Átila Alberti / GPP |
![]() |
Segundo o Sindicarne, o prejuízo para o setor foi causado pelo embargo imposto por 27 países ao produto paranaense. |
Londrina (AE) – A pecuária paranaense teve um prejuízo de R$ 120 milhões desde 10 de outubro, quando foi confirmada a presença do vírus da aftosa no vizinho Mato Grosso do Sul. A estimativa foi feita ontem pelo presidente do Sindicato da Indústria de Carne e Derivados do Estado do Paraná (Sindicarne), Péricles Salazar.
A suspeita da doença no Paraná foi anunciada em 21 de outubro e, na última terça-feira, o Ministério da Agricultura confirmou a presença do vírus, localizado na Fazenda Cachoeira, em São Sebastião da Amoreira. O governo do Paraná, no entanto, contesta a presença da doença e promete recorrer à Justiça para reverter o laudo do ministério. A divergência motivou a criação, na quinta-feira, de comissão parlamentar, chefiada pelo deputado federal Abelardo Lupion (PFL-PR), para investigar qual dos dois lados está com a razão.
O prejuízo para o setor de carnes, explicou Salazar, foi causado pelo embargo imposto por 27 países ao produto paranaense, que poderá ser ainda maior se a Rússia, grande importadora de carne bovina e a maior compradora da carne suína paranaense, também suspender as importações. Essa eventualidade, segundo Salazar, é quase certa, devido à confirmação da doença, e deverá ser formalizada nos próximos dias. Outros países deverão seguir a decisão russa. O Paraná é o sexto exportador de carne do País.
Antes do surgimento da suspeita da aftosa, o Estado abatia mensalmente 140 mil bois e 3209 mil suínos. O presidente do Sindicarne defende que, independentemente da polêmica entre os governos federal e estadual sobre a aftosa no Estado, os animais da Fazenda Cachoeira sejam sacrificadas o mais rapidamente possível. Assim, segundo ele, o setor da carne contabilizaria prejuízo menor, pois, ocorrendo o sacrifício, os países importadores suspenderiam o embargo num prazo de seis meses e as restrições internas seriam levantadas. A carne paranaense só pode ser vendida para outros estados se estiver desossada e o leite tem de ser pausterizado.
Enquanto a polêmica continuar, observou, o setor continuará sendo penalizado e, em última instância, se o Estado não optar pelo sacrifício e sim pelo abate sanitário, as exportações somente serão retomadas um ano e seis meses depois. O sacrifício dos animais é feito na própria fazenda, onde também são enterrados, enquanto o abate sanitário é realizado em frigorífico, com aproveitamento da carcaça.
Os animais considerados infectados são 209 novilhas adquiridas em Eldorado (MS), no início de outubro. A Fazenda Cachoeira cria em regime de confinamento, cerca de 2 mil animais, que, de acordo com as normas sanitárias em caso de aftosa, terão de ser abatidos ou sacrificados. As novilhas, que estão isoladas do restante do rebanho, não manifestam os sintomas clínicos da aftosa – rachadura nos cascos e salivação.
Frigoríficos
Os dois maiores frigoríficos do Paraná, Margem e Garantia, localizados em Maringá (noroeste), reduziram os abates pela metade desde o surgimento da aftosa no MS. A diminuição da produção obrigou o Margem a demitir 200 funcionários; o Garantia deu férias coletivas à metade de seus funcionários enquanto esperava a definição sobre a aftosa no Paraná.
Com a confirmação da doença pelo Ministério da Agricultura, o frigorífico deverá ?demitir proporcionalmente? à redução de sua produção, segundo Willer Martins Giordano, diretor financeiro do Garantia, que não revelou o número de funcionários da empresa, que mantém uma unidade também em Amambaí (MS). O frigorífico abatia 1,2 mil animais por dia em Maringá, produção que caiu pela metade.
O Margem abatia 600 bovinos por dia, reduziu esse número para 300 e teve nos últimos 30 dias prejuízo de R$ 5 milhões, de acordo com Ivon Carlos Alvez de Almeida, gerente administrativo. Por causa da aftosa, ?o setor produtivo da carne terá um retrocesso de dois, três anos?, estimou Almeida.
Indústria considera abate como melhor alternativa
Lyrian Saiki
Abater os animais que o Ministério da Agricultura insiste em afirmar que têm aftosa parece ser a melhor alternativa para pôr fim à ?novela? que se arrasta no Paraná há quase dois meses. ?Não concordamos que haja aftosa no Paraná. Negamos e rechaçamos essa confirmação. Mas, como iniciativa privada, temos que ser frios e pragmáticos e pensar na atividade em si, na questão econômica?, afirmou o assessor econômico do Sindicato da Indústria de Carnes e Derivados do Estado do Paraná (Sindicarne-PR), Gustavo Fanaya. A entidade defende o abate de animais para que o Paraná reconquiste, o quanto antes, o status de área livre de aftosa.
Fanaya lembrou que a OIE (Organização Internacional de Epizooties) estabelece um período mínimo de seis meses para voltar a exportar – no caso do sacrifício sanitário, quando todos os animais da propriedade são abatidos – ou de 18 meses para o caso de encaminhar os animais para o frigorífico e aproveitar parte da carne (situação só recomendada quando a situação estiver fora do controle, o que não é o caso do Paraná). ?Já perdemos quase dois meses nisso. Não podemos perder mais tempo.?
