Preço da energia cai e preocupa geradoras

O megaleilão de energia, promovido ontem pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), em São Paulo, provocou preocupação entre as geradoras de energia. A cada nova rodada, o preço do produto era menor e, ao final da primeira fase – que durou pouco mais de sete horas -, o deságio chegou a 22% em relação ao valor inicial. O leilão gerou ainda reflexos na Bolsa de Valores, que fechou o dia com queda de 2,51%, puxada pelas empresas de energia.

A primeira fase do leilão de energia existente foi concluída depois de 21 rodadas de lances. A energia comercializada para o período de 2005 a 2013 fechou cotada a R$ 62,10 por megawatt/hora, um deságio de 22,37% em relação ao preço inicial, de R$ 80. A energia para 2006 a 2014 foi cotada a R$ 71 por megawatt/hora, um desconto de 17,44% sobre o preço inicial, que era de R$ 86. Para o período de 2007 a 2015, o preço ficou em R$ 77,70, o que representa um deságio de 16,45% sobre o preço inicial, de R$ 93. O lote de 2007 a 2015 foi o único que registrou excesso de oferta na última rodada da primeira fase, o que garantiu às geradoras a possibilidade de fazer propostas adicionais na fase seguinte. Ou seja, realocar lotes de energia para outros períodos.

Na primeira fase, os preços formados serviram somente como sinalização para a segunda fase – iniciada no início da noite de ontem -, quando efetivamente seriam fechados os detalhes de preço e de volume de energia a ser feito entre geradoras e distribuidoras. No encerramento da segunda fase constatou-se, entre outros resultados, que a Copel Distribuição adquiriu energia por valores diversos, partindo do mínimo de R$ 51,73 o MWh, da Ligth, para o período 2005/2008, até o preço máximo de R$ 69,98 o MWh, para o período 2006/2008, da Duke.

Preocupação

"Os preços nesses níveis estão seguramente chegando num nível de risco (para as geradoras)", disse Cláudio Sales, diretor-presidente da CBIEE (Câmara Brasileira de Investidores em Energia Elétrica). "Os preços razoáveis com certeza seriam acima dos praticados agora", afirmou ele.

Também para o consultor de empresas e ex-presidente da Copel, João Carlos Cascaes, a forma como o leilão estava evoluindo ontem – com os preços inferiores aos valores iniciais – pode trazer mais efeitos negativos do que positivos. "Pode inibir as empresas geradoras, especialmente as estatais como a Cemig, Copel, Furnas, a novos investimentos", ponderou Cascaes. A redução do preço, segundo ele, também pode inibir investimentos estrangeiros. "Percebendo que há energia barata no Brasil, pode haver receio de investir em geração", afirmou. "Os investimentos só vão acontecer se a energia trouxer lucro."

Para Cascaes, o leilão promovido pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) poderia ter um formato diferente, com a separação da energia térmica da hidrelétrica e a revisão do conceito de energia nova e velha. "O modelo como um todo poderia ter outro formato", criticou.

Cascaes também lamentou a decisão do STF, que cassou a liminar que prorrogava o contrato inicial entre a Copel Geração e a Copel Distribuição até 2015. "O Paraná é uma exceção no País. Graças à competência de alguns governadores, foi possível fazer uma empresa como a Copel ser rentável. Todo este esforço agora é colocado para a nação, quando o Paraná poderia ter um diferencial", criticou. "É algo lamentável, injusto."

Leilão

O leilão teve início às 11h, com uma hora de atraso, e foi interrompido 20 minutos depois. A interrupção foi causada por uma das geradoras participantes, que reclamou que um de seus lances não foi registrado. A comissão organizadora do leilão analisou o caso e rejeitou a reclamação, por entender que a falha foi da geradora, informou o presidente do conselho da câmara, Antônio Carlos Machado.

Bolsa de Valores

O leilão de energia promovido ontem mexeu com o mercado de ações. A Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) fechou ontem com queda de 2,51%, puxada especialmente pelas empresas de energia. As ações da Copel PN tiveram queda de 7,83%, a Eletrobras PN, queda de 8,96% e a Cesp PN, queda de 9,43%.

Mudança do setor elétrico

O megaleilão de energia velha – aquela produzida por geradoras que já amortizaram seus investimentos -marca a mudança estrutural do setor elétrico, desenhada pelo Ministério de Minas e Energia. Antes, cada geradora comercializava energia diretamente com uma ou mais distribuidoras.

