O economista Paulo Tafner, um dos maiores especialistas em Previdência do País, diz que, se a proposta de mudança nas regras de aposentadorias trouxer economia inferior a R$ 850 bilhões em dez anos, o Brasil terá de voltar a discutir o tema em prazo entre um e dois governos. Além disso, ainda que a proposta não seja tão desidratada no Congresso, Tafner entende que nem mesmo R$ 1 trilhão de economia será suficiente para criar um regime de capitalização clássico – no qual apenas o trabalhador poupa para a própria aposentadoria. Seria necessário haver contribuição patronal ou um novo imposto, afirma.

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O deputado Paulo Pereira da Silva (SD-SP) disse esta semana que quer fazer uma reforma da Previdência desidratada para impedir a reeleição do presidente Jair Bolsonaro. Qual sua avaliação disso?

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Um sindicalista que vira político com essa preocupação de fazer uma reforma que, eventualmente, favoreça ou venha prejudicar um ou outro candidato, é evidentemente um parlamentar que trabalha contra o povo. Quem luta pelo bem do País e para recuperar os 13 milhões de empregos que estão perdidos, obviamente não deveria se preocupar com reeleição. Devia estar preocupado com o emprego dos trabalhadores que ele, supostamente, representa.

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O quanto de “desidratação” da proposta de reforma da Previdência seria aceitável?

Pragmaticamente falando, para não se comprometer estruturalmente o equilíbrio da dívida, trajetória de juros e recuperação da economia é, necessário uma reforma que traga uma economia de, no mínimo, R$ 850 bilhões (em dez anos).

Abaixo disso, o País teria de discutir novamente o tema em quanto tempo?

Muito rapidamente. Imagino que, se não houver essa economia, mais um governo ou outro e estaríamos de volta a debater nova reforma da Previdência. E mais dura, obviamente. Se não fizermos uma boa reforma agora, as finanças públicas vão continuar estranguladas. Não é coincidência estarem com atrasos em aposentadorias, pensões e salários os Estados do Rio Grande do Sul, Goiás, Minas Gerais, Rio Grande do Norte e outros que vão se juntar a eles ainda este ano, como Maranhão e Piauí.

Como o sr. avalia a possibilidade de se tirar a extensão a Estados e municípios do texto da proposta?

É muito ruim. A situação dos Estados é dramática. Porém, temos visto alguns governadores se colocando contra a reforma. Querem, em certo sentido e de forma populista, não ter desgaste por fazer a reforma, mas colher os benefícios dela. Isso tem feito com que os deputados se posicionem a fazer as mudanças só para a União.

Para manter esses R$ 850 bilhões, o que não pode sair da reforma de jeito nenhum?

A fixação da idade mínima é crucial. Também o período de transição, que é curto, e o combate frontal ao privilégio, basicamente concentrado no setor público. Se isso for modificado, obviamente começamos a descaracterizar a reforma.

Esse volume de economia daria para iniciar um regime de capitalização?

Teremos de discutir muito a capitalização. Certamente, para um regime com contribuições exclusivas dos trabalhadores, nem R$ 1 trilhão será suficiente para bancar a transição. Teria de haver uma contribuição patronal ou criar um imposto para financiar isso. Parto do pressuposto de que não haverá imposto. Assim, não será possível criar, nos moldes clássicos da capitalização, porque não há espaço fiscal.

E quanto seria necessário?

Teria de ter algo em torno de R$ 1,3 trilhão a R$ 1,4 trilhão no mesmo prazo e com uma capitalização progressiva.

O senhor é a favor de um regime de capitalização?

Levo em consideração o que dezenas de países estão fazendo, combinando as virtudes da repartição (na qual quem trabalha paga o benefício de quem se aposentou) com as da capitalização (na qual cada um poupa para sua própria aposentadoria), procurando minimizar vícios, erros e fragilidades de cada um dos sistemas. Pode-se fazer uma repartição mais restrita, de até dois ou três salários mínimos e, acima disso, a capitalização. Podemos caminhar para um sistema híbrido.

O sr. sempre fala de combate aos privilégios. De que tipo está falando?

Um trabalhador pobre, compulsoriamente, já se aposenta aos 65 anos. Outro, qualificado, que tem emprego, renda mais alta, se aposenta, em média, aos 56 anos, se homem, e aos 52 anos, se mulher. Ao mesmo tempo, há categorias onde se aposenta com menos de 50 anos. Servidores públicos, além da aposentadoria precoce, recebem R$ 30 mil. Sobretudo no Judiciário, podem chegar a R$ 50 mil a R$ 70 mil mensais. Combater o privilégio na reforma, mais do que um imperativo fiscal, é um imperativo moral.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.