O capital de investidor estrangeiro não dá sinais de que vá voltar com força tão cedo à Bolsa brasileira. Em 2018, depois de episódios como a greve dos caminhoneiros e as incertezas no período de eleições, o ano fechou com saldo negativo de R$ 5,6 bilhões desses recursos. A expectativa para 2019 era de retomada desses investimentos, fundamentada principalmente na aprovação da reforma da Previdência, que foi promulgada na última terça-feira. Mas o ano tem tido recordes de saídas: no acumulado até 11 de novembro, segundo dados da B3, o saldo está negativo em R$ 5,9 bilhões.

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Em meados de agosto, o acumulado superou as perdas no mesmo período de 2008, ano da crise econômica global. Em outubro, o saldo foi pior do que no mesmo mês de 2018, período eleitoral: R$ 8,4 milhões no vermelho ante R$ 6,2 milhões de um ano atrás.

Alguns dos efeitos desse desinteresse estrangeiro pelo Brasil são a desvalorização cambial e a espera adiada de uma valorização mais intensa dos ativos. Para o economista-chefe da corretora Necton, André Perfeito, a espera da volta do capital que vem de fora do País ainda pode demorar e frustrar expectativas.

“As reformas empolgaram o investidor local. Além disso, os juros mais baixos empurraram esse cliente para a Bolsa em busca de rentabilidade, o que levou à valorização do Ibovespa. Nesse processo, teve gente que comprou na esperança de vender os papéis na alta para o estrangeiro. Mas o estrangeiro não é bobo, não vai comprar o ativo mais caro em um momento em que a América Latina está tão confusa”, diz Perfeito. Ele comenta ainda que o investidor estrangeiro está mais reativo. “Eles vão esperar os resultados das reformas e não apostar nas expectativas.”

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O descolamento entre as altas e quedas do Ibovespa e as entradas e saídas de recursos estrangeiros no País podem ser observadas desde as eleições de 2018. Com a maior presença de pessoas físicas investindo na Bolsa de Valores e a crescente alocação de fundos de investimento em renda variável, a confiança local tem sustentado recordes de valorização do Ibovespa.

Até outubro, eram mais de 1,5 milhão de CPFs cadastrados na B3, e o índice chegou à marca histórica de 108 mil pontos – mais tarde, no último dia 7, fechou acima dos 109 mil pontos. “O mercado está um pouco decepcionado com a saída do estrangeiro. O fluxo interno tem contribuído para as altas da Bolsa. Agora, seria melhor com investidor de fora colocando dinheiro”, diz Luís Sales, analista da Guide Investimentos.

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Para além da expectativa adiada de um “boom” dos ativos com entrada de capital estrangeiro, o câmbio também sofre pressão da saída dos recursos. “Entre 2011 e 2012, os estrangeiros tinham 22% da dívida brasileira, hoje têm cerca de 11%. Isso se reflete no risco país e na alta do dólar”, explica o economista do BTG Digital, Álvaro Frasson. Segundo ele, nesse contexto, novas altas da Bolsa não devem ser motivadas pela política monetária (mais cortes na taxa básica de juros da economia): “Os juros já estão precificados na Bolsa.”

A Selic está em seu nível mais baixo – 5% ao ano – e é esperada mais uma redução em dezembro.

Para ele, o otimismo do estrangeiro em relação ao Brasil deve aumentar quando os indicadores de crescimento do País voltarem a avançar. Frasson afirma ainda que os recordes registrados na Bolsa são frutos de uma visão local: “O Ibovespa, para quem olha os valores em dólar, está longe das máximas.”

Compensação

A falta de empolgação com o mercado brasileiro ficou evidente em eventos recentes, nos quais se esperava maior participação do capital externo. Na última semana, a oferta secundária de ações (“follow on”) do Magazine Luiza, que tinha expectativa de vender 60% dos papéis para estrangeiros, terminou com apenas 40% nas mãos de aplicadores externos. O restante ficou com investidor local.

É justamente no aumento de demanda interna e no fato de que o brasileiro ainda investe pouco em ativos de renda variável que está a grande aposta de quem tem expectativas positivas para o mercado local, mesmo sem recursos de fora do País.

Para Michel Viriato, coordenador do laboratório de Finanças do Insper, ainda há espaço de crescimento para os ativos locais apenas com o fluxo doméstico. “Se o estrangeiro não voltar em um horizonte tão próximo, a força motora vai ser a realocação do investidor local. Esse investidor de fora não precisa voltar tão logo, mas também não pode sair com força”, diz.

Para o diretor comercial da Easyinvest, Fábio Macedo, tentar prever o momento da volta dos recursos estrangeiros para fazer preço nos ativos pode ser uma cilada. “Isso não tem data certa para acontecer. É difícil acertar esse momento. As reformas estruturais que vêm sendo feitas pelo governo federal contribuem para essa volta, mas a verdade é que, se o investidor tentar acertar o momento em que esses recursos vão voltar e afetar os preços, esse momento pode passar”, afirma.

Cenário internacional

O receio de uma desaceleração global e a guerra comercial entre China e Estado Unidos, que se arrasta desde 2018, já seriam razões suficientes para diminuir o apetite por risco do investidor internacional. Além disso, o cenário vivido na América Latina, com suspeitas de fraude eleitoral na Bolívia, protestos no Chile e a eleição de Alberto Fernando e Cristina Kirchner na Argentina, contribuem ainda mais para a falta de confiança no mercado brasileiro.

“A situação da economia mundial andou de lado. A percepção de risco não mudou. De longe, o gringo vê a América Latina e os emergentes de uma forma só, parecida”, diz o economista da corretora BTG Digital, Álvaro Frasson.

Para o professor do Insper, Michel Viriato, o medo de recessão global é menor hoje do que há um ano, mas não pode sair do radar do investidor. “Se surgir uma tempestade internacional, o Brasil, que não se recuperou completamente, sofreria muito.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.