja possível, no respeito ao pluralismo e ao processo histórico e político, construir uma sociedade justa e solidária.

Ao completar o décimo quinto ano de vigência, o dever primeiro é o de reafirmar, na defesa da Constituição, o compromisso com a liberdade, segurança, bem-estar, desenvolvimento, igualdade e a justiça.

Nesse âmbito, a Constituição Federal de 1988 erigiu como fundamento da República a dignidade da pessoa humana. Tal opção colocou a pessoa como centro das preocupações do ordenamento jurídico, de modo que todo o sistema, que tem na Constituição sua orientação e seu fundamento, se direciona para a sua proteção. As normas constitucionais (compostas de princípios e regras), centradas nessa perspectiva, conferem unidade sistemática a todo o ordenamento jurídico.

Operou-se, pois, em relação ao Direito dogmático tradicional, uma inversão do alvo de preocupa-ções, fazendo com que o Direito tenha como fim último a proteção da pessoa humana, como instrumento para seu pleno desenvolvimento. Faz-se imprescindível blindar esse texto constitucional.

Não se pode esquecer que a Constituição Federal de 1988 impôs ao Direito o abandono da postura patrimonialista herdada do século XIX, migrando para uma concepção em que se privilegia o desenvolvimento humano e a dignidade da pessoa concretamente considerada, em suas relações interpessoais, visando à sua emancipação.

A Constituição, com os valores ali consagrados, inspirou a edição de leis esparsas que vieram regulamentar seu conteúdo, bem como, adequar aos seus princípios disposições legais pré-existentes. Ademais, novo foi o cenário jurídico-político, pois a Constituição veio residir no centro do ordenamento social, e se aplica direta e imediatamente nas relações privadas. Nela está o centro irradiador, uma vez que a edição de leis posteriores não cria, propriamente, novos direitos – cujas normas definidoras podem ser construídas a partir da hermenêutica constitucional -, mas, na verdade, regulamenta e explicita o conteúdo latente no texto constitucional.

Daí a importância em preservar a Constituição, colocando-a a serviço da efetividade dos direitos e garantias individuais, da erradicação da pobreza, da redução das desigualdades sociais e regionais, da prevalência dos direitos humanos, numa sociedade que busca tornar-se, realmente, fraterna e sem preconceitos.

Avançar agora contra a Constituição é promover, no tempo presente, a estagnação paralisante do ocaso pretérito. O Brasil constitucional de hoje pede respeito ao futuro da Nação.

Luiz Edson Fachin

é professor diretor da Faculdade de Direito da UFPR.

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