Foto: Arquivo/Agência Brasil
Ministro Roberto Rodrigues: chegamos ao fundo do poço.

O governo federal lançou ontem um conjunto de medidas emergenciais de apoio aos produtores rurais, entre elas a liberação de R$ 1,2 bilhão para comercialização da safra agrícola – através da Política de Garantia de Preço Mínimo e do Programa de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar – e a prorrogação de R$ 7,7 bilhões das dívidas de custeio e investimento a vencer este ano. O prazo de prorrogação será de doze meses a partir do vencimento do último contrato. Também serão disponibilizados R$ 5,7 bilhões em crédito rural de comercialização para aplicação até 30 de junho de 2006.

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?Estas medidas são conjunturais, uma vez que chegamos ao fundo do poço. Continuaremos estudando medidas estruturais como a redução de tributos e o aperfeiçoamento do seguro rural para evitarmos que isso se repita nos próximos anos?, afirmou o ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues. As medidas, segundo o ministro, vão beneficiar tanto o agronegócio quanto a agricultura familiar.

O socorro aos agricultores ocorre pelo segundo ano consecutivo. No ano passado, o governo chegou a prorrogar as dívidas de custeio de agricultores que foram afetados pela seca que atingiu diversos estados do País, entre eles o Paraná. De forma geral, as medidas beneficiam os produtores de arroz, milho, soja, trigo e algodão. ?Havia um horizonte de inadimplência muito grande e essas medidas têm o objetivo de amenizar esse quadro?, explicou Rodrigues.

Para este ano, já estavam previstos no orçamento do governo federal R$ 650 milhões para a sustentação de preços através da Política de Garantia de Preço Mínimo (PGPM). Mas o governo liberou mais R$ 1 bilhão, sendo R$ 500 milhões em abril e R$ 500 milhões em maio. Além disso, serão liberados por medida provisória R$ 238 milhões do Programa de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar.

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?Acreditamos que esse conjunto de medidas deverá dar um bom amparo para os preços baixos que a agricultura vem enfrentando?, afirmou o secretário nacional da agricultura familiar, Valter Bianchini. Ele não soube informar a quantia de recursos que deverá vir para o Paraná.

Sobre a prorrogação das dívidas em até 12 meses, Bianchini acredita que grande parte dos produtores paranaenses fará a solicitação junto aos bancos. ?A maioria deve pleitear, principalmente os agricultores da região Sudoeste e parte do Oeste, onde a seca afetou com mais intensidade?, afirmou. Segundo ele, para conseguir a prorrogação da dívida basta que o agricultor mostre que teve prejuízos com a frustração da safra e a queda dos preços agrícolas.

Solução tímida

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O assessor da Federação da Agricultura no Estado do Paraná (Faep), Carlos Albuquerque, definiu o pacote de medidas anunciado ontem pelo governo federal como uma solução ?paliativa e tímida?. ?O governo não percebeu que o problema na agricultura é muito maior e que este ?pacotinho? não é capaz de resolver. Foi um presente de grego?, criticou Albuquerque.

Ele lembrou que os produtores rurais do Paraná estão amargando prejuízos desde o segundo semestre de 2004. ?Prorrogar o pagamento da dívida por 12 meses não resolve nada, só joga o problema para o ano que vem?, afirmou. ?São quatro acúmulos seguidos de dívidas, não só com bancos, mas também com fornecedores.? Para ele, a solução seria o alongamento da dívida para o longo prazo – de 15 a 20 anos. ?Só assim é possível diluir os prejuízos?, apontou.

O assessor da Faep defende ainda uma nova política cambial. ?Os preços internacionais (commodities agrícolas) não estão tão ruins. Mas com o câmbio a R$ 2,13 não há preço que resista?, disse. Para ele, o governo federal deveria atuar na questão cambial. ?O problema cambial foi o próprio governo quem criou.?

Na próxima segunda-feira, representantes dos sindicatos rurais estarão reunidos em Curitiba, na Faep, para discutir as medidas anunciadas pelo governo federal para a agricultura.

