economia

Perspectiva de trabalho formal piora no comércio

O vendedor ambulante Wilson dos Reis, de 54 anos, sente falta da época em que tinha uma vida estável e confortável, atuando como inspetor de qualidade. O salário médio de R$ 8 mil mensais foi suficiente para investir na educação dos filhos, um rapaz que está prestes a concluir a faculdade de Educação Física e uma estudante de Direito. O conforto da família naufragou poucos anos depois, com a falência da empresa, atingida pela crise econômica. A última vez que conseguiu registro em carteira foi há dois meses, mas a experiência não durou mais que 20 dias.

Hoje, ele leva duas horas para cortar a cidade até uma rua movimentada do centro do Rio, onde se esforça para garantir o sustento vendendo meias coloridas sortidas. “Está muito difícil viver sem carteira assinada. Perdi muito. Mas vamos ver se melhora com meus filhos se formando. O mais velho já trabalha numa academia, me ajuda um pouco. A mais nova agora conseguiu um estágio”, afirmou Reis.

O comércio fechou 83 mil postos de trabalho com carteira assinada no segundo trimestre deste ano. Ao mesmo tempo, 235 mil pessoas passaram a trabalhar por conta própria, segundo cálculo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) feito a pedido do Estadão/Broadcast, com base nas informações da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua). Dados da Sondagem do Comércio, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), mostram que não há perspectiva de recuperação na geração de vagas formais.

“Esse trabalhador por conta própria com certeza é gente que perdeu o emprego e vai virar ambulante, vai vender salgadinho. O cara que faz a empanada e vai vender na praia aparece na pesquisa como trabalhador do comércio”, explicou Cimar Azeredo, coordenador de Trabalho e Rendimento do IBGE.

Há poucos sinais de recuperação porque a perspectiva para o emprego futuro no comércio voltou a se deteriorar na sondagem da FGV. O saldo entre as empresas que previam contratar e demitir ficou negativo pelo segundo mês, saindo de -1,5% em junho para -1,7% em julho, conforme cálculo obtido pelo Estadão/Broadcast. O resultado significa que há mais empresas prevendo demissão do que prevendo novas contratações.

O movimento coincide com a crise política desencadeada pelo delação de Joesley Batista, um dos sócios da JBS. Até então, o saldo para o emprego previsto vinha em trajetória de melhora desde dezembro de 2016.

“A piora pelo segundo mês consecutivo tem capacidade para afetar um pouco a recuperação que estava ocorrendo, com as empresas mais cautelosas para contratar e os consumidores mais cautelosos para comprar”, avaliou Aloisio Campelo Junior, superintendente de Estatísticas Públicas do Instituto Brasileiro de Economia da FGV (Ibre/FGV).

Segundo a Sondagem do Comércio de julho, há mais empresários no varejo ampliado – que inclui veículos e material de construção – prevendo manter como está o contingente de empregados, mas 12,7% esperavam diminuir, enquanto 11,1% estimavam fazer novas contratações. “O comércio só vai melhorar se tiver melhora no mercado de trabalho”, disse o economista Fabio Bentes, da Divisão Econômica da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC).

O comércio responde por quase um quinto dos postos de trabalho do País, o equivalente a 17,412 milhões de postos entre os 90,236 milhões de empregos existentes no fim de junho, de acordo com a Pnad Contínua.

No primeiro semestre, o comércio extinguiu 125 mil postos formais, calculou Bentes, com base no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados do Ministério do Trabalho. Mas a CNC está otimista quanto à recuperação do setor até o fim do ano, o que pode render 140 mil novas vagas.

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