O setor de Tecnologia da Informação (TI) tem se aproveitado bastante do crescimento da economia nacional, depois da crise. Apontado como um ramo que poderia lucrar no período ruim, já que ajudaria as empresas a economizarem mais, o segmento está com orçamentos maiores que no ano passado. Porém, os investimentos podem acabar em um gargalo difícil de ser ultrapassado a curto prazo: a falta de mão de obra qualificada.
A BRQ IT Services, que tem uma unidade em Curitiba desde 2006, é exemplo dessa situação. Em expansão, a empresa pretende dobrar de tamanho este ano, tanto em espaço como em número de colaboradores. A ideia é passar de cerca de 300 para 600 funcionários. Porém, encontrar mão de obra com a qualificação desejada tem sido uma tarefa complicada.
O presidente da companhia, Benjamin Quadros, diz que o problema é geral no setor. “Está cada vez mais difícil achar profissionais qualificados na área, no Brasil. Esse é o grande desafio do setor, no País, para não sofrer um apagão de mão de obra”, explica.
Segundo ele, as empresas do ramo costumavam buscar trabalhadores prontos no mercado, mas hoje estão tendo que buscar outras soluções.
Na BRQ, Quadros informa que uma das opções foi por um modelo de capacitação de jovens estudantes do ensino médio ou superior, que estão buscando qualificação para o primeiro emprego. “É uma área estratégica da companhia”, diz. De 2007 até o ano passado, a empresa capacitou mais de 200 pessoas em programação de computadores, em pelo menos três programas diferentes.
Ainda assim, outras alternativas mais tradicionais não são descartadas, como a busca por profissionais em outras cidades. De acordo com Quadros, é no efetivo qualificado na área que está a grande diferença do Brasil em relação à Índia, país que tem o maior mercado profissional do setor, com cerca de 10 milhões de trabalhadores (contra aproximadamente 1 milhão no Brasil). “Lá, o volume de formação de gente [em TI] é absurdo. O setor é enxergado pelo governo indiano como estratégico, coisa que no Brasil temos dificuldade em mostrar”, observa. Para ele, isso reflete em falta de incentivos oficiais e de interesse pelos jovens.
O executivo teme, ainda, que essa falta de incentivos e interesse resulte em um encarecimento nos custos dos profissionais, o que pode gerar perda de postos de trabalho no País. Isso porque o setor, apesar de, na visão de Quadros, ser altamente empregador, é também bastante flexível: grande parte dos serviços podem ser migrados com facilidade para qualquer parte do mundo. “Podemos acabar perdendo os postos para a Índia e a China”, lamenta.
Investimentos
Por outro lado, apesar do gargalo da mão de obra, as empresas de TI brasileiras estão investindo mais que no ano passado. “Em uma reunião com 200 CIOs (“Chief Information Officers”, como são chamados os executivos de informática), conversei com 70. Todos estão com orçamentos maiores que no ano passado, comprando e investindo mais”, informa Quadros.
O setor, de acordo com o executivo, cresceu menos durante a crise, já que os clientes, principalmente indústrias, reduziram investimentos em projetos de longo prazo. Porém, a maioria das empresas do ramo não chegou a passar por grandes crises, já que a tecnologia foi vista como grande aliada na hora de reduzir custos. Setores como o bancário, por exemplo, não pararam de investir. “E eles são grandes compradores e dependentes de tecnologia”, nota.
No caso da BRQ, o investimento, só em Curitiba, deve ser grande este ano. A previsão da empresa é de investir cerca de R$ 3 milhões em 2010. Para comportar o dobro dos funcionários atuais, a companhia está procurando um local para instalar esse efetivo. No futuro, a intenção, segundo Quadros, é de construir um prédio dentro do Tecnoparque curitibano. Só s,e espera, agora, que encontre mão de obra suficiente.
Há falta de pessoal qualificado em várias áreas
A falta de mão de obra qualificada não é uma tendência observada apenas no setor de Tecnologia da Informação (TI), no Brasil. De acordo com a gerente de Operações da empresa de consultoria em recursos humanos De Bernt Entschev, Luciana Serafin, dificilmente os profissionais bem qualificados estão desempregados, hoje. “Os bons profissionais estão trabalhando. Dos que estão disponíveis, falta qualificação, experiência ou investimento na carreira”, afirma.
Segundo Serafin, as empresas não vêm tendo problemas apenas para encontrar essa mão de obra. Quando encontram, ainda precisam convencer os profissionais a trabalharem lá. “Quando aumenta o número de oportunidades, os profissionais também ficam um pouco mais exigentes na escolha, consideram aspectos que em períodos de crise, não considerariam”, observa.
A gerente lembra, no caso de executivos, que é a principal área de trabalho da De Bernt, tais situações vêm acontecendo principalmente nos setores financeiro, que exige preparação bastante específica, e da infraestrutura, como as áreas da construção civil e portuária. Em outros níveis, ela aponta os setores metal-mecânico e, novamente, da construção, entre outros.
Chances
Para aproveitar essas oportunidades que já existem ou estão para surgir, Serafin ressalta que as pessoas devem, primeiramente, saber as áreas com as quais têm mais afinidade. O próximo passo é pesquisar quais dessas áreas estão crescendo, e aí, depois de escolhida, investir na qualificação, que pode ir desde cursos técnicos, até especializações ou pós-graduações.
A dica vale, inclusive, para quem está de olho em uma mudança na carreira. Nesse caso, ela aconselha os profissionais a procurarem, em setores que estão em crescimento, áreas que se encaixam no que eles já sabem fazer. “Se eu trabalho com RH, posso buscar vagas nessas áreas em empresas de infraestrutura, por exemplo”, diz. Outro fator que deve ser considerado, nesse tipo de mudança, é uma possível redução de ganho ou posição. “É um passo para trás, mas que pode ser bom para o futuro”, conclui.
O que não vale, lembra Serafin, é ficar esperando as chances aparecerem. Depois que as empresas se instalam em um local
e abrem vagas, quem já está qualificado com certeza já está alguns passos à frente. (HM)
Mais de cem empresas estão instaladas em Curitiba
O Tecnoparque é apenas uma das áreas de Curitiba onde há incentivos para a instalação de empresas de ciência e tecnologia. Atualmente, além da BRQ, que foi uma das primeiras a se estabelecerem no local, outras 111 empresas participam do programa, ou estão em processo de ingressarem nele. A Agência Curitiba de Desenvolvimento, que administra o programa, estima que, nos dois últimos anos, R$ 170 milhões foram investidos no parque, que também concentra cerca de 46 mil estudantes, 3,4 mil professores e 500 grupos de pesquisas acadêmicas. Os locais delimitados pelo programa compreendem, hoje, o chamado Anel Logístico, no entorno da Linha Verde e da Avenida Marechal Floriano Peixoto, o setor central do Rebouças e os aneis norte e sul da Cidade Industrial de Curitiba (CIC), onde estão, respectivamente, o Parque de Software e o Tecpar. (HM)