A economia brasileira teve retração de 0,2% em 2003, primeiro ano do governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Foi o pior resultado desde 1992, ano do impeachment do presidente Fernando Collor de Mello, quando o País passava por uma crise institucional que parou a economia. Na época, o PIB (Produto Interno Bruto, soma de todas as riquezas produzidas) recuou 0,52%.
A retração foi fruto de um ano marcado por juros altos, queda na renda, diminuição do consumo e aumento nas taxas de desemprego. Segundo o responsável pela pesquisa, Roberto Olinto, esses fatores atingiram principalmente o consumo das famílias.
“O consumo é basicamente determinado pela massa salarial e pela disponibilidade de crédito. E no ano passado, houve uma redução da massa salarial e um crédito com taxas mais altas. O efeito dessas duas variáveis se refletiu na queda de consumo das famílias e na construção civil”, disse Olinto.
O desempenho da economia só não foi pior devido ao aumento das exportações, que cresceram 21,1% no ano passado e atingiram US$ 73 bilhões, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento.
Embora decepcionante, o resultado era esperado pelos economistas, que acompanharam a deterioração dos indicadores ao longo do ano. Previsões de instituições ouvidas pela Folha variavam de taxa negativa de 0,2% a crescimento de 0,3% no ano passado.
Entre os setores da economia, a agropecuária foi a que teve o melhor resultado, com incremento de 5%. Olinto obsevou que o setor foi puxado, especialmente, pelas exportações.
A indústria sofreu retração de 1% e os serviços, queda de 0,1%. Entre os subsetores, a construção foi a única que apresentou retração, de 8,6%. A indústria de transformação, a mais importante, teve incremento de 0,7% no ano passado.
Pela ótica da demanda, houve retração de 3,3% no consumo das famílias brasileiras devido à queda na renda, que recuou 12,9% ao longo do ano passado, e ao desemprego elevado. Trata-se da maior queda no consumo das famílias desde o início da série histórica, em 1992.
Já os investimentos na economia, que também acompanharam a retração, tiveram queda de 6,6%. Foi a maior queda dos investimentos desde 1999, ano da desvalorização cambial, quando recuou 7,2%.
O PIB per capita teve queda de 1,5% em 2003, o pior resultado também desde 1992, quando recuou 2%.
Lula diz que economia está crescendo
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (que estava em Caracas, na Venezuela, ontem) minimizou a queda do Produto Interno Bruto (PIB) em 2003 divulgada pelo IBGE. O desempenho da economia no primeiro ano do governo petista foi o pior desde 1992. Lula afirmou que, apesar da queda de 0,2% do PIB registrada no ano passado, a economia cresceu no último trimestre. E o presidente garantiu que o País continuará crescendo este ano.
“A economia já mostrou sinais de recuperação com crescimento de 1,5% no último trimestre. Neste primeiro trimestre de 2004 certamente vamos crescer mais”, disse o presidente, que participou da abertura oficial da 12.ª cúpula do G-15, em Caracas, na Venezuela.
O Ministério do Planejamento, por sua vez, reforçou a posição do presidente Lula e divulgou nota técnica para mostrar que, apesar da retração da economia de 0,2% no ano passado, o quarto semestre confirmou a recuperação iniciada no semestre anterior, quando o PIB registrou a primeira taxa positiva (0,1%) do ano.
Para justificar a recuperação, os técnicos recorreram aos dados do IBGE que mostram que o PIB a preços de mercado, com ajuste sazonal, cresceu 1,5%, em relação ao trimestre anterior, com os seguintes desempenhos setoriais: agropecuária 7,3%, indústria 1,2% e serviços 0,8%.
Segundo os técnicos, comparando-se componentes da demanda agregada, o investimento cresceu 4,0%, confirmando a expansão iniciada no 3.º trimestre de 2003, após queda superior a 4,5% no primeiro semestre.
