Eleita em Fortaleza, Luizianne anuncia criação de frente nordestina

Fortaleza, 31 (AE) – A eleição de Luizianne Lins significa uma vitória da ala esquerda do PT, representada pela facção Democracia Socialista (DS), e o fortalecimento do partido no Nordeste. Apesar de ser da ala radical, ela diz que pretende fazer um governo plural e aproveitar os melhores quadros da cidade, sem transformar a prefeitura em aparelho partidário.

Ao mesmo tempo, já anunciou a criação de uma frente com os prefeitos reeleitos de Recife (João Paulo) e Aracaju (Marcelo Deda), ambos do PT, para estabelecer uma agenda comum junto ao governo federal. Com a derrota de Marta Suplicy, em São Paulo, e de Raul Pont, em Porto Alegre, eles querem deslocar o eixo do partido para o nordeste.

Para que essa estratégia dê certo, o trio precisa de sucesso administrativo e estar unido. Portanto, os primeiros dois anos de governo de Luizianne serão decisivos. Se passar no teste, ela terá força política para influir nas eleições de 2006, mesmo não tendo hoje maioria no diretório estadual. Com a surpreendente vitória do PT, o quadro político-eleitoral cearense ficou zerado e as principais lideranças estão com destino indefinido, sobretudo os partidários do ministro Ciro Gomes, da Integração Nacional. À exceção da senadora Patrícia Saboia (PPS), os demais aliados de Ciro não se engajaram na campanha de Luizianne, apesar do apoio formal no segundo turno. O PSDB, liderado pelo senador Tasso Jereissti, também assistiu à disputa de camarote.

Luizianne tem convicção de que não poderá se isolar na esquerda se quiser corresponder às expectativas criadas na população. Precisará do apoio do Palácio do Planalto, onde os prefeitos Marcelo Deda e João Paulo já têm bom trânsito. A conversa reservada que ela teve com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, há dez dias, teria sido fundamental para indicar uma ação mais pragmática e conciliadora. Ela chegou à reta final com apoio de nove partidos aliados do presidente.

A relação de Louizianne com o PT ainda é delicada. Apesar de compor com o grupo do ministro José Dirceu (Casa Civil), representado pelo deputado estadual José Guimarães ( irmão de José Genoíno), ainda há seqüelas. Luizianne não esqueceu o boicote que sofreu do partido no primeiro turno, tanto que não deu voz de comando ao grupo, mantendo o controle das decisões da campanha em suas mãos.

Hoje, ela voltou a estocar o PT e mandou novos recados, ao falar sobre a eleição em Fortaleza. “É uma lição importante para o PT de que a democracia não é um fim, mas um meio e que precisa, a todo momento, ser exercitada”, disse. “A eleição significa para o PT que o processo histórico está sempre em mutação, não tem jogo de carta marcada e não tem estrutura financeira ou econômica que garanta eleição nenhuma”, acrescentou.

Luizianne Lins votou às 10h35m, sendo recebida em festa por militantes na Assembléia Legislativa. Os mais barulhentos eram da tendência socialista do PT. Carregando bandeiras e agitados, eles cercaram Luizianne, aos gritos de: “é socialista, é radical é a prefeita de Fortaleza”. A petista demorou para chegar à urna em meio a tantos pedidos de autógrafos, fotos e abraços. Posou com um chapeú de cangaceiro, que o maratonista Francisco Fenandes, vestido como Lampião, pôs em sua cabeça. “É a Maria Bonita loura”, gritavam os militantes.

Até o último dia a palavra de ordem foi o amor, reverenciado nos discursos, jingles e debates da campanha. “É o sentimento mais profundo e revolucionário”, repetiu Luizianne, revelando-se uma leitora de “Fragmentos de um discurso amoroso”, de Roland Barthes. “É com amor que vamos reconstruir Fortaleza, uma cidade maltratada e amedrontada”, observava, numa alusão ao propalado desleixo administrativo e o aumento da violência.

Discursos à parte, Luizianne disse que os desafios serão enormes para combater as desigualdades sociais. Seus partidários informam que ela herdará uma dívida de R$ 400 milhões, mas ninguém sabe com certeza o tamanho do buraco. A prefeitura tem uma receita de R$ 1,8 bilhão. Um dos mais bonitos cartões postais do nordeste, Fortaleza é uma cidade cercada de problemas com pessoas vivendo em 92 áreas de risco. O déficit habitacional é grave – faltam 160 mil moradias – e há precariedade no serviço de saúde. Cerca de 60% da população não podem pagar plano de saúde e, portanto, depende da prefeituram.

O paraíso se transformou também em fonte de turismo sexual – principalmente internacional – com a prostituição de crianças e adolescentes. Hoje são 450 crianças sem lar que vivem pelas ruas.

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