Curitiba está prestes a ser a primeira cidade do País a ingressar no projeto “Cidade Livre de Pirataria e do Comércio Ilegal”. Na próxima terça-feira, 1.º de dezembro, deverá ser assinado um convênio entre o Conselho Nacional de Combate à Pirataria e Delitos contra a Propriedade Intelectual (CNCP), a Prefeitura e algumas entidades que trabalham com o tema, para viabilizar o programa. Também faz parte do programa um projeto de lei municipal, que criará meios para o combate à ilegalidade.
“Constatamos que não basta combater a pirataria a nível federal. É importante também trazer essa motivação e prioridade aos municípios. É onde fisicamente se dá a pirataria”, explica o professor André Montoro, presidente do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (Etco), que é uma das organizações envolvidas com o projeto. Para ele, apesar de efetivas, as ações da Receita Federal e das polícias Federal e Rodoviária Federal não são suficientes para combater o problema mais de perto.
Segundo Montoro, após Curitiba, São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Ribeirão Preto deverão adotar o programa, ainda em fase piloto. Em uma etapa seguinte, a ideia é replicar o Cidade Livre aos 300 municípios mais populosos do País. O projeto envolve atividades, leis municipais e ações políticas, entre outros detalhes, que possibilitem uma mobilização de órgãos e instituições em torno do tema.
O presidente do Etco conta que Curitiba foi escolhida para inaugurar o projeto por uma série de motivos. O tamanho foi um deles, já que São Paulo e Rio de Janeiro são centros muito grandes, onde as possibilidades de dar errado seriam maiores. O fato do Paraná ser um Estado que, devido à fronteira com o Paraguai, é muito “atacado” pelo comércio ilegal também contribuiu. Por fim, ele afirma que o interesse da Prefeitura foi outro ponto a favor.
Na Prefeitura, a ideia é iniciar o programa envolvendo pelo menos duas secretarias, a Antidrogas e a de Urbanismo, além da Vigilância Sanitária e outros órgãos. O diretor de inteligência da Secretaria Municipal Antidrogas, Hamilton Klein, informa que as ações ainda não foram programadas, mas o envolvimento de Curitiba no projeto deve facilitar o trabalho integrado de mais órgãos municipais.
Klein afirma que o foco da Secretaria Antidrogas, por exemplo, é o combate ao comércio, no mercado negro, de medicamentos controlados. No entanto, com o projeto envolvendo mais secretarias, além do CNCP e as organizações ligadas ao assunto, a chance de que uma entidade ajude a outra é maior. “Assim, quem está no projeto acaba se envolvendo em tudo”, conta.
Recorrente
Por mais que haja mobilização nunca existiram tantas entidades, públicas ou privadas, de combate à pirataria , o comércio de produtos ilegais parece não diminuir no País. O fato preocupa o presidente do Etco, que prefere não usar o termo pirataria nas conversas, por achar que dá um tom “romântico” ao assunto. “O valor movimentado pelo comércio ilegal, no Brasil, é cerca de três vezes maior que em países mais desenvolvidos”, calcula.
Para Montoro, o fato do Brasil ser uma das bolas da vez na economia mundial tem que ser um motivador para uma mobilização nacional para reduzir o comércio ilegal. “A população tem que entender que um troco a mais ganho na compra ilegal de um produto não compensa os problemas causados por esse comércio”, observa.
“As rotas do contrabando são sempre as mesmas. Por onde vêm armas e drogas, vêm também bolsas, por exemplo”, lembra Montoro. “É uma logística bastante sofisticada e há verdadeiras multinacionais do crime envolvidas. O pobre do ambulante é só a ponta de uma cadeia que usa uma série de canais sofisticados”, completa.
Consumidor está mais conscientizado
O comportamento dos brasileiros em relação à pirataria foi tema de uma recente pesquisa nacional da Federação do Comércio do Rio de Janeiro (Fecomércio-RJ) e da Ipsos. A conclusão não foi muit,o diferente do ano passado: em agosto de 2009, o percentual de brasileiros que afirmaram ter consumido algum produto pirata no era de 46%, contra 47% no mesmo mês de 2008. Nos dois anos anteriores, a porcentagem era menor: 42%, o que leva a uma média de 44% nos últimos quatro anos.
Apesar de uma queda em relação ao ano anterior, o principal produto pirata consumido continua sendo o CD 78% das pessoas pesquisadas afirmaram terem consumido o produto no ano, ante 83% no ano passado. Para a Fecomércio-RJ, “a expansão do mercado de mp3 no Brasil, via ipods e celulares, e a maior disseminação do uso da internet, que ampliou a prática de se “baixar’ músicas pelo computador, especialmente entre o público consumidor de produtos piratas’, contribuíram para a queda.
Em segundo lugar entre os produtos piratas mais consumidos estão os DVDs, com 68%, contra 69% no ano passado. Apesar da estabilidade nos dois últimos anos, o consumo do produto aumentou significativamente em relação aos anos anteriores: em 2006, a porcentagem de pesquisados que consumiram DVDs piratas era de 35% e, em 2007, subiu para 53%.
De acordo com a Fecomércio-RJ, a facilidade para a reprodução das mídias de CD e DVD, e a elevada carga tributária sobre esses produtos, ajuda a explicar o quadro. A entidade informa que, sobre os produtos, incide 1,65% de Programa de Integração Social (PIS), 7,6% de Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), 15% de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e de 17% a 19% de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), dependendo do Estado.
E o preço mais em conta acaba sendo, de acordo com a pesquisa, o principal motivo citado pelos entrevistados para a compra de produtos piratas. Em 2009, foram 94% os pesquisados que citaram o motivo. Nos quatro anos da pesquisa, a média foi idêntica. O segundo motivo mais mencionado foi a maior facilidade de encontrar os produtos. A taxa, nesse caso, foi bem menor: 10%.
Para o presidente do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (Etco), André Montoro, a solução para reduzir a pirataria passa pelo difícil ponto da conscientização das pessoas a respeito do assunto. “É uma vantagem imediata para o consumidor, mas que prejudica toda a sociedade”, afirma. Ele admite, por outro lado, que a diferença de preço conta bastante, e que uma redução de impostos, pode ajudar a resolver a questão. (HM)