Para Fanaya, o ideal seria que o Ministério da Agricultura retificasse a sua decisão quanto à confirmação da aftosa no Paraná. ?Mas nas atuais circunstâncias, é algo impossível?, disse. ?Para nós, está claro: o Ministério da Agricultura condenou o Paraná à aftosa e vai às últimas conseqüências. O que adianta lutar em uma batalha já perdida??, questionou. Apesar disso, Fanaya acredita que o Estado tem que continuar insistindo em afirmar que não tem a doença, para não sofrer pressão do mercado interno. Para o assessor econômico, outros estados podem se sentir pressionados a deixar de comprar carne do Paraná, o que seria fatal em se tratando principalmente de São Paulo.
É que o estado, sozinho, compra cerca de 5 mil toneladas de carne do Paraná por mês, representando cerca de R$ 18 milhões. É mais do que o total exportado pelo Paraná, que soma cerca de 3,5 mil toneladas, o que corresponde a US$ 7,5 milhões. Em moeda nacional, R$ 16,5 milhões por mês. ?O Paraná depende mais das vendas interestaduais do que das exportações?, comentou.
Área livre
Sem aftosa desde 1995, o Paraná conseguiu o status de área livre de aftosa com vacinação cinco anos depois, em 2000. Segundo Fanaya, mesmo agora com a confirmação da doença, o Estado não precisará recomeçar do zero.
?Nossa situação é outra. Antes, vínhamos de um processo de erradicação da doença. Agora, o processo fica interrompido por uma questão pontual, mas o fato de existir o foco não põe tudo a perder. O que o mercado internacional quer saber são as medidas tomadas?, explicou.
Segundo ele, ?se antes levou cinco anos (para conseguir o status), agora pode levar de seis meses a um ano.? ?Há dez anos, o Defis (Departamento de Fiscalização Sanitária Animal) não tinha nem carros, nem funcionários?, afirmou. Ele lembrou, porém, que para obter o status de volta é preciso que o Estado retome as boas relações com o governo federal. ?O Paraná, com segurança, vai voltar a ser área livre. Os auditores internacionais virão para cá checar a situação, ler os relatórios. Mas para que as etapas sejam cumpridas tem que haver boa vontade do Ministério da Agricultura?, arrematou.
Irresponsabilidade comprometerá economia do País, alerta Requião
O governador Roberto Requião disse ontem em Curitiba que o anúncio do Ministério da Agricultura sobre o surgimento de um foco de febre aftosa em uma fazenda no município de São Sebastião da Amoreira, na região norte do Estado, é uma estratégia para fazer um acordo internacional às custas do prejuízo dos pecuaristas paranaenses. ?Queremos um reexame. Se o vírus da aftosa for isolado, não digo mais nada. Mas enquanto isso não ocorrer, nós estaremos sendo sacrificados pela demagogia federal. E nós não vamos ceder à irresponsabilidade do Ministério da Agricultura?, afirmou Requião.
Para o governador, ao colocar em dúvida o resultado dos exames do Laboratório Nacional Agropecuário (Lanagro), que não foram conclusivos sobre o surgimento da doença no rebanho paranaense, o Ministério põe em dúvida a eficiência e a confiabilidade dos seus próprios laboratórios, e isso pode comprometer o País junto aos organismos internacionais.
?Se tivéssemos um exame de vírus positivo, tudo bem. Mas em 49 dias não acharam nada. Por isso, declarar o Paraná área com aftosa é de uma irresponsabilidade total. Aliás, o que eles estão dizendo ao confirmar a doença no Estado é que não confiam sequer no laboratório federal, que realizou os exames nas amostras, e cujos resultados foram negativos. Se eles não são confiáveis, não podemos sequer saber se há ou não aftosa no Brasil. É tudo questionável e essa irresponsabilidade pode comprometer o País?, garantiu.
Pressão
O vice-governador e secretário da Agricultura, Orlando Pessuti, reafirmou que houve precipitação do Ministério ao declarar o foco de aftosa no Paraná sem que o vírus tenha sido isolado. ?Ter sorologia positiva, origem suspeita ou sinais clínicos não significa obrigatoriamente que o rebanho do Estado tenha febre aftosa?, disse.
O vice-governador também adiantou que o governo do Paraná não vai autorizar o abate sanitário dos pouco mais de dois mil animais da fazenda com suspeita da doença e que a Procuradoria-Geral do Estado (PGE), auxiliada por representantes de todos os segmentos do setor de carne paranaense, está avaliando a estratégia que o Estado adotará para se defender contra as acusações do Ministério na Justiça.
Pessuti também afirmou que são mentirosas e de má-fé as acusações divulgadas pelo Ministério da Agricultura que o Paraná teria atrasado a notificação de casos suspeitos de aftosa e que, antes de torná-los públicos, o governo teria realizados exames em laboratório próprio.
Embargo russo
A Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec) confirmou a ampliação do embargo da Rússia à carne brasileira. Ao todo, a Rússia ampliou o embargo para, além do Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, São Paulo, Minas Gerais, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. A Rússia embargou a importação de carne bovina dos Estados onde foram registrados foco por 2 anos e os Estados vizinhos por 1 ano. O Rio Grande do Sul também foi embargado apesar de estar fora da definição existente no acordo sanitário entre Rússia e Brasil.
