O governo do Paraná aguardava, até o fim da tarde de ontem, um comunicado oficial por parte do Ministério da Agricultura para tomar medidas quanto ao foco de febre aftosa, confirmado na última terça-feira pelo governo federal. O governo estadual esperava ainda uma cópia do laudo que comprova a existência do foco na Fazenda Cachoeira, em São Sebastião da Amoreira, no norte do Estado.
A fazenda onde o foco foi anunciado não estava entre as quatro onde havia 19 animais sob suspeita. Nem mesmo o município de São Sebastião da Amoreira, a quase 40 km de Londrina, fazia parte do grupo dos 36 municípios inicialmente considerados de risco sanitário. O proprietário da fazenda, André Carioba Filho, não foi localizado pela reportagem. A Fazenda Cachoeira conta com 2.212 cabeças de gado, dos quais cerca de 200 teriam vindo de Eldorado (MS), onde há focos da doença.
Ontem, o vice-governador e secretário estadual da Agricultura e Abastecimento, Orlando Pessuti, voltou a afirmar que não existe aftosa no Paraná. O cenário, segundo ele, continuaria o mesmo em relação ao dia 21 de outubro, quando houve o alerta de suspeita, com sintomas, sorologia (exame de sangue) positiva em alguns animais e vínculo de origem. ?Mandamos quase mil amostras neste período e até hoje não houve comprovação de febre aftosa. Se lá atrás era suspeita, porque hoje é foco??, questionou Pessuti. Ele não descartou também a possibilidade de o governo estadual recorrer administrativa e judicialmente contra o governo federal.
Pessuti afirmou que a decretação de um foco de febre aftosa no Paraná não possui nenhuma conotação política. Para ele, a posição do Ministério da Agricultura não seria uma retaliação ao Estado, pois seria uma ?retaliação ao Brasil, porque prejudica o País inteiro?. O vice-governador acredita que o ministério anunciou um foco de aftosa no Estado por estar sofrendo pressões da comunidade européia e de outros setores internos interessados em uma definição. Hoje acontece uma reunião na Europa com os compradores e importadores, na qual se poderá definir o embargo total à carne brasileira. ?Isto deve ter apressado a decisão. Queremos e vamos exigir que novos exames sejam feitos?, afirmou.
A Seab quer a realização do exame de identificação de vírus, chamado Probang, para confirmar a existência da doença. Sem este teste, não seria possível confirmar que a aftosa está presente no gado, segundo o órgão. Somente o exame com o soro do sangue não é suficiente porque poderia sinalizar anticorpos compostos pela vacina contra a doença ou outra infecção anterior, indicando outras doenças vesiculares.
Ministério da Agricultura
O foco de febre aftosa foi confirmado no Paraná pela conjunção de dois fatores: o exame de sangue (sorologia positiva) em alguns animais e o vínculo de origem, pois o gado onde foi encontrada a doença era proveniente das regiões onde existem focos no Mato Grosso do Sul, comprado em uma feira realizada em Londrina. Segundo Valmir Kowaleski, delegado do Ministério da Agricultura no Paraná, estes dois fatos, mais a observação clínica dos animais, podem determinar a existência de um foco aftosa. ?Qualquer destes fatores faz sentido para a determinação?, enfatizou.
Kowaleski afirmou que o setor técnico da Seab deve definir agora os procedimentos a serem seguidos, como o sacrifício de animais e a interdição de propriedades em raio de 10 km da fazenda onde a doença foi detectada. ?O Ministério da Agricultura teve embasamento técnico para tomar sua decisão. O ministério tem que seguir uma linha investigativa e esgotar as possibilidades. São 45 dias de angústia. Gostaríamos de ter dado outra notícia?, declarou. Ele disse que o Ministério da Agricultura contou ainda com a ajuda de consultores internacionais para tomar esta decisão. ?Não é uma decisão política?, garantiu.
Exportação de carne em novembro caiu 7,6%
Brasília (AE) – A crise da febre aftosa provocou, em novembro, uma queda de 7,6% nas receitas obtidas pelo Brasil com exportação de carne bovina fresca. É o que mostra balanço divulgado ontem pelo Ministério da Agricultura. Ainda assim, as exportações do agronegócio bateram um novo recorde, ao somar US$ 3,723 bilhões. É o maior volume já registrado em um mês de novembro desde o início da série, em 1989. De janeiro a novembro as exportações também bateram recorde no período: US$ 39,936 bilhões.
