É impossível cortar R$ 50 bilhões do Orçamento de 2011 e, ao mesmo tempo, preservar os investimentos e programas sociais, como quer o governo. A conclusão é do economista Mansueto Almeida, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

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Ele calcula que, se os investimentos ficarem mesmo fora do corte, como foi anunciado, restará ao governo conter gastos de custeio. Ocorre que boa parte dessas despesas refere-se à área social, que também será preservada.

Os dados referentes aos gastos de custeio realizados no ano passado dão uma ideia da margem de manobra disponível para o governo. Eles totalizaram R$ 194,53 bilhões, dos quais apenas R$ 53,70 bilhões não estavam relacionados a educação, saúde e assistência social. “Este ano deve ser mais, mas não muito mais”, explicou o economista.

Ou seja, o governo teria de praticamente zerar o custeio não relacionado à área social para alcançar o corte desejado. Isso, porém, é inviável, pois significaria passar o ano inteiro sem comprar material de escritório, sem fazer manutenção de nenhum tipo e sem viajar, por exemplo.

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“Os cortes no custeio vão responder pela menor parte do ajuste”, aposta Mansueto. Ele constatou que as despesas com viagens e diárias, que o governo pretende reduzir à metade, somam R$ 2,2 bilhões. Ou seja, a medida de austeridade vai gerar uma economia de apenas R$ 1,1 bilhão, ou 2% do desejado. “Não é grande coisa”, comentou.

Brincadeira

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Outra medida de contenção de gastos anunciada pelo governo, a auditoria da folha de pagamento, é para ele uma “brincadeira de mau gosto”. O economista observou que os gastos federais já passam por auditoria pela Controladoria-Geral da União e pelo Tribunal de Contas da União. Além disso, a folha é toda informatizada. “O controle é grande, não tem funcionários fantasmas”, disse.

Para chegar aos R$ 50 bilhões será necessário, portanto, cortar investimentos. “Esse que é a grande desgraça de se fazer o ajuste fiscal”, observou o consultor Raul Velloso. “Em 2003, por exemplo, o corte foi todo neles.” Em 2011, estão autorizados investimentos R$ 63,5 bilhões, dos quais R$ 42 bilhões são do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). A parte de investimentos que não são PAC, portanto, é de R$ 21,5 bilhões. É nessa fatia, forte candidata ao corte, que estão concentradas as emendas de parlamentares.

Não foi essa, porém, a promessa feita pelo governo. “Na apresentação, falaram em preservar os investimentos de forma geral”, observou o economista-chefe da corretora Convenção, Fernando Montero.

Ele avalia que o governo terá dificuldades em cumprir a meta de superávit primário (economia para pagamento da dívida pública), fixada em R$ 117,9 bilhões, ou 2,9% do Produto Interno Bruto (PIB), para todo o setor público. A dificuldade decorre não só da pouca margem para cortes, mas também porque a receita está superestimada em pelo menos R$ 8 bilhões.

Além disso, tudo indica que a despesa ainda vai crescer. O governo dá sinais que concordará com um salário mínimo de R$ 560, o que elevaria os gastos em cerca de R$ 6 bilhões, no cálculo de Mansueto. Se, além disso, houver a correção da tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), o que deixará a arrecadação R$ 2,2 bilhões menor do que o previsto, o corte terá de ser aprofundado em R$ 8,2 bilhões.

Para Montero, se o corte de R$ 50 bilhões for concretizado será um feito mais importante do que o cumprimento da meta do superávit primário. “Estou confiante que haverá uma desaceleração importante no gasto federal e que as três esferas serão, em 2011, contracionistas sobre a demanda.” Ou seja, o setor público vai gastar menos do que no ano passado e isso reduzirá o tamanho do ajuste na taxa de juros que o Banco Central terá de fazer para controlar a inflação.