A OMC (Organização Mundial do Comércio) decidiu ontem que os subsídios concedidos pelo governo dos Estados Unidos aos exportadores de algodão são ilegais, o que confirmou uma vitória do Brasil na organização anunciada no ano passado. A decisão é final e os EUA passam a estar sujeitos a sanções caso não cumpram a determinação da OMC.
O recurso apresentado pelos EUA foi analisado ontem por três dos sete juízes do Órgão de Apelação da OMC, escolhidos por sorteio – entre eles, o brasileiro Luiz Olavo Baptista. Segundo as conclusões do trio de juízes, os subsídios são proibidos porque ?conferem um ?benefício?? aos produtores norte-americanos em relação aos demais agricultores.
No ano passado, quando o Brasil obteve sua primeira vitória, o Itamaraty considerou a decisão um precedente para pudessem ser contestados subsídios agrícolas oferecidos também por outros países e para outros produtos.
Para o Ministério das Relações Exteriores, a vitória na OMC ?mapeava? o caminho que os países em desenvolvimento devem tomar para contestar os subsídios agrícolas das nações ricas.
O Brasil acusou os Estados Unidos de causar ?grave prejuízo? ao comércio internacional com os subsídios ao algodão. O País conseguiu provar no painel que os preços mundiais do produto estariam 12,6% mais baixos devido aos recursos que o governo norte-americano emprega na cultura.
Os Estados Unidos, segundo o ministério, empregaram US$ 12,5 bilhões em subsídios para o algodão entre 1999 e 2003. Os produtores obtiveram com a venda do produto US$ 13,4 bilhões. Ou seja, o produtor ganhou praticamente US$ 1 para cada dólar produzido. O Brasil teve, em perda de oportunidade e da depreciação do valor do algodão, perda de US$ 480 milhões no período, diz o governo.
Apelação
Em sua apelação, os EUA haviam argumentado que o painel da OMC estava errado em rejeitar o argumento de que os pagamentos de subsídios estavam fora do escopo do órgão porque as medidas contestadas pelo Brasil como subsídios ?expiraram antes das consultas requisitadas?.
Os juízes concluíram que o Brasil forneceu uma argumentação comprovada a respeito da concessão de subsídios dos EUA à produção de algodão em sua contestação, dizendo que isso causa ?efeitos adversos? e ?sérios prejuízos? ao País.
Os EUA também alegaram na apelação que apenas a metodologia do cálculo das diferenças de preço poderiam ser usadas para avaliar o valor dos créditos aos produtores de algodão, o que foi deferido pelos juízes que analisaram o caso.
?Existe um elo causal entre os subsídios e a queda dos preços?, segundo a conclusão dos juízes, ?e esse elo não é atenuado por outros fatores apresentados pelos EUA.?
Outra alegação americana derrubada pela OMC foi a de que seria necessário quantificar com exatidão os benefícios concedidos aos produtores de algodão americanos. O órgão julgou tal exigência desnecessária.
Decisão terá desdobramentos positivos
A decisão da Organização Mundial do Comércio (OMC) no contencioso entre Brasil e Estados Unidos sobre o algodão foi uma ?vitória esmagadora?, disse ontem o presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa), Jorge Maeda. ?Devemos nos sentir orgulhosos, porque foi uma vitória para o Brasil, uma vitória com letras maiúsculas.? De acordo com o diretor-executivo da entidade, Hélio Tollini, a decisão foi favorável ao País em todas as suas reclamações.
Ele acha que a decisão terá desdobramentos importantes para a economia brasileira. ?Todo o agronegócio vai se beneficiar dessa decisão?, afirmou. ?É um marco histórico, porque pela primeira vez se questiona o âmago da política dos Estados Unidos.?
Segundo Tollini, em 50 anos de negociações internacionais, nunca se havia discutido as regras para a agricultura. Na sua avaliação, a decisão da OMC terá será um ?enorme apoio político? às teses defendidas pelo ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, nas negociações internacionais. ?Com essa decisão, passam a olhar o Brasil com mais atenção, vêem que esse é um país que não é bobo.? Não é de se esperar que os Estados Unidos apliquem pacificamente a decisão da OMC, advertiu Tollini. Se eles não cumprirem a decisão, o Brasil terá direito a retaliações comerciais. ?Mas essa é outra discussão?, disse. Na sua avaliação, o mais importante foi a vitória da tese que os EUA aplicam subsídios contrários às regras internacionais de comércio.
De acordo com estimativas da Abrapa, o fim dos subsídios americanos provocará um aumento aproximado de 13% no preço internacional do algodão e uma redução da ordem de 16% na participação americana no mercado. Não se sabe, porém, quanto desse espaço poderá ser ocupado pelo Brasil.
Segundo Maeda, as exportações brasileiras de algodão não mostrarão de imediato os reflexos da decisão. ?Nós sempre tivemos bastante pé no chão para saber que isso não dá efeitos imediatos?, afirmou. ?O importante é que essa decisão mostra que o Brasil é viável e será um dos maiores produtores de algodão do mundo.? O incremento nas exportações, acredita Maeda, ocorrerá ao longo do tempo. ?O que está sendo definido é uma tendência?, disse.