Se o americano Brian Smith, 47 anos, não estivesse há um ano no leme da Coca-Cola do Brasil, cujas vendas anuais chegam a R$ 5 bilhões, um moderado do PT poderia chamá-lo de companheiro. Smith está encantado com a condução da política econômica do governo Lula, acha que a redução das taxas de juros tem mesmo que ser cautelosa e diz que, a exemplo do que faz o governo, está arrumando a casa.
Rio – De olho no perfil do novo presidente, a Coca ampliou o leque de produtos voltados para os consumidores com menor poder aquisitivo. “Ninguém esperava que a equipe econômica fosse trazer para patamares baixos, tão rapidamente, tanto o dólar quanto a inflação”, diz.
Como o senhor avalia o desempenho da administração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e como os executivos da sede da Coca, em Atlanta, estão vendo a economia brasileira?
Brian Smith :
Bem, nem nós nem a cúpula da empresa em Atlanta esperávamos uma administração tão boa de um cenário de crise que começou no ano passado. Eu te confesso que nos nossos planejamentos, o cenário era bem pior do que estamos vendo hoje.Vocês tiveram que refazer suas projeções para o país?
Smith
: Tivemos. Mas para melhor. Todos os indicadores estavam muito voláteis no fim do ano passado e início deste e ninguém esperava que a equipe econômica fosse trazer para patamares mais baixos, tão rapidamente, tanto o dólar quanto a inflação. No meio da turbulência, a depreciação do real pressionou muito o custo dos nossos insumos importados, que são basicamente a embalagem plástica, o alumínio das latas e o açúcar.Aumentaram preços?
Smith:
Tivemos que reajustar os preços, sim. O mercado encolheu uns 5% e nós da Coca-Cola tivemos um recuo nos volumes de refrigerantes vendidos de 6% no primeiro semestre.O senhor faz coro com os empresários que pedem uma redução mais rápida dos juros?
Smith:
É claro que uma redução mais rápida nas taxas seria muito bom, mas, pessoalmente, acho que a equipe está certa em fazer uma redução gradual e cuidadosa das taxas porque não suportaremos uma nova escalada da inflação. O governo Lula está certo em aproveitar este início de governo para arrumar a casa. Nós, da Coca, tratamos de fazer a mesma coisa e estamos em sintonia com o governo.Como assim?
Smith:
Nós aproveitamos o semestre e reestruturamos a empresa. Estamos integrando mais os contatos com os engarrafadores para focalizar melhor nossos clientes espalhados pelo País. Afinal, cada um tem uma característica diferente e exige uma abordagem de marketing diferenciada. Além disso, enxugamos os gastos com pessoal demitindo 60 pessoas da sede. Dividimos nossa estrutura em cinco áreas de atuação, cada uma liderada por um grande engarrafador da região. E, finalmente, ampliamos o leque de produtos para os consumidores que serão o foco deste novo governo.Que clientes são esses?
Smith:
O atual governo tem um foco mais social, de resgate dos menos favorecidos. Há a intenção do governo de trazer estas classes, tipo C, D e E para o mercado de trabalho e, portanto, para o consumo. Então, sem descuidar dos nossos clientes de faixas mais favorecidas, que não se importam em pagar mais caro por um produto de qualidade, criamos produtos e embalagens voltadas para classes menos favorecidas, a preços acessíveis.E que produtos são esses?
Smith:
A minicoke em embalagem retornável, de vidro, que pode ser comprada por R$ 0,50, por exemplo. Estamos ampliando o uso da embalagem retornável, mais barata que as descartáveis em plástico.O senhor não acha que as tubaínas, ou mesmo a AmBev, podem oferecer produtos mais baratos também?
Smith:
Nós sabemos o valor da marca Coca-Cola e sabemos que mesmo as classes menos favorecidas, se puderem ter acesso a nossos produtos, vão consumi-los.Como o senhor vê a concorrência com a AmBev?
Smith:
Temos muito respeito pela AmBev porque eles têm uma forma de administrar moderna e marcas fortes. O competidor forte nos fortalece.No guaraná eles parecem imbatíveis.
Smith
: É. Nós não tivemos uma guerra das colas, mas eles têm uma marca muito boa, o Guaraná Antarctica, que concorre com o nosso Kuat. O guaraná é um produto que tem boas possibilidades de crescimento tanto aqui quanto lá fora. Já exportamos o guaraná para os EUA e, no México, ele vai indo muito bem.Quais são os números da empresa para o ano?
Smith:
Nós tivemos um primeiro semestre muito ruim, mas já detectamos uma reação neste terceiro trimestre. A área onde atuamos, a de bebidas não alcoólicas, reage rápido. Acho que o último trimestre do ano será muito bom e 2004, melhor ainda. As vendas devem atingir R$ 5 bilhões este ano. Os volumes vendidos vão manter o Brasil na terceira posição entre os maiores mercados para a Coca no mundo. Nós só perdemos para os EUA e para o México.A Coca-Cola reduziu investimentos devido à crise?
Smith:
Isso seria uma estratégia burra porque as crises acenam sempre com oportunidade de crescimento quando elas passam. Vamos manter os investimentos previstos de R$ 500 milhões este ano, o mesmo nível do ano passado.Como está dividido o mercado de refrigerantes?
Smith
: A grosso modo, temos 50%, a AmBev, 17% e as tubaínas juntas, 33%.