Isso permitia desequilíbrios como, por exemplo, as distribuidoras do Nordeste pagarem mais caro pela energia – adquirida das termelétricas. Agora, com o leilão tenta-se equalizar as tarifas, pois todas as distribuidoras comprarão do "pool" a um preço médio.

Também permitia que geradoras e distribuidoras do mesmo grupo negociassem diretamente – ao preço que lhes conviesse. Os aumentos de custo eram repassados ao consumidor pela distribuidora. Também garantia a colocação de toda a energia gerada, dentro do próprio grupo.

A Copel Geradora, por exemplo, vendia 100% de sua produção à Copel Distribuidora ao preço de R$ 64 o MWh. Agora, ela venderá a um "pool" – o mercado onde se organizam as compras e vendas em leilão. E todas as distribuidoras comprarão energia a um preço médio desse "pool". Segundo analistas, na nova modelagem dificilmente a Copel venderá toda a energia disponível se buscar o maior preço.

El Paso pode abandonar setor elétrico

São Paulo (AE) – Um dos principais investidores do setor de energia nos últimos anos, a americana El Paso iniciou ontem a segunda reestruturação de suas atividades no País no período de 18 meses. Desta vez, foram demitidos cerca de 20 funcionários, incluindo 3 vice-presidentes, e há rumores no mercado de que a empresa vai abandonar as atividades no setor elétrico, focando suas operações na exploração e produção de petróleo e gás natural. Na primeira reestruturação, há um ano, o corte atingiu 40 empregados.

Oficialmente, a El Paso confirma apenas as demissões e a decisão de focar suas operações no segmento de petróleo e gás. Segundo a assessoria de imprensa da companhia, a reestruturação brasileira segue estratégia semelhante à adotada pela matriz, em Houston, Texas, que a exemplo da também texana Enron foi acusada de fraudar números de seu balanço. A multinacional chegou ao Brasil em 1997 e já investiu cerca de US$ 2,2 bilhões, principalmente em térmicas nas regiões Norte e Sudeste. Há três anos, inaugurou em sua sede do Rio uma moderna mesa de operações para atuar no então incipiente mercado de comercialização de energia elétrica.

A mesa, tida como a mais moderna da América Latina, quase não chegou a ser usada: o mercado livre de energia foi reduzido a praticamente zero com o novo modelo do setor. Os investimentos em térmicas, por sua vez, enfrentam os mais diversos problemas. No Norte, onde a empresa é responsável por 60% do fornecimento de Manaus, a estatal Eletrobrás bateu de frente com a El Paso, pedindo redução dos preços de venda da energia, e ainda não renovou os contratos. No Paraná, onde a multinacional planejava investimentos de US$ 340 milhões na construção de uma térmica, o governador Roberto Requião simplesmente cancelou o contrato.

Ontem, a companhia informou que continua negociando soluções para os dois impasses – de maneira amigável com a Eletrobrás e na Justiça com Requião. A assessoria de imprensa da El Paso informou ainda que não há projetos de venda de ativos neste momento. Em recentes apresentações a investidores internacionais, executivos da matriz norte-americana vêm informando que os ativos que não tenham integração com outros negócios da companhia devem ser vendidos, dentro do profundo processo de redução de gastos e revisão das atividades.

O Brasil porém, figura ao lado dos Estados Unidos como prioridade no segmento de produção de petróleo e gás da companhia. Neste setor a El Paso já realizou duas descobertas de gás, uma na Bahia e outra na Bacia de Santos.

Na Bacia de Santos, o campo foi batizado de Lagosta e os planos de investimento na produção de 1 milhão de metros cúbicos por dia devem ser apresentados à Agência Nacional do Petróleo (ANP) no início de 2005. Em parceria com a Petrobras, a companhia já produz 3,2 mil barris de petróleo e 1,4 milhão de metros cúbicos de gás natural em pequenos campos no Rio Grande do Norte. Ao todo, a El Paso detém interesses sobre 16 concessões de petróleo e gás no Brasil, além de ser acionista do Gasoduto Bolívia-Brasil (Gasbol) e do Gasoduto Urucu-Porto Velho, onde tem uma térmica.

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