Empresas do Centro-Sul do País que buscam mão de obra no interior do Nordeste para a produção agroindustrial estão voltando de suas missões de contratação com as mãos abanando. Mesmo experientes encarregados de recrutar gente para trabalhos de temporada, como a safra da cana, encontram limites para a formação das equipes que vão empunhar o podão nas áreas de colheita manual entre abril e novembro.

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“Está mais difícil de conseguir gente”, afirma José Jorge Dias, de Missão Velha, vizinha de Juazeiro do Norte, a 543 quilômetros ao sul de Fortaleza, encarregado de buscar peão para derrubar cana em lavouras da região de Piracicaba, interior paulista. Trabalhando para um consórcio de 76 produtores, o Concentral, em Rio das Pedras (a 170 quilômetros de São Paulo), Dias afirma que “antigamente era mais fácil contratar”. Habituado com o recrutamento de peão nordestino, responsável por um grupo de 14 cearenses trazidos para a safra que vai até novembro, Dias explica que a oferta de empregos na construção civil e na mineração no Nordeste, além da mecanização da lavoura paulista, prejudicam o convencimento na hora de formar a turma.

Há duas semanas, Dias desembarcou do ônibus da Concentral que retornava do corte em uma área em Mombuca, cidade vizinha de Rio das Pedras, acompanhado pelo colega Romário Amorim Barbosa, outro encarregado de turma. Os dois, ao lado do paulista Donizete Moacir Aparecido da Silva, proprietário do Alojamento do Zetão, de Rio das Pedras, tocam parte do grupo de trabalhadores da Concentral, que tem 520 no podão.

Nem mesmo a seca que torra o chão da área rural nordestina provoca debandada de gente no rumo do sul para trabalhar, admitem os encarregados de turma – que não gostam de serem chamados de “gato”, termo que julgam pejorativo. “Gato é ladrão”, diz Zetão.

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“O pessoal agora está mais exigente”, conta Barbosa, encarregado de recrutar no interior da Bahia. Morador de Itiruçu, perto de Jequié, ele diz que o pessoal só aceita vir se conhece bem a empresa contratante, se puder voltar para casa no fim da safra e se tiver alojamento e quem faça a comida deles. “Ninguém mais quer vir se tiver de fazer a comida”, completa Zetão, que está na lida da coordenação de peão há mais de 20 anos. “O pessoal está sofrendo muito lá com a seca. Mas não é mais como era antigamente, que se tinha mais facilidade para conseguir gente”, emenda Dias.

Dono do alojamento na periferia de Rio das Pedras, Zetão explica que oferece acomodações para 84 trabalhadores, com 12 banheiros, cozinha e dormitórios. “Tem gente que já veio trabalhar com a gente em muitas safras.”

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Carteira assinada. De acordo com José Francisco da Silva Filho, produtor rural que lidera o consórcio Concentral, os trabalhadores que aceitam migrar para a safra exigem pagamento das passagens, de vinda e de volta, além de cesta básica de R$ 95, mais ajuda de custo de R$ 100 para aluguel, entre outros benefícios de um trabalhador contratado por tempo indeterminado. O presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Piracicaba e Saltinho, Jacob Alcides Bortoletto, explica que a carteira assinada garante aos trabalhadores migrantes o recebimento do seguro-desemprego. “Esse pessoal que vem já está acostumado, é registrado lá na cidade deles e tem seguro, ônibus, tudo por conta de quem contrara.”

Jossivan Bezerra dos Santos, de 36 anos, de Ipaumirim, também vizinha de Juazeiro do Norte, a 550 quilômetros de Fortaleza, conta ter deixado mulher e três filhas em casa. “É difícil passar esse tempo longe da família. Mas não tem jeito”, contava o nordestino, que está nessa vida de cortador de cana há sete safras. “Está na hora de parar.” Ele conta que plantou 4 hectares de feijão em seu sítio e perdeu tudo na seca. “A gente tem o Bolsa Família, mas é só R$ 134”, diz Jossivan, que espera faturar no corte da cana cerca de R$ 800 limpos por mês até novembro. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.