Diretor da maior usina hidrelétrica em operação no mundo, Jorge Samek concedeu uma entrevista exclusiva a O Estado. Há exatos seis anos à frente de Itaipu, Samek rebate os argumentos do lado paraguaio quanto à revisão do tratado com o Brasil, comenta sobre os resultados do Parque Tecnológico de Itaipu (PTI) em relação a novas energias, a implantação do carro elétrico, além dos desafios para 2009.

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O Estado – Qual a importância da participação da Itaipu na instalação da Unila. A hidrelétrica pode se beneficiar da mão-de-obra formada pela instituição?

Jorge Samek – A implantação desta universidade é um sonho acalantado por milhares de educadores do Brasil que trabalham com a lógica de fazer a integração do continente. Esse é um desejo do presidente, do ministro Haddad (da Educação), de promover a integração não só pela economia, não só pelas transações comerciais, venda de commodities, instalações de infra estrutura, redes de fios de alta tensão de estradas, de portos, mas fundamentalmente fazer a integração através da educação e da cultura.

OE – Em cinco anos de funcionamento, o que o parque técnológico já apresentou de resultados que possam ser salientados?

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JS – Inúmeros, desde a questão do carro elétrico, em parceria com a Fiat.

OE – Você acredita que esse produto pode entrar no mercado em breve?

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JS – Do ponto de vista comercial isso ainda vai levar cerca de 5 anos. Na Europa antes, porque na Europa já tem uma lei que a partir de 2011, obriga substituir 20% dos carros movidos a combustível fóssil por outros combustíveis. Aí vai ser ou hidrogênio ou o carro elétrico.

OE – Qual a importância do parque tecnológico, já que, nesse turbulento cenário econômico mundial, é cada vez maior o apelo por energias alternativas?

JS – Estamos trabalhando num verdadeiro paradoxo. A maior produção de energia limpa e renovável hidráulica do mundo é de Itaipu, e trabalha agora com a menor produção de energia possível, que é a energia através da biomassa residual. Estamos transformando toda aquela produção grande de suínos, aves e gado de leite, aproveitando esse residual, que era um problema que estava contaminando nosso lençol freático, em energia, através do biogás.

OE – Isso também deve significar um benefício para o meio ambiente?

JS- Extraordinário, esse é o verdadeiro jogo ‘ganha ganha’. Dentro de alguns anos, você verá a seguinte paisagem no oeste do Paraná: o produtor autoabastecendo seu carro, como um celular na tomada, o carro vai ter zero de emissão, não vai emitir nenhum problema para o efeito estufa, para atmosfera, e vai ter as sua própria energia.

OE – É evidente que Itaipu é de fundamental importância para o desenvolvimento social e econômico do Paraná. Mas qual é a importância da usina para o Paraguai?

JS – É a principal fonte de receita do governo paraguaio. Entra na economia paraguaia US$ 700 milhões, entre royalties, cessão de energia, e gasto de despesas de exploração para fazer funcionar a hidrelétrica. Sem contar que abastece basicamente quase que a totalidade da necessidade energética.

OE – Qual é a sua opinião quanto à posição do presidente Fernando Lugo a respeito da revisão do tratado de Itaipu?

JS – O que está no tratado? Tudo que eles (paraguaios) não necessitarem o Brasil compra. Essa que é a tese do tratado. É isso que eles querem mudar, mas querem mudar no segundo tempo do jogo aos 30 minutos do segundo tempo. Agora que a obra está construída, q,m todas as suas obrigações rigorosamente em dia. E aí, efetivamente o Brasil tem uma posição, e a nossa posição é de que o tratado é feito para ser cumprido.

OE – A maior reclamação paraguaia é quanto à energia excedente vendida exclusivamente para a Eletrobrás, que também poderia ser vendida para outras distribuidoras. Você também questiona essa posição?

JS – Nós temos na Itaipu uma série de questões que não existem para outras empresas no Brasil. Por exemplo, somos isentos de pagamentos de impostos, não pagamos IPI, ICMS, ISS. Itaipu tem regras específicas que são só dela. Não pode querer comparar ela, em alguns casos, como se ela fosse uma empresa normal, porque ela não é normal. Então você não pode colocar uma questão que criaria no mercado brasileiro um processo de tratamento desigual.

OE – A tarifa paga à energia excedente paraguaia deveria ser maior?

JS – Estão aí os resultados: os últimos dois leilões, tanto de Girau quanto de Santo Antônio, tiveram uma tarifa final inferior à de Itaipu. Se pegar a média do preço das tarifas no Brasil, você vai ver que a de Itaipu está nessa média. A tarifa de Itaipu foi a mais cara e nós bancamos e pagamos. O preço que é praticado em Itaipu é a média do mercado e é o que consta no tratado.

OE – Qual é a urgência da utilização das pequenas centrais hidrelétricas (PECs) para atender toda a demanda no Paraná? O Paraná precisa ampliar sua capacidade de produção energética?

JS – O Paraná tem o maior potencial energético do Brasil. Se somar tudo que tem a Copel e mais o que é a Itaipu, teríamos quase 30% da energia elétrica do Brasil. Um quarto da energia que movimenta o Brasil sai do Paraná.

Quanto às pequenas usinas, se for produzir energia elétrica para ser consumida no Paraná é bem vinda. Se for para produzir energia e colocar na rede para ser consumida em São Paulo, Rio, Minas ou em qualquer outro lugar, a posição do Paraná já está contribuindo demais.

OE – Com a minirreforma tributária do governo do Estado, a carga que incide sobre a energia deve passar de 18% para 20%. Essa tributação sobre a energia não pode inviabilizar a atividade de alguns setores produtivos?

JS – Se pegar todos os estados, o Paraná é um dos que tem mais baixo. Nós tivemos um tempo grande de uma tarifa diferenciada aqui no Paraná. Não se aplicou os reajustes que inclusive estavam autorizados, além do Paraná gozar do privilégio de isenção para quem consome até 100 quilowatts/hora. Então, se for ver do ponto de vista social, a população mais necessitada já goza de isenção aqui no Estado.

OE – Quais são os grande projetos para a Itaipu em 2009?

JS – Primeiro, é manter essa excelência de estar fornecendo quase 20% da energia elétrica consumida no Brasil. Ponto dois: fazer da PTI e da Unila um fator fundamental do desenvolvimento tecnológico. Ponto três: ser modelo de desenvolvimento ambiental, mostrando para o mundo como é possível compatibilizar desenvolvimento econômico, geração de emprego e renda com a preservação do meio ambiente. Quarto: recebemos, em 2008, 700 mil visitantes em Itaipu. É dinheiro vindo do mundo inteiro na atividade turística. E por fim, ser um elemento de fazer a integração do continente.

OE – Para as eleições de 2010, o seu nome desponta entre os mais fortes ao governo do Estado? Você aceitaria esse desafio?

JS – Olha, eu só tenho trabalhado e feito muita política, mas a política energética. A obrigação que o presidente Lula me confiou foi de dirigir a Itaipu e eu tenho tentando dirigir da melhor forma possível. E, posso lhe garantir, não dá tempo. Se quiser fazer política, se quiser ser líder partidário, você não consegue dirigir bem Itaipu.