Produtores de novo nas ruas

Cerca de oito mil agricultores familiares saíram às ruas de Coronel Vivida, Chopinzinho, Francisco Beltrão, Santo Antônio do Sudoeste, Capanema, Dois Vizinhos e Salto do Lontra, interior do Paraná, ontem, para, em frente às agências do Banco do Brasil, reivindicarem a liberação dos recursos do programa Proagro Mais, a garantia da Bolsa Estiagem e a prorrogação das dívidas, entre outras ações por parte do governo federal.

?Queremos ainda cobrar das lideranças políticas que pressionem os deputados federais para votarem o Orçamento da União, possibilitando a liberação de recursos para os estados e municípios e agilizando os programas federais?, explicou um dos diretores da Fetraf-Sul, Luís Pirin.

Sobre o ?pacote? de medidas anunciado ontem pelo governo, para apoio à agropecuária, incluindo a agricultura familiar, o dirigente disse que ?são medidas que, se aplicadas imediatamente, podem desafogar a situação de muitos produtores. Mas ainda não está muito bem especificado quanto desses recursos vai para a agricultura familiar?, concluiu Pirin. (Roger Pereira)

Mudanças na política agrícola

Brasília (AE) – O secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, defendeu ontem uma mudança no sistema de política agrícola do País para evitar as constantes renegociações de dívidas do setor. Appy descartou outras medidas de emergência, além das que foram incluídas no pacote de socorro ao agronegócio anunciado pelo governo. ?Entendemos que o que foi anunciado aqui é suficiente para resolver a crise conjuntural do setor?, afirmou.

Segundo ele, a pedido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o Ministério da Fazenda está estudando um conjunto de medidas estruturais para evitar que novas crises, como a atual, aconteçam no futuro. Segundo ele, o modelo brasileiro hoje é falho porque acaba transformando problemas cíclicos do processo agrícola, como os climáticos, em problemas de financiamento e renegociação de dívidas dos produtores.

?É uma falha do desenho do nosso sistema de política agríCola que precisa ser corrigida?, disse o secretário.

O foco dessas medidas estruturais, disse ele, é a redução de custos para o produtor, como a melhoria da logística e do seguro rural. ?Quando houver um problema de quebra de safra, o seguro rural tem que ser um instrumento que consiga resolver o problema sem que tenhamos que falar em renegociação de dívidas e coisas assim?, afirmou Appy.

O secretário ressaltou que é preciso atacar o problema dos ciclos de renda da agricultura, de baixa e alta. ?Esse é um problema estrutural. Se conseguirmos economizar recursos nos melhores momentos e utilizá-los na fase de baixo ciclo, certamente haverá uma trajetória de renda e estabilidade do setor mais previsível?, disse.

Medidas positivas, mas insuficientes

Brasília (ABr) – O presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Antônio Ernesto de Salvo, avalia como positivo, embora insuficiente, o conjunto de medidas apresentadas ontem pelo governo federal para apoiar o setor do agronegócio e a agricultura familiar.

Salvo considera ?modesta? a quantia de R$ 1,2 bilhão disponibilizada pelo governo para um negócio que rende R$ 35 bilhões de superávit na balança comercial e R$ 200 bilhões em Produto Interno Bruto (PIB). ?É um curativo pequeno para um gigante econômico?, disse, acrescentando que é preciso esclarecer como as medidas serão operacionalizadas.

O anúncio do pacote, que além dos recursos inclui a prorrogação de dívidas agrícolas, foi feito pelo ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues. Segundo ele, as ações atendem a questões imediatas e devem ser completadas por medidas estruturais que estão sob análise do governo.

Também a Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar avalia que as medidas do pacote anunciado ontem são insuficientes para resolver a crise de renda vivida pela agricultura familiar. De acordo com Altemir Tortelli, coordenador geral da Fetraf-Sul/CUT e coordenador-adjunto da Fetraf-Brasil, o governo reconhece que há uma crise, mas as medidas não contemplam a realidade atual da agricultura familiar, que vem sofrendo com o endividamento e descapitalização, principalmente em regiões assoladas pela estiagem, nos últimos anos.