A crise nos fundos de investimento e as turbulências pré-eleitorais deixaram cicatrizes profundas no mercado financeiro que, agora, podem marcar também a economia real. Está ficando cada vez mais intensa uma prática da qual há oito anos os brasileiros não ouviam mais falar: a rolagem diária da dívida pública no overnight. O problema é que essa rotina, própria do mundo financeiro, pode afetar diretamente o dia-a-dia do consumidor. Segundo economistas, com o aumento do over fica mais difícil controlar a inflação.
De maio a novembro, o volume de recursos no over saltou de R$ 5,94 bilhões para R$ 42,97 bilhões por dia. Na semana passada, esta quantia ficou próxima de R$ 60 bilhões, o equivalente a 9% do total da dívida pública em títulos. O economista Antônio Licha, da UFRJ, explica que esses recursos podem rapidamente migrar para o consumo, pressionando a inflação.
Carlos Thadeu de Freitas, ex-diretor do Banco Central (BC) e professor do Ibmec Business School, acredita que, para evitar uma fuga para o consumo, é preciso oferecer aos detentores de títulos do governo rendimentos atrativos. Ou seja, elevar a taxa básica de juros da economia, hoje em 22% ao ano. O remédio amargo atuaria em duas frentes contra a inflação: limitaria as compras das famílias, pois tornaria o crédito mais caro, e evitaria a saída de dinheiro do sistema financeiro.