Modernização da Lei de Falências entra em votação

Brasília – Depois de 58 anos alimentando uma indústria de concordatas, a velha Lei de Falências deverá sair de cena para dar lugar a uma legislação moderna, com olhos voltados para a recuperação da empresa e a preservação do emprego. O projeto da nova lei, que tramita há nove anos na Câmara, deverá ser votado na terça-feira. A lei deverá marcar o fim da impunidade para os maus administradores, que terão pena de prisão de até cinco anos.

“Grande parte das concordatas só favorece quem deve. A lei atual beneficia o patrimônio do devedor e afasta os investidores, que têm medo de emprestar dinheiro e não receber”, diz o vice-líder do governo na Câmara, Beto Albuquerque (PT-RS).

Pela nova lei, no lugar da concordata, administrador ou credores de uma empresa em dificuldade poderão entrar em um plano de recuperação com duração de 180 dias, prorrogáveis por mais 90 dias. Durante esse período, um comitê de credores passa a participar de todas as decisões da empresa. Ao contrário do que ocorre hoje, nessa fase será permitido à empresa fazer fusões, incorporações ou mesmo vender parte dos ativos aos empregados.

No projeto que vai a votação, o relator Osvaldo Biolchi (PMDB-RS) mantém na fase os créditos trabalhistas em primeiro lugar na ordem de classificação dos credores. A empresa tem 12 meses para quitar todas as dívidas trabalhistas. Outros créditos poderão ser passíveis de refinanciamento por cinco anos.

Caso a empresa tenha conseguido parcelar os débitos, passará a ter direito de buscar financiamentos em bancos públicos. Ao fim dos nove meses, um juiz arbitrará se a empresa tem ou não condições de honrar os compromissos assumidos. Caso isso não se confirme, será decretada a falência.

Ao contrário do que ocorre hoje, em que, durante o período de falência, os bens ou a massa falida da empresa devem ser vendidos em bloco.

O professor da Fundação Getúlio Vargas Aloísio Araújo, que ajudou na elaboração do projeto no governo passado, garante que o País vai ter uma lei melhor, que dá transparência à recuperação e à falência das empresas. Para Araújo, é bastante positivo o fato de que quem comprar parte da empresa ou totalidade dela não mais corre o risco de ser surpreendido por alguma dívida fiscal que não conhecia.

” A venda da empresa passa a ser feita diante de um juiz, mas, em compensação, o novo dono não fica responsável por dívidas pendentes.”

O presidente da Nossa Caixa, Valdery Albuquerque, crê que a nova Lei de Falências pode contribuir para reduzir o spread bancário. Segundo ele, qualquer pessoa ou instituição que empresta dinheiro quer uma garantia eficaz:

“Uma boa parte do spread bancário, principalmente em operações de longo prazo e financiamentos habitacionais, se deve à falta de estabilidade e clareza de regras e garantias. Hoje a gente está no pior dos mundos: pagamos pela garantia, mas ela é ineficaz quando se precisa dela.”

As mudanças com a nova lei

CONCORDATA: Será substituída pela recuperação judicial ou extrajudicial. Vários interessados vão poder pedir a recuperação da companhia, desde o dono da empresa em dificuldade até os acionistas ou, ainda, os credores.

RECUPERAÇÃO: A empresa terá um período de 180 dias, prorrogáveis por mais 90, para se recuperar. Durante esse período será feito um plano de renegociação de dívidas, a partir do qual a empresa passará a ter direito de obter créditos oficiais.

CREDORES: O processo de recuperação será acompanhado pelo comitê de recuperação, formado pelos credores, representantes da administração da empresa e empregados.

TRABALHADORES: Na fase de recuperação, apenas as dívidas trabalhistas terão prioridade. As demais dívidas serão pagas em conformidade com a decisão do comitê de credores.

VENDA: A nova Lei de Falências permitirá que, durante a recuperação, a empresa seja parcialmente vendida, que se façam fusões e cisões e que os empregados adquiram ações da empresa.

FALÊNCIA: Esgotadas todas as possibilidades de recuperação, será decretada a falência depois que um juiz comprovar que o plano de recuperação é inviável. Se for viável, a partir do segundo ano de recuperação, a empresa passa a caminhar com suas próprias pernas. Isto é, terá que cumprir à risca o pagamento de todos os débitos pactuados.

PAGAMENTOS: A ordem de pagamento das dívidas fica como na lei atual, na seguinte ordem: primeiro, serão pagos os créditos trabalhistas; depois, créditos tributários; créditos que têm garantias reais, como dívidas bancárias; créditos com privilégio especial, como operações de leasing; créditos quirográficos, como pagamento de duplicatas.

MASSA FALIDA: Pela nova lei, a massa falida terá que ser leiloada em bloco, para que a empresa não perca suas características e ainda possa preservar o emprego. Hoje, a massa falida é totalmente fragmentada.

PUNIÇÕES: A nova lei será dura para com o mau administrador. As penas por operações fraudulentas, inclusive em bolsas de valores, podem chegar a cinco anos de prisão. Por ser muito genérica, a legislação atual dificilmente coloca atrás das grades os maus administradores e a impunidade é grande.

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