As exportações de carne bovina foram, em novembro, de US$ 170 milhões neste ano, contra US$ 184 milhões em novembro de 2004. Chile, Irã e África do Sul não compraram sequer um quilo do produto. Esses países haviam gastado, respectivamente, US$ 14,3 milhões, US$ 11,5 milhões e US$ 2 milhões com essas compras em novembro do ano passado.
Desses três países, só o Irã não impôs embargo à carne brasileira por causa da aftosa. No total, 52 países restringiram de forma parcial ou integral, as compras do produto. Chile e África do Sul suspenderam em outubro as importações de carne bovina de todo o País. A África do Sul também proibiu as compras de animais vivos suscetíveis à doença. No caso da Argélia, que suspendeu as compras de todo o País no dia 11 de novembro, a receita cambial obtida com as exportações de carnes caiu 98,7% no mês passado.
Por outro lado, o ministério lembrou que houve forte crescimento no faturamento obtido com as exportações de carne bovina ?in natura? para a Rússia, o que compensou parcialmente a perda ocorrida em outros mercados. Os embarques de carne fresca para Moscou renderam US$ 32,4 milhões em novembro de 2004 para US$ 56 3 milhões no mesmo mês deste ano, aumento de 73,7%. O governo também destacou o lucro de US$ 9,6 milhões e de US$ 2,9 milhões com o comércio para Ucrânia e Romênia, países para os quais o Brasil não exportou carne ?in natura? no ano passado.
Nos dados gerais, a balança comercial do agronegócio teve um saldo positivo de US$ 3,261 bilhões no mês passado (outro recorde), contra US$ 2,548 bilhões em novembro de 2004. Os gastos com importações cresceram 6,4% para US$ 462 milhões no acumulado do ano, enquanto as exportações de US$ 3,723 bilhões representaram uma elevação de 24,8% sobre o mesmo mês em 2004.
No ano, as exportações de US$ 39,936 bilhões representam um aumento de 10,8% sobre igual período de 2004. Os embarques de produtos agrícolas superam em US$ 900 milhões o resultado de todo o ano passado. Os gastos com importações totalizaram US$ 4,652 bilhões no ano, alta de 4,3%. O superávit comercial no período acumulado somou US$ 35,284 bilhões, contra US$ 31,578 bilhões entre janeiro e novembro de 2004.
Entidades consideram que abater já é a melhor solução
Para o presidente do Sindicato da Indústria de Carnes e Derivados no Estado do Paraná (Sindicarne-PR), Péricles Salazar, a decisão de sacrificar os animais da propriedade atingida deverá ser compartilhada. Ele explicou que se o gado for abatido agora, o Estado ficará seis meses sem poder exportar. Caso isso não aconteça, o prazo pode subir para um ano e meio. ?Nossa opinião é abater já. Não tem mais jeito do Estado continuar brigando. Prazos vão se seguindo e a retomada das exportações podem demorar mais. Nós queremos que essa novela acabe de vez?, pediu. Salazar afirmou que o Estado de São Paulo, maior comprador de carnes do Paraná, não tem o porquê de voltar atrás em sua decisão de relaxar o embargo à carne paranaense.
Para o assessor da Federação da Agricultura do Estado do Paraná (Faep), Carlos Augusto Albuquerque, o melhor que o governo federal e o estadual podem fazer é ?acabar de vez com esta pendenga.? ?Eles têm que sentar e resolver o problema de forma correta. Este bate-boca de comadres têm que acabar?, criticou. Segundo Albuquerque, desde que o Paraná anunciou a suspeita de aftosa, ?a coisa já está feita.? ?A partir daquele momento, a OIE (Organização Mundial de Saúde Animal) já considerou que o Estado não é mais livre da aftosa?, comentou. Para Albuquerque, mesmo que o Ministério da Agricultura voltasse atrás e dissesse que não há aftosa no Paraná, para a OIE não mudaria em nada. ?A simples suspeita já é o suficiente para considerar a existência do foco.?
O deputado federal Abelardo Lupion (PFL-PR) apresentou ontem proposta de fiscalização e controle propondo que a Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Câmara Federal averigúe o surgimento de febre aftosa no Paraná. ?Há muita informação desencontrada, levantaremos se houve precipitação. Nossa comissão será pontual e especificamente técnica. Se necessário vamos instaurar uma CPI?, destacou Lupion. (JC e LS)
