Rodada Cancún acaba tentando evitar fracasso

Depois de cinco dias de tensas conversas, recheadas com trocas de farpas entre os principais negociadores, os 140 países associados à Organização Mundial do Comércio (OMC) deverão concluir neste domingo, em Cancún, no México, um documento, mesmo que tímido, para evitar o fracasso da chamada Rodada de Doha – nome da capital do Qatar, onde foram lançadas, no fim de 2001, as negociações da OMC. O Brasil radicalizou em sua posição de não acertar nada, se não houver avanços em agricultura. Por isso, os negociadores brasileiros estão dispostos até a forçar o adiamento da data prevista para o fim da rodada (janeiro de 2005), se os interesses do País não forem atendidos.

Brasília (AG) – Desde o início da semana, o cenário em Cancún beira o patético. De um lado, Estados Unidos e União Européia pressionam, ameaçam e tentam rachar o bloco de países em desenvolvimento que apresentou uma proposta na OMC exigindo o fim dos subsídios agrícolas às exportações, a redução do apoio doméstico aos produtores locais e o maior acesso aos mercados. O grupo aumentou, passando de G-20 para G-21 com a entrada do Egito e G-22 com a intenção da Turquia em se associar. E ainda poderá ser ampliado com a adesão de Nigéria, Zâmbia e Quênia.

O bloco ganhou a simpatia de organizações não-governamentais, que chegaram a ser impedidas de participar de conferências de imprensa quando, na quinta-feira passada, um manifestante atirou uma espiga de milho não-transgênico na mesa em que estava o negociador americano Peter Al-lgeier. Foi ele quem, há cerca de duas semanas, levou uma torta na cara durante uma palestra no Rio.

– Os países desenvolvidos estão em dívida com as nações em desenvolvimento. Esta rodada de negociações tem de ser nossa – disse o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), um dos críticos do protecionismo dos países mais ricos do mundo. – Estamos assistindo a um pacto entre EUA e União Européia contra os países em desenvolvimento. Só os subsídios agrícolas equivalem a US$ 1 bilhão por dia, valor que daria para dobrar a renda de um bilhão de miseráveis que recebem apenas um dólar por dia. São pessoas que estão com a mão na enxada e com a panela vazia.

O fato é que o Brasil – como primeiro produtor mundial de carne, suco de laranja, açúcar e café – terá de ceder para obter ganhos com o fim das barreiras às suas exportações. Por isso, joga alto para não perder nas negociações pois, caso contrário, abrirá à toa áreas estratégicas, entre elas serviços financeiros, compras governamentais, investimentos e setores sensíveis, como informática, telecomunicações, automotivo, eletroeletrônico e de bens de capital.

– É fundamental uma reforma urgente nas regras do comércio agrícola mundial, pois é na agricultura onde reside a possibilidade de desenvolvimento dos países – afirmou por telefone, na sexta-feira à noite, de Cancún, o ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rosseto.

– Não existe política agrária sem política agrícola – acrescentou o ministro.

Um estudo da Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (Cepal), apresentado na Conferência Ministerial da OMC na última sexta-feira, confirma o que dizem algumas ONGs. O trabalho mostra que os compromissos e as regras do sistema de comércio multilateral limitam as possibilidades de os países em desenvolvimento fortalecerem suas capacidades internas.

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