A queda livre dos preços do barril de petróleo, que já operam abaixo de US$ 60 o barril, poderá colocar em xeque as políticas que estão sendo traçadas para dar maior competitividade ao setor sucroalcooleiro. Atoladas em dívidas, as usinas em operação no País aguardam, com muita expectativa, para o início do ano, duas medidas emergenciais que poderão dar fôlego ao caixa dessas empresas: o retorno da Contribuição de Intervenção sob o Domínio Econômico (Cide), tributo sobre a gasolina, e a elevação da mistura do etanol dos atuais 25% para 27,5% no combustível.
As duas medidas, se adotadas, juntas, dariam um respiro maior ao setor. A Cide tornaria o etanol mais atraente nas bombas ao consumidor, uma vez que o tributo incide sobre a gasolina, e a alteração da mistura geraria uma demanda extra anual de 1,1 bilhão de litros pelo etanol, enxugando a oferta do produto do mercado.
A grande dúvida, contudo, é como o governo federal vai equacionar essas duas questões com a queda dos preços do petróleo, segundo especialistas ouvidos pelo Estado.
Os preços da gasolina praticados no País estão, em média, entre 20% e 25% maiores do que no mercado internacional. “O ponto é saber como o governo vai se posicionar. A Petrobrás precisa gerar caixa. O movimento óbvio seria a redução dos preços da gasolina ao consumidor, mas provavelmente isso não vai ocorrer”, diz Plinio Nastari, presidente da Datagro, consultoria especializada em açúcar e etanol.
“Mas, se a volta da Cide for antes, tornará a gasolina mais cara, o que traz um problema com a inflação. Por isso, a adoção do tributo poderá ter outra recomposição”, afirma Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infraestrutura(CBIE).
O tributo era de R$ 0,28 sobre o litro da gasolina quando foi totalmente reduzido em meados de 2012. “A valores atualizados, equivaleria a R$ 0,42”, afirma Nastari.
Nastari e Pires acreditam que a Petrobrás poderá “absorver” parte da Cide para que o aumento do preço da gasolina ao consumidor seja menor. “Outra possibilidade é a Petrobrás absorver tudo, o que é mais improvável, uma vez que agora consegue recompor parte do caixa com os preços maiores da gasolina comparados ao mercado internacional”, diz Pires.
Segundo ele, os preços da gasolina no País oscilam contra as regras do mercado. “Enquanto as cotações do etanol na bomba variam de acordo com a oferta e demanda da safra de cana, com a gasolina tem sido diferente. O governo tem controle maior sobre o preço do combustível. Em 2008, quando o barril chegou a bater US$ 150, o governo subsidiou o preço da gasolina. Quando caiu a US$ 40, dois anos depois, não fez o repasse ao consumidor.”
“Com o nível de alavancagem alto, o mercado entende que a Petrobras precisa reajustar os preços do combustível (para cima) para melhorar o caixa”, diz Alexandre Figliolino, diretor do Itaú BBA, especialista em açúcar e etanol.
À frente da presidência do conselho da União da Indústria da Cana-de-Açúcar (Unica), Roberto Rodrigues, ex-ministro da Agricultura na primeira gestão do governo Luiz Inácio Lula da Silva, está discutindo com o ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, a adoção dessas duas medidas para o setor sucroalcooleiro. Rodrigues também não acredita que a Cide poderá ser adotada como antes, uma vez que a nova equipe da presidente Dilma Rousseff tem uma preocupação central, que é promover o ajuste fiscal em 2015. “Mas precisamos entender qual a matriz energética que o Brasil quer ter. O governo tem de definir qual”, diz. Para o ex-ministro, essas medidas não salvam o setor, que deve hoje 110% da safra, Ou seja, deve mais do que arrecada. “Medidas estratégicas de longo prazo precisam ser pensadas.”
Ao Estado, fontes do governo confirmaram que o retorno da Cide está na pauta do Ministério da Fazenda e a elevação da mistura do etanol na gasolina também continua em análise.
Menor impacto
Mas, dependendo de como for adotada, a Cide poderá correr o risco de não deixar o setor sucroalcooleiro tão mais competitivo como se imaginava. “Temos de entender primeiro como vai ser essa recomposição. Sabemos que o governo quer preservar a Petrobras”, diz Nastari.
A elevação da mistura, sozinha, não resolveria o problema das usinas, mas a medida aliviaria também a estatal, que teria como impacto direto redução da importação da gasolina. “Se a mistura for elevada, aumentaria a demanda por etanol em 1,1 bilhão de litros por ano e reduziria a demanda por gasolina na mesma proporção”, observa Nastari. Entre janeiro e novembro deste ano, a Petrobras importou cerca de 2 bilhões de litros de gasolina, gerando despesa de US$ 1,47 bilhão, de acordo com a Datagro. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo