Em meio à imagem abalada do Brasil pelos incêndios na Amazônia, os ministérios da Agricultura e Meio Ambiente tentam alinhar o discurso para fazer frente a um possível ataque de importadores, sobretudo da Europa, aos produtos do agronegócio brasileiro.

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Desde que a crise veio à tona, há quase dois meses, as duas pastas tentam reduzir as turbulências externas, mas cada uma com agenda própria. A falta de uma estratégia de defesa comum tem gerado preocupações entre as lideranças do agronegócio, que temem um boicote ao País.

Parlamentares da bancada ruralista no Congresso e no Senado evitam fazer críticas abertas à maneira como o governo tem conduzido a crise. Sob reserva, contudo, deputados e senadores da base ruralista afirmaram que faltam respostas rápidas e um maior alinhamento do governo para evitar potenciais perdas ao País, com risco de comprometer o acordo Mercosul e União Europeia.

Nos últimos dias, os ministros da Agricultura, Tereza Cristina, e do Meio Ambiente, Ricardo Salles, que nunca foram próximos, estão tentando se aproximar, segundo fontes a par do assunto.

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O desalinhamento entre as duas pastas não é de hoje. Entre o fim de 2018 e o início do ano, o clima pesou na Agricultura e Meio Ambiente, quando o presidente Jair Bolsonaro cogitou unir os dois ministérios. Desde então, cada ministro seguiu com suas agendas. Quando a crise da Amazônia ficou mais aguda, cada pasta preparou suas estratégias de discussões para conduzir o assunto.

Mas a falta de um discurso conciliatório entre as duas pastas é vista como um ponto sensível na defesa dos interesses do Brasil lá fora, afirmaram pessoas próximas aos ministros.

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Tereza Cristina e Salles viajaram, separadamente, para a Europa nas últimas semanas para conversar com importadores, governos e setor privado para explicar que o Brasil não incentiva o desmatamento ilegal, que o governo brasileiro está atento às questões da Amazônia e apertando o cerco contra exploração de áreas da região.

Preocupação

Embora ainda não haja uma retaliação aos produtos brasileiros – diversos países importadores e empresas globais consultaram o ministério da Agricultura sobre eventuais riscos -, a ameaça de imposição de barreiras preocupa exportadores de grãos e carnes, principais itens da pauta de exportações brasileira.

“Não há hoje uma ameaça real de barrar as exportações brasileiras. O governo está trabalhando para reverter a imagem lá fora. Mas claro que há uma preocupação sobre como o consumidor internacional vê os produtos brasileiros”, disse Marcello Brito, presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag).

O Ministério da Agricultura admite que falhas na comunicação são apontadas como principal fator que o impede o Brasil de ser difundido como uma potência agrícola sustentável. A apresentação de dados mais consistentes sobre preservação das florestas também precisa ter um plano de ação mais contundente.

“Temos erros muito sérios de comunicação tanto internamente como externamente. Precisamos corrigi-los se quisermos continuar vendendo mais e desbravando novas oportunidades”, disse Tereza Cristina, no dia 10 de outubro, durante o Fórum de Investimentos Brasil 2019, realizado em São Paulo. “Precisamos não só falar lá fora o que fazemos, mas mostrar a quantidade de área que preservamos”, afirmou.

À reportagem, o ministro Ricardo Salles disse que as discussões sobre Amazônia vão muito além da parte da Agricultura. Segundo ele, o ministério do Meio Ambiente está em conversas intensas com vários ministérios. “A missão do Ministério da Agricultura é uma e a do Meio Ambiente é outra.”

Procurado, o Ministério da Agricultura não quis comentar o assunto.

Campanha

A criação de uma grande campanha nacional em defesa da melhora da imagem do Brasil por conta da crise provocada pelos incêndios na Amazônia não é unanimidade entre as lideranças do agronegócio.

No fim de setembro, frigoríficos, associações de produtores de soja e de carne discutiram fazer uma campanha publicitária global para mostrar que o Brasil não incentiva o desmatamento e que as indústrias atuam dentro das boas práticas de sustentabilidade. Essa campanha conjunta foi abortada e cada empresa ficará responsável por ações de marketing para esse assunto, caso o boicote seja ameaça real.

Marcello Brito, presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), não é favorável a campanhas de marketing nesse sentido. “Sou a favor de mostrar fatos relevantes do País no dia a dia, não por meio de ações de marketing. O Brasil sempre foi uma potência e sempre atuou dentro das práticas sustentáveis.” Segundo ele, ações de marketing nacional deveriam ser feitas para atrair turistas para o Brasil. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.