Por unanimidade, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) suspenderam ontem a Lei 14.162/03 do Estado do Paraná, que veda o cultivo, a manipulação, a importação, a exportação, a industrialização, a comercialização e o financiamento rural de produtos transgênicos. A suspensão foi solicitada pelo PFL, no dia 6 de novembro, em uma ação direta de inconstitucionalidade com pedido de cautelar (Adin 3035). A cautelar foi deferida ontem pelo relator da Adin, ministro Gilmar Mendes. Ao conceder a cautelar, o plenário do STF aceitou o argumento do PFL de que, com a Lei 14.162, o Paraná invadiu uma competência exclusiva da União.
O governo do Paraná informou que não havia recebido notificação oficial da decisão do STF. De acordo com o procurador-geral do Estado, Sérgio Botto de Lacerda, assim que for informado, o governo do Paraná irá analisar o fundamento e a extensão da decisão do STF para depois se pronunciar.
Durante o julgamento no STF, alguns ministros ressaltaram que não estavam adiantando suas posições sobre a medida provisória 131, do governo federal, que liberou o plantio, na safra 2003/2004, de sementes de soja transgênica. Várias Adins questionam a MP no STF. No tribunal, a previsão é de que essas Adins sejam julgadas na próxima semana.
Conflitos
Na petição inicial da Adin, o PFL argumenta que o Estado do Paraná afrontou o artigo 22 da Constituição Federal. Diz ainda que a Assembléia Legislativa do Estado invadiu competência privativa da União por dispor sobre a importação e exportação de soja transgênica pelos portos do Paraná e o trânsito, industrialização e comercialização desses produtos no Estado. De acordo com o partido, a Lei 14.162/03 também invadiu competência residual ao disciplinar matéria já regulada pela Medida Provisória 131/03, ao proibir o cultivo, manipulação, industrialização e comercialização da safra de soja transgênica de 2004.
O partido também alegou que o Paraná tem um importante parque de industrialização de soja, produto que está há anos arraigado como dos mais importantes da agricultura do estado, “e que agora tem sua atuação restringida por norma inequivocadamente inconstitucional”.
Uma segunda Adin (ADI 3.054) contra a Lei 14.162/03 foi ajuizada no Supremo Tribunal Federal pelo governador de Mato Grosso do Sul, José Orcírio Miranda dos Santos, no dia 25 de novembro. Ele questiona os artigos 1.º, 2.º e 5.º, da Lei estadual 14.162/03, do Paraná, que proíbe a comercialização e a exportação de organismos geneticamente modificados (OGMs). O ministro Gilmar Mendes também é o relator dessa Adin.
Governador acha decisão um “absurdo”
O governador Roberto Requião manifestou sua indignação sobre a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). “Estamos cumprindo o nosso papel. Vamos continuar lutando e fazendo tudo como se tudo dependesse de nós e esperando tudo como se tudo dependesse do presidente Lula. A responsabilidade por esse absurdo da liberação dos transgênicos é do governo federal”, disse Requião.
O governador lembrou que o objetivo da Lei dos Transgênicos é a proteção da vida e saúde do homem, dos animais e das plantas, bem como do meio ambiente, além da defesa dos interesses econômicos do Estado e do mercado produtor, já que a soja não-transgênica é universalmente aceita em todos os mercados. “De nossa parte estamos defendendo a nossa economia, a qualidade e a pureza dos produtos paranaenses e a saúde da nossa gente”, salientou Requião.
Requião disse ainda que o embarque de soja transgênica no Porto de Paranaguá continua proibido. “Vamos, portanto, cumprir a medida provisória do governo federal. Afinal, a medida confina a plantação de soja transgênica no RS e só admite semente plantada na safra passada. Dessa forma, ela nos garante que o Porto não misture soja contaminada com a soja pura. Sendo assim, a exportação continua proibida. Nós não temos shiploader para exportar transgênicos. Se eles dizem que a lei não vale, vale então a medida provisória. E ela garante que não haja essa mistura de soja transgênica com o produto puro. Portanto continua tudo como antes no quartel de Abrantes.”
Governo intensificou a fiscalização
A lei paranaense proibindo os transgênicos foi proposta pela bancada do PT. Depois de muita discussão, foi aprovada pela Assembléia Legislativa e sancionada pelo governador Roberto Requião no dia 27 de outubro. Em função da lei, o Paraná montou barreiras na divisa com os estados vizinhos. Todos os caminhões que chegavam com destino ao Porto de Paranaguá passaram a ter a carga monitorada. Aqueles cujos testes apontaram a presença de organismos geneticamente modificados tiveram que retornar às cidades de origem. Somente seguiam viagem os caminhões cujos motoristas apresentaram certificação de origem da soja.
Fiscalização realizada no Porto de Paranaguá pelos técnicos da Claspar e da Secretaria Estadual de Agricultura e Abastecimento encontrou quase 70 mil toneladas de soja transgênica espalhadas pelos terminais, na primeira quinzena de outubro. A carga transgênica foi deslocada para o silo público e embarcada em operação contínua em dois navios. Após o embarque da mercadoria transgênica, foi feita uma limpeza simbólica dos terminais e o Porto de Paranaguá voltou a carregar soja convencional no último dia 30 de novembro.
Apesar de mais de 260 produtores paranaenses terem assinado os termos de ajustamento de conduta para plantar transgênicos, o governo do Paraná reivindica junto ao Ministério da Agricultura a declaração de área livre de transgênicos. Após o Estado enviar três documentos com suas justificativas para obter esse status, o Ministério da Agricultura solicitou mais informações, como o mapeamento das áreas onde não há plantação de soja transgênica. O governo do Paraná alega que o ministério não liberou a lista dos produtores que assinaram os termos, dificultando a fiscalização.