Escolhido para comandar a Secretaria de Indústria Comércio e Inovação do futuro Ministério da Economia do governo Jair Bolsonaro, o economista Caio Megale avisa logo que vai retirar as “muletas” que foram criadas para compensar problemas de competitividade nos governos anteriores e não deram resultados. “Não me parece que depois de 30, 40 ou 50 anos de programas específicos, subsídios, estamos numa situação em que os industriais estão felizes com o ambiente de negócios”, diz ele, que garante que a relação com a indústria será próxima.
Megale veio do mercado financeiro. Já trabalhou no banco Itaú e, agora, deixou a secretaria de Fazenda da cidade de São Paulo para assumir a nova secretaria. Leia os principais trechos da entrevista:
Qual será o papel da sua secretaria?
Ela equivale mais ou menos ao atual MDIC (ministério que deve ser extinto e incorporado ao novo Ministério da Economia), sem a parte de comércio exterior, que está indo para a secretaria especial do Marcos Troyjo. O meu principal papel é diagnosticar problemas no setor produtivo da economia e propor soluções, políticas.
É um setor que teve certo estresse com o futuro ministro Paulo Guedes no início da transição, não?
É um setor que há muito tempo verbaliza dificuldades. Aí não é só indústria não, falo de indústria, comércio e serviços. São muitas dificuldades burocráticas, políticas que têm problemas. São empecilhos, areias na engrenagem da produtividade e competitividade das empresas mesmo. E a solução mais simples para um sujeito que está com problema na perna, em vez de operar a perna dele, é dar uma muleta para ele. Acho que o Brasil criou muitas muletas, muitas formas de não resolver o problema. Essa que vai ser nossa linha de atuação, olhar para os problemas não para analisar os problemas deste setor (específico). A maioria dos grandes problemas da produtividade no Brasil é horizontal a todos os setores.
Mas e como mudar a visão que os próprios setores têm de querer medidas que os beneficiem?
Acho que a primeira medida aqui na secretaria é ouvir. Quero estar o mais próximo possível de todos os setores da indústria, do comércio, dos serviços, em todo o País, para que a gente consiga fazer um bom diagnóstico do problema. Claro que vamos olhar para os problemas específicos também, mas podemos ter essas duas dimensões. Vamos ter políticas que resolvam a competitividade do Brasil de forma geral e análise de casos específicos quando realmente fizer sentido. Mas sempre que não seja uma muleta. Você precisa solucionar de fato o problema.
De que forma?
Para identificar a raiz do problema precisa conversar. Quero ouvir as empresas, com os setores. É interessante ir até lá, quero fazer uma gestão descentralizada. Um pouco na linha de “menos Brasília e mais Brasil”. Temos que conhecer o problema.
A indústria se sentiu ameaçada com declarações de Paulo Guedes sobre revisão de subsídios e renúncias. Como vai ser essa relação com a indústria?
Vai ser muito próxima. Se a gente voltar 30 anos e avaliar a relação dos governos com o setor industrial, benefícios pontuais que foram concedidos, aliviaram alguns setores, mas não me parece que depois de 30, 40 ou 50 anos de programas específicos, subsídios, estamos numa situação em que os industriais estão felizes com o ambiente de negócios. Os indicadores não mostram isso. Os setores também não revelam ‘sempre estivemos muito bem e agora estamos ameaçados’. Acho que não é essa a sensação. O que nós estamos propondo aqui é uma estratégia de solucionar problemas de forma horizontal.
Vocês vão rever programas já existentes?
É fundamental desenvolver indicadores que mostrem a efetividade dos programas. Sinto muita falta de avaliação dos programas, se eles efetivamente dão certo, resolvem o problema. Diminuiu as dificuldades ou só criou uma condição favorável para um ou outro setor? Qual é o custo desse sistema, o resultado do programa. Se tivermos um bom painel indicando custos e a efetividade desses programas, poderemos fazer uma avaliação melhor sobre eles. Eventualmente, para aqueles programas que se mostrem custosos demais e com pouca efetividade, nós podemos propor ajustes. Essa é uma meta importante, a avaliação dos programas.
Qual vai ser sua relação com a indústria automobilística, que tem lobby muito forte e mostrou preocupação em relação ao governo Bolsonaro?
É uma indústria importante, relevante para a economia brasileira e que está inserido nesse contexto de dificuldade produtiva que o País tem. Se conseguirmos avançar na agenda de simplificação tributária, redução de obrigações acessórias, melhoria de infraestrutura e transporte, melhoria do ambiente de negócios e do lado fiscal, acho que eles vão ficar contentes. Assim como todo mundo. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.