A presidente eleita da Argentina, Cristina Fernández de Kirchner tomará posse só no dia 10 de dezembro, mas suas últimas ações durante o período de transição mostram que poderá haver algumas mudanças na política exterior do governo kirchnerista. Alguns analistas políticos opinam que o principal aliado político da Argentina na região será o Brasil e, depois, o Chile, ficando em um segundo plano a Venezuela e Bolívia, países que ocuparam um lugar de destaque durante o governo de Néstor Kirchner.
"Nas prioridades de política exterior de Cristina Kirchner não figura Hugo Chávez, embora ela não tenha o costume de fazer críticas contra ele, nem permite que outros o façam diante dela" opina o analista e jornalista Joaquím Morales Solá, do jornal La Nación. Ele explica que uma das razões que afastam Buenos Aires de Caracas é a proximidade venezuelana com o Irã.
Há poucos dias, a Argentina conseguiu da Interpol a ordem de captura com alerta vermelho de cinco ex-funcionários do governo iraniano e um libanês, acusados de serem os responsáveis intelectuais do atentado a bomba contra a sede da associação israelita (Amia) na capital portenha, ocorrido em 18 de julho de 1994.
O ataque terrorista é uma ferida na história argentina que deixou o saldo de 86 mortos e centenas de feridos. Antes, em março de 1972, a sede da embaixada de Israel já havia sofrido um ataque, no qual morreram 26 pessoas. O casal Kirchner assumiu o compromisso com a comunidade judaica no país, a segunda maior fora de Israel, de esclarecer o atentado contra a Amia e punir os culpados. O caso gera tensão entre a Argentina e o Irã e os dois países estão cada vez mais afastados. Porém, Chávez se mostra cada vez mais próximo de Mahmud Ahmadinejad.
Distância
Para o analista Morales Solá, o próprio Kirchner tomou uma posição de distância de Chávez durante o episódio de enfrentamento do venezuelano com o rei Juan Carlos, da Espanha. Quatro dias depois, e sua já famosa frase "por que no te callas" Kirchner disse que "o rei Juan Carlos é o melhor político da Espanha e um dos melhores políticos do mundo". O analista considera que "só com este parágrafo, Kirchner disse adeus ao mesmo tempo à Chávez, ao nicaragüense Daniel Ortega e, em alguma medida, também ao boliviano Evo Morales, e ao equatoriano Rafael Correa".
Para o experimentado cientista político Rosendo Fraga, diretor do Centro de Estudos Nueva Mayoria, não haverá uma mudança tão radical na política exterior argentina. "Considero que o Brasil continuará sendo o principal investidor estrangeiro na Argentina mas isso não impedirá que a política exterior argentina continue oscilando entre este país e a Venezuela", afirmou à AE. Já Morales Solá considera que Kirchner optou pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em sua disputa pela liderança regional com Hugo Chávez.
Petróleo
Ele também afirma que a descoberta da nova reserva de petróleo no mar brasileiro, no campo de Tupi, deu um bom empurrão nesse sentido, já que a reserva poderia se estender pelo mar argentino. Na semana da descoberta de Tupi, o assessor especial do presidente Lula, Marco Aurélio Garcia, em visita a Buenos Aires, antecipou a notícia ao governo argentino e esclareceu que a exploração custará cerca de US$ 30 bilhões. "Ambos necessitarão buscar investimento e financiamento necessários. Cristina ficou deslumbrada com esse projeto", afirmou Morales Solá em sua coluna.
Outra demonstração do perfil mais social-democrata de Cristina, como definiu o analista político Ricardo Rouvier à AE, será a indicação do atual ministro de Saúde, Ginés Gonzaléz, para a embaixada argentina no Chile. O ministro é medico sanitarista, como a presidente Michele Bachelet e com sua indicação, Cristina quer enviar um claro sinal de amizade pela chilena e de sua intenção de reforçar as relações políticas entre os dois países. Durante a gestão de Néstor Kirchner, a relação com o Chile ficou desgastada por causa das interrupções na venda de gás argentino para o mercado chileno.