Petrobras descarta risco de desabastecimento de gás

A Petrobras descarta risco de desabastecimento de gás no Brasil em conseqüência da nacionalização das reservas bolivianas. O diretor de Gás e Energia da estatal, Ildo Sauer, argumenta que a relação da empresa com a YPFB, a estatal de petróleo da Bolívia, não foi afetada. "O contrato de transporte de gás está assegurado até 2019, com volume entre 24 milhões e 30 milhões de metros cúbicos por dia. Nada mudou", afirma o executivo.

Ele admite, porém, que a empresa brasileira "pode perder dinheiro na Bolívia" devido aos investimentos já feitos, mas isso não terá impacto no contrato de abastecimento.

"A rentabilidade da Petrobras na Bolívia será profundamente afetada", afirmou, sem quantificar os prejuízos. "Essa não é a minha área e as simulações ainda estão sendo feitas pelos técnicos." Mas lembrou que, hoje, a relação de remuneração é exatamente inversa da de um ano atrás, quando o governo boliviano recebia 18% da receita das empresas que operavam em seu território. Depois, esta proporção passou a meio a meio e, agora, o governo passa a ter direito a 82% de toda a receita. "Isso é temporário. Vai vigorar durante os seis meses de transição, enquanto os contratos estiverem sendo renegociados", minimiza Sauer.

Na verdade, não há certeza sobre o que ainda vai ocorrer na Bolívia. Para o presidente da Petrobras-Bolívia, José Fernando de Freitas, houve apenas o comunicado oficial do presidente Evo Morales. Nenhuma autoridade boliviana procurou a direção da empresa para detalhar a medida. Freitas disse que a ocupação do Exército nas unidades da Petrobras foi feita de forma discreta, sem alterar a rotina operacional nas refinarias e nos centros produtores de gás.

"Estamos operando normalmente. O único campo que está produzindo abaixo de sua capacidade é o de San Antonio, por causa do acidente ocorrido no mês passado, em razão do temporal. Este campo já produziu 13 milhões de metros cúbicos por dia e hoje está em 11 mil, mas isso nada tem a ver com a decisão política", afirmou Fraga. Segundo ele, a estatal ainda está avaliando internamente a medida boliviana.

Em Houston, onde participa da Offshore Technology Conference, principal feira anual do setor de petróleo, o diretor de exploração e produção da Petrobras, Guilherme Estrella, disse que quebras unilaterais de contrato, como a promovida pela Bolívia, são "uma violência".

O executivo disse que a instabilidade regulatória será um dos principais desafios à indústria do petróleo nos próximos anos, assim como o aumento de custos dos equipamentos e o desenvolvimento de novas tecnologias. "Quebras unilaterais de contrato não são justas. São uma violência", afirmou Estrella para uma platéia formada por executivos de todo o mundo.

Ele não citou o exemplo boliviano no discurso, no qual destacou que o respeito aos contratos assinados é decisivo para a manutenção dos investimentos da indústria do petróleo. "Não há dúvidas que nossa indústria de capital intensivo requer dos governos um marco regulatório, que mantenha um ambiente sustentável para os investimentos."

Depois da apresentação, Estrella disse que falava de forma geral e não se referia particularmente à Bolívia. Mas não escapou de perguntas sobre a situação boliviana. "Não há pânico. A lei nos dá seis meses para negociar e esperamos começar o mais rápido possível", afirmou.

Ele também disse que a empresa não trabalha com a hipótese de corte no fornecimento de gás ao Brasil. "Esperamos que eles mantenham o contrato atual", concordou o diretor de abastecimento da companhia, Paulo Roberto Costa, que informou ainda que a Petrobras tem planos de contingência para a hipótese de falta do energético, com a substituição por outros produtos, como óleo combustível.

O executivo frisou que Brasil e Bolívia têm interesses mútuos na questão do gás, o que pode facilitar as conversas. "Eles têm de produzir gás e precisam que o Brasil compre", afirmou, evitando uma análise mais detalhado do decreto de Evo Morales. "Recebemos as informações ontem e ainda estamos avaliando." Estrella substituiu o presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, que daria entrevista ontem, mas teve de antecipar sua volta ao Brasil após o acirramento da crise.

"A decisão do governo boliviano de nacionalizar as riquezas de seu subsolo e controlar sua industrialização, transporte e comercialização, é reconhecida pelo Brasil como ato inerente à sua soberania. O Brasil, como manda a sua Constituição, exerce pleno controle sobre as riquezas de seu próprio subsolo", afirma nota divulgada ontem pela Secretaria de Imprensa e Porta-Voz da Presidência da República.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente da Bolívia, Evo Morales deverão ser encontrar nos próximos dias para aprofundar questões do relacionamento entre os dois países e da segurança energética da América do Sul, de acordo com a nota.

Na nota, o governo brasileiro esclarece que o abastecimento de gás natural para o território nacional está assegurado, conforme reiterou o presidente da Bolívia, Evo Morales, em conversa telefônica, na tarde de hoje, com o presidente Lula. Ainda no telefonema feito por Lula para Morales, a Assessoria de Imprensa do Planalto informou que ficou acertado que o preço do gás será resolvido por meio de negociações bilaterais.

O governo brasileiro, de acordo com a nota, agirá com firmeza e tranqüilidade em todos os foros, no sentido de preservar os interesses da Petrobras, e levará adiante as "negociações necessárias para garantir o relacionamento equilibrado e mutuamente proveitoso para os dois países".

O gasoduto Bolívia-Brasil, de acordo com a nota da Assessoria de Imprensa do Palácio do Planalto, funciona há sete anos, como resultado de negociações empreendidas por sucessivos governos há mais de 50 anos.

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