Procura excede demanda e provoca explosão do dólar

Longe do tempo em que os brasileiros faziam a festa nas lojas que vendiam pequenos importados, o patamar do dólar agora é R$ 3,99 – cotação do fechamento de ontem e novo recorde da moeda no Plano Real. A alta do dia foi de 3,10%. O descontrole do câmbio chegou a tal ponto que o Banco Central (BC), disposto a não gastar reservas sem resultado, não fez mais do que vender a costumeira ração diária. Segundo os operadores, o BC vendeu US$ 50 milhões (o que não foi confirmado pela autoridade monetária) e leiloou outros US$ 50 milhões em linhas de crédito à exportação.

Rio

  – A moeda chegou a ser negociada a R$ 4, pouco antes do fechamento do mercado. Não fosse a venda por parte de quem preferiu garantir logo o ganho a esse nível de preço, o dólar teria subido mais.

O mercado levantou a hipótese de que o teto de US$ 3 bilhões de uso das reservas internacionais em 30 dias (ponto do acordo com o Fundo Monetário Internacional, o FMI) já teria sido alcançado, impedindo intervenções diretas mais fortes pelo BC, que estaria com seu poder de fogo enfraquecido.

Além da preocupação com o vencimento da dívida pública atrelada ao câmbio, no próximo dia 17, no total de US$ 2,920 bilhões, operadores admitem que existe uma forte dose de especulação:

– O problema é que existe grande demanda por dólar e o BC tem sido praticamente o único vendedor. A pressão está associada às dívidas privadas e públicas, que as empresas também estão tendo dificuldades em rolar – disse o gestor do Bank of America Asset Management, José Alfredo Da Justa.

A dívida a vencer na próxima semana (papéis e contratos de swap que são corrigidos pelo dólar) era de US$ 3,6 bilhões, mas o BC renovou US$ 592 milhões na terça-feira. Na terça-feira passada, o BC renovou e recomprou US$ 600 milhões desses papéis. Ontem foram comprados mais US$ 80 milhões. Portanto, restam ainda US$ 2,920 bilhões que o BC terá de renovar ou recomprar até a próxima quarta-feira. Uma das hipóteses para a subida do dólar nos últimos dias é que os bancos estariam forçando a alta da cotação para lucrar com o vencimento da próxima semana.

O grande problema é que o BC está, no jargão do mercado, no córner: não tem muita opção para derrubar o dólar e conter a especulação. Se vender moeda no mercado à vista, compromete o total das reservas internacionais e dificulta a vida do próximo governo. Se renovar a dívida, estará se sujeitando a pagar um cupom cambial (os juros que se somam à valorização do dólar nesses contratos e papéis) que já chegou a 51% ao ano. Mesmo optando por resgatar em parte ou integralmente a dívida, como tem feito, o BC, na atual situação de escassez de divisas, acaba induzindo o dólar a se valorizar.

A tendência é que bancos e investidores continuem pressionando a moeda, para obter ganhos maiores com a formação da Ptax – cotação que remunera as aplicações cambiais e é calculada a partir da média do dólar na véspera dos vencimentos.

– Com a recompra (de contratos e títulos cambiais), não há renovação da proteção cambial das empresas e bancos, e os investidores que querem se manter protegidos vão comprar moeda à vista e fazem o dólar subir mais – explica Carlos Carvalho, da Questus Asset Management.

A trajetória do dólar se descolou dos demais indicadores do mercado financeiro. Prova disso é que o risco-Brasil, que mede a confiança do investidor estrangeiro na capacidade de o país honrar seus compromissos, encerrou ontem nos 2.275 pontos centesimais, praticamente estável em relação à véspera (o índice significa que o Brasil tem que pagar pelos títulos da dívida externa 22,75% mais que os juros pagos pelos papéis do Tesouro dos EUA).

Já o C-Bond, título mais negociado da dívida brasileira, foi negociado a 49,50% do seu valor de face, uma alta de 2,06% ante a véspera.

Até mesmo a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) ignorou a escalada do dólar e encerrou os negócios em alta de 1,73%, influenciada pelo movimento de recuperação das bolsas internacionais.

O diretor de Política Monetária do BC, Luiz Fernando Figueiredo, negou que o limite de uso das reservas internacionais nos últimos 30 dias já tenha sido ultrapassado.

– Não é verdade. (Estamos) longe disso – afirmou Figueiredo, por intermédio da assessoria do BC, recusando-se, no entanto, a informar qual a situação atual das reservas.

Na visão do BC, superar o limite de US$ 3 bilhões não significaria um constrangimento com o FMI. Se gastar mais do que o teto, o governo brasileiro é obrigado a dar uma explicação ao Fundo, a exemplo do que ocorre com as metas de inflação.

O presidente do BC, Armínio Fraga, informou anteontem que as reservas líquidas estão em US$ 18 bilhões. Esse valor exclui empréstimos do FMI, do Banco Mundial e do Bird, que elevam as reservas para US$ 37 bilhões. Descontando os pagamentos externos do governo, de US$ 2 bilhões até o fim do ano, o BC tem um poder de fogo de US$ 11 bilhões para intervir no câmbio nesse período, pois o acordo com o FMI estabeleceu um piso para as reservas líquidas de US$ 5 bilhões.

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