O Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central elevou a taxa básica de juros da economia, a Selic, em 0,25 ponto percentual, para 16,25% ao ano. Foi a primeira alta desde fevereiro de 2003, levando o juro para o patamar de março deste ano. O aumento já era esperado pelo mercado financeiro e dividiu os diretores do comitê sobre o nível de conservadorismo: foram cinco votos pedindo alta para 16,25% e três a favor de elevação maior, para 16,50%.
Embora amplamente aguardada, a discussão em torno da taxa colocou ministros do primeiro escalão do governo Lula em campos diferentes. Na segunda-feira, o ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, disse que não via motivo para a elevação da Selic. “Sou ministro, devo obediência ao presidente e sou disciplinado, mas não sou robô”, disse Dirceu na ocasião. Ele defendeu que como cidadão e parlamentar, tinha o direito de discordar da visão da autoridade monetária.
No mesmo dia, o ministro Antônio Palocci Filho (Fazenda) disse que o governo prioriza o combate à inflação e que nada mudaria na política econômica – ou seja, sinalizou com a alta dos juros.
Na tentativa de acalmar os ânimos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem que o crescimento do Brasil é “consistente” e que por isso não deveria haver motivo para discussões sobre a taxa de juros.
O temor do descontrole da inflação, que tem entre suas causas a retomada do crescimento econômico, levou à decisão de ontem. Nas atas das duas últimas reuniões, o BC deixou claro que aumentaria os juros caso necessário – ou seja, ameaça à estabilidade monetária.
Em agosto, a inflação medida pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) ficou em 0,69%, acima do esperado. No ano o indicador acumula alta de 5,14%. A meta da inflação é de 5,5% nesse ano, com margem de tolerância de 2,5 pontos percentuais para cima ou para baixo. Para 2005, a meta é de 4,5%.
A retomada forte do crescimento econômico é outro fator preocupante. No primeiro semestre, o PIB (Produto Interno Bruto, que mede todas as riquezas produzidas no país) apresentou alta de 4,2%, a maior desde o primeiro semestre de 2000.
O crescimento econômico pode alimentar a inflação. O BC já sinalizou que só admite um crescimento que se mostre “sustentável” ao longo do tempo.
A cautela do governo deve-se principalmente à indústria, que vem operando em níveis de alta capacidade instalada. Se não ocorrer os investimentos necessários, pode haver uma crise de demanda, o que pressionaria ainda mais os preços. Além disso, é mais fácil para uma empresa repassar aumentos de preços ao consumidor em um ambiente de economia aquecida.
Para o setor produtivo, crítico da política de taxa de juros elevada, o aumento de preços não é gerado pela demanda, e sim pelo choque de custos – elevação dos preços de matérias-primas no mercado externo -, e não há risco do descontrole da inflação.
No cenário externo, o petróleo ainda preocupa. Embora tenha caído nos últimos dias, o preço do barril continua em números recordes. Se essa situação persistir, a Petrobras deverá elevar os preços dos derivados de petróleo, pressionando ainda mais a inflação do Brasil.
A justificativa para a decisão adotada na reunião de ontem será conhecida no dia 23, quando será divulgada a ata do encontro.
Entenda o que acontece na economia
O objetivo do Banco Central com o aumento do juro é controlar a inflação. Desde 1999, quando o governo adotou o sistema de metas de inflação e o câmbio flutuante, a taxa de juros é o principal instrumento usado para conter a pressão de preços.
A alta do juro aumenta a atratividade por títulos da dívida pública do governo e, conseqüentemente, provoca um aumento nas taxas para financiamentos cobradas pelas instituições financeiras, inibindo a capacidade de investimentos das empresas e o crescimento da economia.
Além disso, os juros altos desestimulam o consumo, principalmente de bens como automóveis e imóveis, normalmente adquiridos por meio de financiamento, e diminui o espaço que as empresas têm para reajustar os seus preços.
A elevação da taxa provoca também a migração de aplicações em Bolsa para a renda fixa, já que com a Selic alta os rendimentos destes investimentos aumentam.
Quando os juros sobem, aumenta também o volume de recursos necessários para pagar o serviço da dívida e o governo se endivida mais para rolar os títulos.
Selic
Selic é a sigla para Sistema Especial de Liquidação e Custódia, criado em 1979 pelo Banco Central e pela Andima (Associação Nacional das Instituições do Mercado Aberto) com o objetivo de tornar mais transparente e segura a negociação de títulos públicos.
Hoje, Selic identifica também a taxa de juros que reflete a média de remuneração dos títulos federais negociados com os bancos.
A Selic é considerada a taxa básica porque é usada em operações entre bancos e, por isso, tem influência sobre os juros de toda a economia.