A região de Lagoa da Confusão, município a cerca de 200 quilômetros de Palmas, fez jus a seu nome. Depois de três anos de forte estiagem, o estresse hídrico virou estresse social e moradores e produtores agrícolas se desentenderam.

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Numa área de várzea e muito quente, arroz e sementes de soja, que começaram a ser cultivados em larga escala na última década, demandam o uso intensivo de água, retirada de rios de médio porte. O Ministério Público e a sociedade civil questionaram produtores judicialmente. Apesar de o problema não ter sido totalmente resolvido, os agricultores passaram a contar com uma técnica inovadora: um arroz irrigado que produz mais, com menos água.

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Uma das mais jovens fronteiras agrícolas do País, Tocantins viu sua área cultivada passar de 650 mil para 1,2 milhão de hectares, desde o início da década, segundo a Secretaria do Desenvolvimento da Agricultura e Pecuária (Seagro-TO). Nesse processo de expansão, ao se depararem com a gigantesca região alagadiça próxima à Ilha do Bananal, gaúchos que migraram para as cidades próximas passaram a usar a mesma técnica que praticavam no Rio Grande do Sul para o cultivo do arroz, sob lâminas d’água. “Só que são tipos diferentes de várzea”, diz André Borja Reis, pesquisador da Esalq/USP e autor do estudo. “No Tocantins, a terra é mais porosa e é preciso muito mais água para manter a lâmina, num terreno que tem alta condutividade hidráulica.”

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Ao contrário do Sul, a área a ser alagada não é totalmente plana. As irregularidades dos campos permitiram aos especialistas perceber que, nos lugares onde o arroz não crescia parcialmente submerso, ele vinha mais forte. As hastes não ficavam tão finas nem se deitavam com ventanias, dificultando a colheita. Foi então que Reis, que se mudara para Tocantins em 2008 e diz ter se sentido incomodado com o uso da água, tentou criar alternativas mais sustentáveis para seu manejo. Há quatro anos, começou os testes que provaram que o arroz sem a inundação produz 15% mais, consumindo metade dos recursos hídricos.

Mais sacas

Todas as 500 mil sacas de arroz esperadas para essa safra na Fazenda Dois Rios, propriedade de 30 mil hectares a cerca de 30 quilômetros da cidade, serão produzidas com a nova técnica. Josnei Spinardi Rosa, gerente operacional da Dois Rios, explica a diferença entre os métodos. Ele mostra canais cavados ao lado das parcelas, nome dado a campos retangulares de 200 metros por 1.000 metros onde ocorre o cultivo.

“Antes, enchíamos os canais até transbordar, para criar a lâmina d’água”, afirma Rosa. “Hoje, não há esse transbordo: colocamos água apenas no canal e, por capilaridade, todo o terreno é umidificado, em quantidade de água ideal para o arroz.” Segundo ele, a produção saiu de 120 sacos de 60 quilos por hectare para 140 sacos, no novo método. Detalhe: não se trata de arroz de sequeiro, o mais comum do Tocantins, cuja produção média é de 70 sacos por hectare.

Apesar da maior sustentabilidade econômica e ambiental, metade dos produtores da região ainda não adotou a nova técnica. “Há agricultores muito apegados aos métodos tradicionais de produção”, afirma Solano Colodel, da Ímpar Consultoria no Agronegócio, na qual Reis trabalhava quando realizou a pesquisa. Segundo Rosa, eles olham os campos cultivados da Dois Rios e não acreditam que o arroz vá vingar. “Esse crescimento nas regiões de fronteira agrícola passa tanto pelo desenvolvimento de novas pesquisas, técnicas e produtos quanto pela educação e a difusão do conhecimento.”

Uma das regiões mais quentes do cerrado brasileiro pela baixa altitude, Tocantins tem sofrido particularmente com as mudanças climáticas recentes. Acostumados a duas estações muito marcantes, os produtores têm tudo pronto para o plantio no início de outubro, quando começa a época de chuvas, que se estende até maio. Neste ano, porém, as primeiras águas só chegaram em 10 de novembro.

No dia 2, feriado, as máquinas já estavam no campo, dando início ao plantio. A cada chuva, espera-se um pouco a estiagem e logo tratores e semeadoras voltam ao trabalho, para aproveitar ao máximo o recurso precioso. “Chover mais tarde não quer dizer que vá chover menos”, diz Rosa. “Se cair os 1.800 milímetros anuais, estaremos bem.”

O problema é que esse volume foi 200 milímetros menor nos últimos anos e ninguém tem resposta se as quantidades recentes se tornarão o novo normal. Colodel trabalha com três fornecedores de dados meteorológicos e nenhum deles têm previsões semelhantes à do outro. “Estamos na área em que há maior imprevisibilidade em relação ao comportamento climático”, afirma Balbino Antonio Evangelista, analista da Embrapa-TO especializado em agroclimatologia. “Porém, temos uma certeza: está cientificamente comprovado que as temperaturas estão aumentando, além de termos muitos relatos de agricultores de que as janelas de chuva para o plantio e a colheita estão atrasando ou diminuindo com muita frequência.”

Segundo ele, as soluções para o problema da região passam pelo desenvolvimento de sementes com material genético mais resistente à seca e ao manejo bem feito das culturas. “Há estudos comprovando que a agricultura sustentável, feita com a integração lavoura-pecuária-floresta (quando se intercalam as safras agrícolas com a pecuária e/ou a produção de árvores), resgata e acumula o carbono no solo, evita sua perda para a atmosfera, o que pode significar uma recuperação do meio ambiente degradado.”

Apesar de o método desenvolvido por Reis significar para os produtores economia de 50% na água utilizada, ele funciona apenas para a época das chuvas, quando a retirada da água dos rios é menor, como ele mesmo alerta. Na seca, as fazendas da região produzem sementes de soja e outras culturas irrigadas. “A ideia é aumentar a produtividade e a receita com o arroz, para que os produtores não precisem retirar tanta água e não esvaziem os rios na seca”, afirma Reis. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.