O mesmo ocorreu com o consumo das famílias, que cresceu 1,6% no quarto trimestre em relação ao terceiro, e o do governo, 0,1%.
Esses indicadores, segundo o Planejamento, é que apontam para a recuperação da economia, junto com a balança comercial, que registrou exportações de bens e serviços, de 5,5%, e importações de 8,3%, com destaque para a compra de máquinas, equipamentos e insumos industriais.
Centrais cobram reação do governo
São Paulo (AE) – Foi com um misto de decepção e irritação que dirigentes das duas principais centrais sindicais do País, a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e a Força Sindical, receberam ontem as informações de que o Produto Interno Bruto (PIB) caiu 0,2% em 2003. “Decréscimo da economia, aumento do desemprego e diminuição da massa de salários são questões inaceitáveis que nenhuma central sindical poderá assinar embaixo”, disse o secretário-geral da CUT, João Felício. “A situação econômica do País é desastrosa”, afirmou o presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva, o Paulinho.
A preocupação maior das centrais é com o aumento do desemprego, que atingiu 11,7% da População Economicamente Ativa (PEA), em janeiro, ante 10,9% em dezembro. No dia 16 de abril, a central promete realizar uma mobilização nacional, em todas as capitais do País, para cobrar do governo políticas de estímulo ao emprego e aumento da renda.
Os sindicalistas da CUT e da Força não titubeiam em culpar a condução da política econômica adotada pelo governo Lula, em especial a adoção do superávit primário de 4,25% do PIB e a manutenção da Selic, como as causas pelo fraco desempenho da economia no ano passado. “Quando assumiu o governo, com expressiva maioria dos votos, o presidente Lula tinha moral para negociar com o Fundo Monetário Internacional (FMI) e acertar um superávit menor. Mas, para a nossa decepção, ele se tornou o presidente esquerdista favorito do FMI, ao adotar política econômica mais conservadora do que o pessoal da direita”, avaliou Paulinho.
Felício procurou ser mais comedido em suas críticas, mas ressaltou que as centrais sindicais, lideradas pela CUT, apresentaram um conjunto de medidas para reativação da economia ao longo do ano passado. Ele lembrou que, além de pedirem uma queda mais drástica da Selic, as centrais recomendaram ao governo, via Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), uma renegociação com o FMI para diminuição do superávit primário, expansão dos investimentos estatais em infra-estrutura e aceleração de políticas setoriais específicas para incentivar o ingresso de investimentos diretos produtivos.
Iedi já fala em “década perdida”
São Paulo – A queda do Produto Interno Bruto (PIB) em 2003 – de 0,2% no geral e de 1,5% na relação per capita – levou o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) a perguntar se a economia está, novamente, a caminho de mais uma “década perdida”, como nos anos 80. A questão surge porque a variação média do produto interno entre 2001 e 2003 foi de apenas 1% ao ano, enquanto o PIB médio per capita recuou 0,3%.
“Ainda há muito chão pela frente. Mas, para que a ameaça se dissipe, é urgente que a política econômica abra espaço para o crescimento e que o País tenha uma estratégia para o crescimento econômico”, afirmou Júlio Sérgio Gomes de Almeida, diretor-executivo do instituto.
O Iedi, no entanto, admite que a economia superou a recessão registrada nos dois primeiros trimestres do ano passado. Mas também considera que a recuperação nos dois últimos trimestres foi bastante tímida. Almeida ressalta que o desempenho industrial limitou o crescimento do PIB nos últimos meses do ano, pois registrou uma alta de apenas 1,2%, ante um crescimento de 2,6% no terceiro trimestre. A falta de dinamismo se deve ao fraco mercado interno. “Mas, destacadamente, quem está puxando o PIB setorial para baixo é a construção civil”, afirmou.
O setor, por falta de um programa de construção habitacional, de crédito e por conta de juros altos, acumula taxas trimestrais de recuo próximas de 11% desde o segundo trimestre do ano passado.