Ex-diretor do Banco Central, o economista Alexandre Schwartsman afirma que o novo patamar de juros no Brasil – bem mais baixo que o usual – está aí para ficar. Segundo ele, é até possível voltar à casa dos 6,5% ou 7% em alguns anos, mas dificilmente o País retornará aos 14% vistos no passado. Por isso, os investidores precisam se preparar para uma mudança. “O fato é que o momento é outro, o ciclo do prefixado já chegou ao fim, não tem muito mais o que ganhar com isso”, diz. A seguir, os principais trechos da entrevista:
Com a Selic a 4,25% ao ano, o juro real no Brasil (quando se desconta a inflação) é de 0,91%. Quais as implicações desse patamar inédito de juros para o País?
Há um estímulo do ponto de vista do consumo. As vendas no varejo reagem ao juro mais baixo. Como o rendimento está baixo, e após o imposto muitos dos investimentos já trazem retorno real negativo, para alguns não faz mais sentido, do ponto de vista matemático, poupar agora para comprar alguma coisa lá na frente. Se a pessoa for poupar, o poder de compra dela lá na frente pode ser menor do que se ela fosse gastar hoje. Então, há um estímulo adicional para gastar hoje o dinheiro. Do lado dos investimentos, com os juros mais baixos, uma série de investimentos cujo retorno não ganharia de uma aplicação financeira de renda fixa começa a ganhar, a chamar atenção. E o que a gente imagina, do ponto de vista da retomada da economia para 2020, vem precisamente desses canais: aumento de consumo e investimento maior de empresas e das pessoas na economia real.
O que deve acontecer com os juros este ano?
Espero um pouco mais de queda de juros neste começo do ano. Em um ritmo mais lento do que presenciamos em 2019, provavelmente mais uma queda de 0,25 ponto porcentual. Mas, após isso, acho que a Selic estabiliza nesse patamar mais baixo por um período longo.
Quando o BC deve voltar a subir os juros? E por quê?
Acho que já chegamos ou estamos chegando ao final do ciclo de corte de juros. Trabalho com a possibilidade de juros a 4% em todo o ano de 2020. Mas para responder à pergunta, gosto de fazer uma analogia quando estou falando de juros. Imagine que o BC é responsável pela condução de um carro, que é o Brasil. O BC tenta hoje fazer com que esse carro ande a 80 quilômetros por hora, mas hoje esse carro está em uma subida. A subida é a dificuldade de fazer a economia deslanchar. Ele está com o pé fundo no acelerador para tentar alcançar a meta. Acabando a subida, ele vai retirar o pé do acelerador e talvez até frear um pouco. Isso deve acontecer em algum momento de 2021 ou 2022.
Quais os riscos para a economia brasileira e que podem ter impacto nesse cenário de juros?
Uma pisada na bola feia na questão das reformas seria algo perigoso. Não mandar a reforma administrativa (para o Congresso) ou mandar e ser reprovada pelos deputados e senadores. Ter algum problema sério nas emendas constitucionais que foram encaminhadas para o Congresso – reformas emergenciais, pacto federativo e fundos. Nosso maior risco é uma escorregada do lado da reforma fiscal. O governo não ter condições de levar adiante o atual programa de ajustes nas finanças públicas, isso pode trazer impactos muito negativos para a taxa de juros.
Com juros reais abaixo de 1% ao ano, os gestores e especialistas em finanças redobram as recomendações para que investidores ampliem o portfólio com títulos de longo prazo e produtos mais sofisticados que os de renda fixa. Os profissionais brasileiros estão preparados para esse novo nível de sofisticação do mercado?
Eu acho que tem gente mudando e se preparando para esse novo momento. O fato é que o momento é outro, o ciclo do prefixado já chegou ao fim no Brasil, não tem muito mais o que ganhar com isso. Já está acontecendo o movimento de os fundos multimercado irem mais para a Bolsa. Precisa só ver qual vai ser o apetite do investidor. O brasileiro nunca foi muito fã de Bolsa. Mas a verdade é que, do ponto de vista de investimento, os desafios da renda fixa ficaram bastante caros.
Como investidor, esse movimento de queda de juros foi positivo para o seu portfólio?
Eu sou um investidor conservador, um cara de renda fixa. Mas sei que isso acabou. Eu sou um discípulo do Warren Buffett (megainvestidor americano) nesse ponto: não vou investir em nada que eu não entenda. Preciso estudar primeiro e o momento é de conhecer um mundo novo.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.