A recessão na economia brasileira tem provocado um hiato entre o ritmo de desvalorização do real e o tamanho do repasse aos preços, mas o efeito do câmbio existe e continuará afetando a inflação, afirmou nesta quinta-feira, 17, Salomão Quadros, superintendente adjunto de Inflação da Fundação Getulio Vargas (FGV). “O câmbio começou a afetar os preços de julho para cá. Em outras ocasiões, teria tido impacto até maio, mas não podemos ignorar. O câmbio está fazendo efeito devagar, mas está fazendo”, disse.
No atacado, matérias-primas como soja, trigo e bovinos sobem impulsionadas pela desvalorização do dólar (no caso das carnes, há também o período de entressafra da pecuária). Os materiais para a manufatura, um termômetro de como o câmbio reflete na inflação, ficaram 1,38% mais caros na segunda prévia do Índice Geral de Preços – Mercado (IGP-M) de setembro.
No varejo, óleo de soja, pão francês, carne bovina e farinha de trigo dão sinais de que o dólar está vivo nos preços. Só o pãozinho avançou 1,41% na leitura do IGP-M divulgada hoje. Bens duráveis como automóveis e eletrodomésticos, porém, não têm tido chances de repasses a despeito do aumento de custos – as vendas nesses segmentos já despencam a dois dígitos, inviabilizando elevações de preços.
Ainda assim, as variações são baixas considerando ciclos de repasse verificados no passado. “De julho para cá, tivemos 30% de desvalorização do real, mas a recessão está fazendo com que isso não seja repassado. Os produtores ficam reticentes diante de um mercado tão retraído, mas tem uma pressão de custos”, afirmou Quadros.
“O repasse acontece aos poucos e deve continuar, principalmente se o dólar seguir avançando e passar de R$ 4”, disse. “Por outro lado, com a recuperação da economia mais longe, o repasse fica mais difícil”, ponderou o superintendente.
Além da pressão do câmbio, os próximos IGPs devem trazer a aceleração dos alimentos, após um curto período de alívio nos preços. No atacado, a queda já foi praticamente zerada, e alguns produtos como batata-inglesa já estão subindo. “Os alimentos in natura no varejo vão seguir o caminho do atacado, o efeito de queda tende a suavizar”, disse Quadros.
Em 12 meses, o IGP-M chegou a 8,04% até a segunda prévia de setembro, nível que deve ser o “teto por hora”, segundo o superintendente. “Agora vem um período de oscilação”, afirmou.