Após dar aval a investimentos fracassados de quase R$ 500 milhões do fundo de pensão dos Correios, a empresa Baker Tilly Brasil foi posteriormente contratada pelos gestores do Postalis para auditar a mesma carteira de investimentos. O resultado dessa auditoria reforçou a decisão da Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc), órgão regulador do setor, de intervir no fundo de pensão dos funcionários dos Correios.
A Operação Pausare, da Polícia Federal e do Ministério Público Federal – deflagrada há duas semanas e que investiga operações financeiras do Postalis -, revelou que a Baker Tilly estaria envolvida em um esquema responsável por conduzir o Postalis a investimentos que resultaram em prejuízo milionário ao fundo.
O procurador Ivan Marx e o delegado Luiz Flávio Zampronha, responsáveis pela Pausare, sugeriram em relatório que fosse investigado o envolvimento da empresa no esquema de desvios no fundo por conta da sua participação “nas sucessivas avaliações utilizadas nas demonstrações financeiras do patrimônio do fundo, realizadas em auditorias independentes”.
A Baker Tilly foi contratada pelos gestores do Postalis em duas situações. Em 2010 e 2011, a empresa prestou serviços de consultoria para o fundo ao avaliar as potencialidades de dois projetos: a criação de uma bolsa eletrônica de valores, que seria concorrente da Bovespa, e o financiamento de projetos de eletricidade. A avaliação da consultoria foi positiva e, diante disso, o Postalis decidiu investir R$ 223,4 milhões dos carteiros no projeto “Nova Bolsa” e outros R$ 270 milhões em projetos de energia e bioenergia.
Quatro anos depois, em 2014, a mesma Baker Tilly foi novamente contratada pelos gestores, dessa vez para auditar os números do mesmo fundo de pensão dos Correios. A empresa produziu relatórios desde então até 2017, quando, ao analisar as contas do ano anterior, disse que não poderia constatar a veracidade de todos os dados apresentados pelo Postalis.
Avaliação
A legislação brasileira define que é vedado ao auditor prestar serviços de consultoria “que possam caracterizar a perda da sua objetividade e independência”. Entre os serviços vetados mencionados pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) estão a avaliação de empresas, reavaliação de ativos e outro serviço “que influencie ou que possa vir a influenciar as decisões tomadas pela administração da instituição auditada”.
O aparente conflito de interesse foi descartado pelo diretor de consultoria da Baker Tilly Brasil, Marco Túlio Fiorese. “Nunca fomos contratados do Postalis ao mesmo tempo para auditoria e consultoria”, disse o executivo. Os serviços de consultoria ocorreram em 2010 e 2011, disse Fiorese, enquanto o serviço de auditoria se deu somente a partir de 2014.
Um possível conflito de interesse envolvendo a Baker Tilly, porém, já havia sido apontado pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal na Operação Pausare. Ao avaliar o investimento no projeto “Nova Bolsa”, os investigadores notaram que “a referida empresa de auditoria já havia sido contratada pelos próprios responsáveis pelo empreendimento, sendo evidente o conflito de interesses e a falta de imparcialidade da Baker Tilly Brasil”.
Sem comentar o caso específico da Baker Tilly, o vice-presidente técnico do Conselho Federal de Contabilidade (CFC), Idésio Coelho, explica que a contratação de uma empresa para auditar números após ter prestado serviços de consultoria pode acontecer, desde que não seja ao mesmo tempo. Ele nota, porém, que há casos em que a empresa de auditoria pode simplesmente declinar do contrato.
Procurada, a CVM informou que, por ser um fundo de pensão, o Postalis não está sob jurisdição da entidade. “Assim, a contratação por ela de empresa de auditoria não está abrangida pelo regime da Instrução 308 e, portanto, não há que se falar em eventual violação”. Já a Previc informou que não comenta casos específicos. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.