O governo anunciou ontem um pacote de R$ 75,55 bilhões em novas medidas para o setor agrícola, na expectativa de aplacar a "pior crise já vivida pelo setor", segundo definiu o ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues. Com isso, a expectativa é acalmar os ânimos dos agricultores e refrear as manifestações contra o governo neste ano eleitoral.
As medidas vão de corte nos juros a renegociação de dívidas que já tinham sido objeto de rolagens anteriores, passando por recursos para investimento a juros mais baixos e aperfeiçoamentos no sistema de seguros.
O fechamento do pacote envolveu negociações tensas, com rumores que Rodrigues estaria disposto a deixar o cargo. Houve reuniões até uma hora antes de as medidas serem anunciadas. "O pacote melhorou muito das duas horas para cá", disse o vice-presidente de agronegócios do Banco do Brasil, Ricardo Conceição. O resultado foi um ministro sorridente.
"Eu estou aqui, firme", disse Rodrigues, quando questionado sobre os boatos de demissão. Ele negou divergências em torno do pacote e afirmou que as discussões ocorreram de forma "harmoniosíssima." Brincando, Rodrigues disse que só ficaria totalmente satisfeito com o pacote se o dólar estivesse a R$ 5,00. "Aí, eu fiquei preocupado", comentou o ministro da Fazenda, Guido Mantega, que estava a seu lado.
O pacote foi composto por três conjuntos de medida. O primeiro e mais volumoso é o financiamento da próxima safra, que será de R$ 60 bilhões (dos quais R$ 10 bilhões são para a agricultura familiar e R$ 50 bilhões para a agricultura comercial). O segundo conjunto envolve medidas emergenciais, como a rolagem de dívidas que vencem este ano.
O terceiro são medidas estruturantes para o setor, como um seguro para cobrir perdas decorrentes de catástrofes, como as secas, e um fundo para estimular os agricultores a poupar em tempos de vacas gordas.
Preocupado com a estimativa que o plantio da próxima safra ficaria 30% menor do que a atual, o governo correu para dar mais garantias ao produtor e tentar reverter esse quadro. Os R$ 60 bilhões anunciados hoje são um valor 12,5% maior do que o da atual safra e serão emprestados a juros menores. Do total para custeio e comercialização R$ 30,1 bilhões serão emprestados a taxas fixas de 8,75% ao ano.
Outro sinal importante para o produtor é o fato de o governo haver reservado R$ 2,8 bilhões para comercializar a próxima safra. Esse dinheiro será usado para garantir um retorno mínimo ao agricultor e evitar que ele abandone a atividade. As safras anteriores foram plantadas sem que tivesse garantido o dinheiro para a sua comercialização.
O governo também concordou em adiar a cobrança de parte das dívidas que venciam este ano. Os agricultores terão um prazo de quatro anos para pagar os débitos de custeio. O alongamento é automático para um pedaço da dívida, que varia conforme o produto e a região. Mantega estima que serão rolados no máximo R$ 10 bilhões em dívidas.
As medidas emergenciais contemplaram até a rolagem de dívidas que já haviam sido objeto de renegociação anteriormente. São R$ 600 milhões, que deveriam ser pagos em 2005 e 2006. Essa medida, porém, atingirá os 72 mil agricultores que pagaram suas dívidas até 31 de dezembro de 2004 Nesse ponto, o governo não cedeu às pressões da bancada ruralista, que queria refinanciar a totalidade desses débitos.
Seguro
Para evitar novas crises como a atual, foram formuladas algumas medidas no sentido de aperfeiçoar os mecanismos de seguro da renda agrícola. O governo vai mandar ao Congresso um projeto de lei criando um "Fundo de Catástrofes", que vai garantir a renda do campo em caso de secas rigorosas. Para estimular as seguradoras a entrar nesse segmento, o Tesouro alocará R$ 150 milhões a esse fundo.
Os agricultores também serão estimulados a poupar em tempos de "vacas gordas". Será criado um fundo semelhante aos fundos de previdência privada. O agricultor aplica seus recursos e, em caso de ocorrer uma quebra de safra, ele poderá sacar o dinheiro sem pagar Imposto de Renda.
"Se o produtor quiser tirar dinheiro para comprar caminhonete, não pode. Vai ter de pagar imposto", explicou o secretário de Política Agrícola, Ivan Wedekin.
