O preço do GNV (gás natural veicular) bateu recorde histórico no país, afetando diretamente a vida de taxistas e motoristas de aplicativo que usam o combustível. No Rio, principal mercado consumidor, o aumento de custos está levando motoristas a abandonar a praça, segundo o sindicato da categoria.
Em um mês, o preço médio do GNV subiu 17%, segundo pesquisa da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis), como reflexo do reajuste de 39% no preço do gás natural promovido pela Petrobras no dia primeiro de maio.
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Os dados da agência mostram que o motorista brasileiro nunca pagou tão caro pelo combustível, que na semana passada valia, em média, R$ 3,80 por metro cúbico. É o segundo maior valor da série histórica da ANP, iniciada em 2004, perdendo apenas para a semana anterior (R$ 3,83).
A escalada vem motivando protestos entre os motoristas, que cobram do governo promessa de reduzir o preço do gás feita pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, logo no início do mandato do presidente Jair Bolsonaro.
Guedes prometeu um “choque de energia barata” com a redução do papel da Petrobras no mercado de gás e a aprovação do novo marco regulatório do setor, mas dois anos depois, a estatal ainda permanece a principal fornecedora do país.
O reajuste de 39% anunciado em abril reflete a recuperação das cotações internacionais do petróleo após a queda do início da pandemia e tem forte impacto da desvalorização do real frente ao dólar, que afetou não só o valor cobrado pelo combustível mas também o custo de transporte em gasodutos.
O percentual foi classificado como “inadmissível” por Bolsonaro. O repasse aos consumidores depende da legislação de cada estado. No Rio, por exemplo, é automático. Em São Paulo, deve ocorrer no dia 31 de maio, quando as tarifas das distribuidoras de gás canalizado são reajustadas.
“Muitos colegas estão deixando os táxis parados e buscando outra alternativa de trabalho porque não conseguem mais ganhar o suficiente para sustentar suas famílias”, diz o diretor de Comunicação do Sindicato dos Taxistas Autônomos do Município do Rio de Janeiro, Vagner Monteiro.
Segundo ele, para evitar desperdício de combustível, os taxistas da cidade passaram a ficar mais tempo parados em pontos, ao invés de passar o dia circulando em busca de passageiros, procedimento conhecido pela categoria como “rolé”.
“Tivemos que mudar a maneira de trabalhar”, diz ele, que calcula uma perda de 40% no faturamento diário dos profissionais. “Aqui, o usuário está acostumado em pegar o táxi em qualquer lugar, sem precisar ir a um ponto.”
Diante da forte competição com aplicativos de transporte, as tarifas de táxi no Rio estão congeladas há três anos. Monteiro diz não ver espaço para repasse da alta de custos na situação atual. “A concorrência não permite isso. Se tiver algum reajuste agora, vai ser um problema muito maior.”
Os motoristas de aplicativo, por sua vez, promoveram um protesto contra o aumento na semana passada, com carreata que terminou em frente à sede da Petrobras, no centro da cidade. Nos discursos, muitas críticas à estatal e ao governo.
“O custo do GNV inviabilizou o negócio”, diz Denis Moura, diretor-executivo da Associação dos Motoristas Particulares Autônomos do Rio. A situação é complicada pelos descontos oferecidos pelas empresas do setor para recuperar mercado perdido para a pandemia.
“Nos grupos [de aplicativos de mensagens], o que temos observado é que vários motoristas estão buscando outra atividade”, afirma ele. O transporte de passageiros por aplicativos tem sido desde a crise iniciada em 2014 uma das principais alternativas ao desemprego no país.
Em lados opostos no embate sobre o direito a prestar o serviço, taxistas e motoristas de aplicativo concordam que a perda de renda tem efeitos na qualidade do serviço, podendo ser um catalisador de acidentes nas cidades.
“Tem colegas trabalhando 14 horas, 15 horas por dia. Isso gera uma série de problemas em cadeia”, diz o taxista Monteiro. “Cai a qualidade do trabalho dos motoristas, cai a qualidade do carro, aumenta insegurança. O resultado é péssimo”, diz Moura.
Os dois reclamam de falta de ação do governo federal para resolver a questão. Criticam também as alíquotas do ICMS cobrado pelos estados sobre as vendas do combustível. “Não pode um produto que sai a pouco mais de R$ 1 da refinaria chegar na ponta a quase R$ 5”, diz o representante dos motoristas.
Monteiro frisa que os taxistas não têm ascendência sobre o governo como os caminhoneiros, que vêm sendo alvos de pacotes de ajuda para enfrentar a escalada do preço do diesel, que também está no maior patamar desde o início da pesquisa da ANP.
A política de preços da Petrobras para o gás natural acompanha a cotação do petróleo Brent, referência internacional negociada em Londres, e a taxa de câmbio que hoje torna os preços internos mais caros do que em 2008, quando o petróleo bateu US$ 100 por barril.
A empresa está propondo às distribuidoras um novo contrato, indexado pela cotação do gás natural nos Estados Unidos, defendendo que é um modelo mais previsível. A avaliação do mercado, porém, é que a mudança, por si só, não garante redução dos preços.